Brasil emite menos de 3% dos gases de efeito estufa do planeta

“…o Brasil não só tem capacidade de ter produção carbono neutro, como, em alguns casos, ser carbono negativo no balanço ambiental de emissões.”

Samanta Pineda, advogada especialista em direito socioambiental

Samanta Pineda é advogada especialista em direito socioambiental, habilitada como Coordenadora de Gestão Ambiental pela DGQ da Alemanha, professora de direito ambiental da Fundação Getúlio Vargas, Insper, Fundação Escola Superior do Ministério Público do RS e no Instituto Brasileiro de Direito do Agronegócio IBDA de Brasília.

Pineda é analista da Bandnews, colunista do Jornal Terra Viva e apresentadora do programa Ação Sustentável no Agromais do Grupo Band, além de sócia fundadora do escritório Pineda e Krahn Sociedade de Advogados.


AgriBrasilis – Como a má gestão do meio ambiente influencia na produção do agronegócio?

Samanta Pineda – Recursos como o solo, que precisa estar saudável, e a água, que tem que ser abundante e limpa, o equilíbrio da biodiversidade, a estabilidade climática e outros fatores ambientais são fundamentais para o agro.

A produtividade agrícola está diretamente ligada à saúde do ambiente. Já temos visto muitos efeitos da má gestão do ambiente como a crise hídrica, calor e frio intensos e em épocas incomuns, regime de chuvas alterado, empobrecimento e contaminação do solo, processos erosivos, etc.

AgriBrasilis – O mercado de carbono é pauta frequente. Qual é o conceito de mercado de carbono e como o Brasil se posiciona nesse mercado? O Brasil é capaz de desenvolver produções agrícolas com taxas de carbono neutras?

Samanta Pineda – O mercado de carbono foi um mecanismo criado para compensação de emissões de gases causadores do efeito estufa, que são responsáveis pelas mudanças climáticas. O Brasil tem muitas oportunidades neste contexto, primeiro por emitir menos de 3% dos GEE (gases do efeito estufa) do planeta, segundo por ter um processo produtivo diferente.

No Brasil, desenvolvemos técnicas de produção para agricultura tropical que são mais sustentáveis: são processos que conservam o solo, como o plantio direto, que mantem a palha da colheita anterior cobrindo a terra e evitando emissões e perda de umidade e diversidade, os sistemas de integração que combinam a produção de lavoura com pecuária e silvicultura, gerando impacto positivo para solo e ar, além de promover o bem-estar animal. Temos duas, três ou até quatro safras por ano, na mesma área! Isso é uma vantagem que nossa agricultura tropical tem sobre os climas temperados da Europa e EUA, por exemplo, que fazem diferença no impacto da produção.

Por esses motivos, somados com as obrigações ambientais do produtor rural, o Brasil não só tem capacidade de ter produção carbono neutro, como, em alguns casos, ser carbono negativo no balanço ambiental de emissões.

AgriBrasilis – O que determina o Código Florestal em relação à produção agrícola? Como é possível seguir as diretrizes propostas?

Samanta Pineda – O Brasil é o único país no mundo que impõe responsabilidades de conservação ambiental em área privada sem qualquer contrapartida pública.

Todas as áreas que possuem relevância ambiental, como margens de rios, entornos de nascentes, encostas e outras, são consideradas de preservação permanente e não podem ser utilizadas ou sequer manejadas. Independentemente disso, cada área rural do Brasil deve ter uma porcentagem que não poderá ser utilizada para produção, mas conservada com vegetação nativa, podendo ser manejada desde que seja mantida a característica da vegetação natural. Esta porcentagem é de 20%, quando fora da Amazônia.

Na Amazônia Legal, que representa 61% da área do Brasil, a porcentagem de conservação obrigatória é de 80% nas áreas de floresta e de 35% nas áreas de Cerrado. É a maior restrição ambiental do planeta ao uso da propriedade privada.

Para seguir as diretrizes ambientais, o produtor rural precisa cuidar da sua produtividade e gestão, pois caso ele possua áreas não conformes, além do risco de multas e processos criminais, o produtor não consegue vender sua produção. A responsabilidade ambiental é solidária, ou seja, atinge a todos os elos da cadeia, inclusive os compradores, como os frigoríficos e as cooperativas.

AgriBrasilis – Como a Cédula de Produto Rural (CPR) pode auxiliar na produção agrícola sustentável?

Samanta Pineda – A CPR é o título de crédito mais usado pelos produtores brasileiros e representa uma promessa de entrega futura de produto agropecuário ou do seu valor em dinheiro. Trata-se de uma forma eficiente de acesso a recursos financeiros que, se for utilizada para custear a melhoria dos processos produtivos em relação aos impactos ambientais, terá o status de CPR Verde.

Qualquer tecnologia, inovação ou procedimento de menor impacto ambiental pode ser custeado por este título, inclusive a implantação de projetos de geração de créditos de carbono e outros serviços ambientais.

AgriBrasilis – Como a senhora interpreta os compromissos assumidos pelo Brasil na COP 26? As metas assumidas são factíveis?

Samanta Pineda – Entendo que são desafiadoras, principalmente considerando o contexto pós-pandemia, que gerou crise econômica mundial, agravada pela guerra deflagrada pela Rússia contra a Ucrânia, que gerou uma grave escassez de energia, principalmente na Europa.

As metas brasileiras, no entanto, estão sendo buscadas com ações efetivas, como o início da regulamentação do mercado regulado de carbono pelo Decreto 11075, que inclusive criou o mercado do metano em virtude do Acordo do Metano, do qual o Brasil foi signatário.

Vemos ainda no Brasil várias ações que fomentam a migração para uma economia verde. Dessa forma, entendo que o Brasil, embora emita menos de 3% dos GEE, tenha condições de cumprir as metas e ainda gerar oportunidades para que os maiores emissores consigam cumprir as suas, com a exportação da nossa energia verde por exemplo.

 

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