“Países asiáticos importaram 6,6 milhões de sacas em 2021, representando aproximadamente 16,5% das vendas de café brasileiras. Destaca-se o crescimento observado no mercado chinês.”
Marcos Matos é diretor geral do Conselho dos Exportadores de Café do Brasil – Cecafé desde 2016. Foi diretor-executivo da Associação Brasileira do Agronegócio, atuou na área de gerenciamento de projetos internacionais da Fundação Getúlio Vargas e na área de Relações Governamentais da Bayer S.A.
Matos é engenheiro agrônomo e mestre em agronomia pela Universidade de São Paulo.
AgriBrasilis – O que é o selo Cecafé? Quais as diretrizes seguidas pela Cecafé para assegurar a sustentabilidade na cadeia produtiva do café? Qual a importância em se respeitar critérios ESG?
Marcos Matos – O Cecafé, com seus 122 associados, representa cerca de 96% das exportações de café do Brasil para mais de 120 países. O Conselho está sempre atento às tendências regulatórias, novas exigências e oportunidades em tempos de ESG.
Há mais de duas décadas o Cecafé investe em sustentabilidade, em todos os pilares fundamentais. No social, com os programas “Criança do Café na Escola” e a “Ação coletiva de bem-estar social”. No ambiental, os programas de capacitação “Produtor Informado” e “Café Seguro”, que incluem o monitoramento multi-resíduos dos cafés brasileiros.
Destaca-se, ainda, no ambiental, o projeto de balanço de carbono de café nas regiões produtoras de Minas Gerais, que demonstrou que o café é carbono negativo, o que representa um potencial mitigador das mudanças climáticas e oportunidades para os cafeicultores brasileiros.
Dessa forma, como chancela de todas essas ações e em linha com o Planejamento Estratégico do Cecafé, a organização possui o Código de Ética e de Conduta, em que os membros expandem para toda a cadeia produtiva os preceitos éticos e das leis vigentes. Para representar todas as ações, o Cecafé possui o Selo de Sustentabilidade, que fortalece ações de sustentabilidade e o compromisso com os preceitos e critérios ESG.
AgriBrasilis – Diante da alta no preço dos insumos, eventos climáticos extremos e a escassez de fertilizantes, como dar suporte aos produtores associados? Quais os principais desafios para a produção consistente de café de qualidade?
Marcos Matos – O Cecafé representa o fluxo comercial, tanto para abastecer a indústria interna (sendo o Brasil o segundo maior consumidor da bebida café) quanto a externa. São empresas nacionais, globais e cooperativas entre os associados do Cecafé.
Diante do cenário de alta dos insumos, temos promovido práticas sustentáveis, como o uso de bioinsumos no parque cafeeiro. Tal ação demonstra ainda mais impacto na dinâmica de carbono negativo e promove o condicionamento do solo, visto que há melhoria das características físico-químicas e biológicas, bem como devido à fração orgânica, uma disponibilização gradual dos nutrientes para as plantas.
Cerca de 80% dos fertilizantes que o Brasil utiliza são 95% de potássio, 80% de nitrogenados e 55% de fosfatados. No café, há importantes fontes de nutrientes geradas nas próprias fazendas. Por exemplo, casca e a palha de café podem ser provenientes do processamento do café via úmida e da etapa de beneficiamento, gerada em grande volume nas próprias áreas cafeeiras.
Boas práticas agrícolas, incluindo também o uso de biomassa nas entrelinhas, sempre mencionado nos programas de capacitação do Cecafé, resultam em mitigação das adversidades climáticas.
Por meio da inovação e de novas tecnologias, o Cecafé apoia a ampliação do Seguro Rural no Brasil como mecanismo de profissionalização dos cafeicultores diante das anomalias climáticas.
No aspecto econômico, o Cecafé, em parceria com o Serasa Experian, lançou a plataforma para gestão de riscos dos contratos futuros de café. Com este projeto, busca-se a defesa e a gestão dos contratos como forma de instrumento de mercado de longo prazo, o que agrega liquidez e sustentabilidade ao agronegócio café brasileiro. Para os produtores, significa sustentabilidade, por meio de liquidez, renda, previsibilidade e investimentos. Aos exportadores e cooperativas, significa a originação com gestão de riscos e planejamento de longo prazo.
Somado a isso, o Cecafé apoia o Consórcio de Pesquisa Café, coordenado pela Embrapa Café, englobando-se as 95 linhas de pesquisa em andamento. Entre elas, o melhoramento genético, considerando-se a resiliência diante das anomalias climáticas, resistência às pragas e doenças, maior produtividade e qualidade da bebida.
AgriBrasilis – O que poderia ser melhorado na cadeia produtiva de café, e o que é necessário para que isto aconteça?
Marcos Matos – Para o fortalecimento e a ampliação da liderança brasileira, alguns pontos são necessários destacar:
a) Maior apoio a pesquisa, desenvolvimento e inovação, com ênfase no Consórcio e Pesquisa do Café e demais organizações de pesquisas regionais. Para tanto, ampliar os investimentos e profissionalizar a gestão de toda a rede de pesquisa. Tal ação resulta em cafés mais produtivos, com maior qualidade e resistência às pragas, doenças e mudanças climáticas;
b) Ampliação do Seguro Rural. O Brasil é um país continental, sujeito às anomalias climáticas. Dessa forma, com o uso de novas tecnologias, será possível ampliar as áreas de cobertura do seguro no café, com menor custo, maior agilidade, adequando-se às novas realidades no campo;
c) Melhoria das estatísticas de produção. Faz-se necessário ampliar esforços para maior acurácia das estatísticas de safra, tanto no café arábica, quanto no conilon, o que reduziria as especulações diante de um quadro de suprimentos e de demanda equacionados;
d) Infraestrutura: uma questão de fundamental importância, não apenas no café, mas para todo o agronegócio brasileiro. Ampliação do modal ferroviário, maior atuação das agências reguladoras ANTT e Antaq coibindo abusos, concessões e privatizações no setor, com maior investimento em terminais portuários para a redução de custos.
AgriBrasilis – Quais as principais diferenças entre as duas espécies de café cultivadas no Brasil? Qual é mais aceita no mercado interno e por quê?
Marcos Matos – O cafeeiro pertence à família Rubiaceae, gênero Coffea, sendo que as duas espécies mais cultivadas desse gênero são: Coffea arabica (L.) (café arábica) e Coffea canephora (L.) (café robusta ou conilon).
O café arábica é originado na Etiópia (África), crescendo no sub-bosque de florestas tropicais, altitudes de 1.600 a 2.800 m, temperatura média anual de 20º C, precipitação de 1.600 a mais de 2.000 mm, teor de cafeína nos grãos inferior a 1,5%. É apreciado pela qualidade de bebida, portanto é empregado na indústria do café torrado e moído.
O café canephora se origina no Congo (África). Espécie tem origem em sub-bosques densos de florestas equatoriais, altitude de até 1.200 m, temperaturas médias anuais entre 24 e 26º C; precipitação maior que 2.000 mm, distribuídas ao longo de nove meses do ano, umidade relativa alta, próxima à saturação. É consumida na forma de misturas com o café arábica (blends), chegando a participar com 50% ou mais na composição, graças ao trabalho de qualidade que tem sido desenvolvido no Brasil, observando-se o melhoramento da variedade e as operações de pós-colheita do conilon.
O café conilon tem sido muito utilizado em cafés espressos, contribuindo com “corpo” e densidade. Também tem sido usado como valiosa fonte de alelos favoráveis para resistência a pragas, doenças e nematoides em programas de melhoramento genético que utilizam ambas as espécies.
AgriBrasilis – Quais novos mercados ainda podem ser explorados?
Marcos Matos – O consumo do café tem evoluído de forma significativa no mundo, incluindo os mercados tradicionais e os novos mercados. Sobre os novos mercados, destacam-se:
Países árabes: importaram 1,6 milhão de sacas em 2021, representando cerca de 4% das vendas brasileiras de café.
Países produtores: importaram 3,2 milhões de sacas em 2021, representando 7,9% das vendas brasileiras de café. Entre os países produtores, destaca-se a Colômbia, terceiro maior produtor de café do mundo, que foi o sétimo principal destino das exportações brasileiras do produto. O país vizinho adquiriu 1,158 milhão de sacas, apresentando o maior crescimento em volume no intervalo, de 289.561 sacas, o que equivaleu a uma alta percentual de 33,4 pontos.
Países asiáticos: importaram 6,6 milhões de sacas em 2021, representando cerca de 16,5% das vendas de café brasileiras. Destaca-se o crescimento no mercado chinês, que foi o segundo maior destaque nas compras do café brasileiro em 2021, atrás da Colômbia, incrementando importações em 132.003 sacas (+65%) ante 2020. Nos 12 meses do ano passado, os chineses adquiriram 333.648 sacas do produto nacional.
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