“Ou seja, o produtor já começa o ano sabendo que vai perder dinheiro…”
Bernardo Nogueira é diretor comercial da Kepler Weber, formado em agronomia pelo Centro Regional Universitário de Espirito Santo do Pinhal, com especialização em liderança pela Fundação Dom Cabral.
AgriBrasilis – O que motivou a queda de 42% no lucro da empresa no 3º trimestre de 2023?
Bernardo Nogueira – Importante dizer que o terceiro trimestre de 2023 representa o segundo melhor resultado trimestral da história da Kepler Weber. Agora, a base de comparação com 2022 se dá em ambientes de negócios distintos. O ano passado foi excepcional para o agronegócio brasileiro, com preços das commodities em patamares nunca vistos, produtor capitalizado. Isso fez com que os resultados de 2022 fossem extraordinários.
Em 2023, com a acomodação dos preços das commodities, o setor de Fazendas, que responde por cerca de um terço dos nossos negócios, recuou para níveis normais. Dentro da estratégia de diversificação de territórios e receitas, a companhia tem conseguido entregar o segundo melhor ano da história da Kepler Weber, atrás apenas de 2022, apesar do cenário mais desafiador.
AgriBrasilis – A Kepler Weber entrou oficialmente no Novo Mercado da B3 em agosto. O que isso representa para o futuro da companhia?
Bernardo Nogueira – É uma conquista acessar o segmento de listagem do Novo Mercado. Isso permite maior liquidez aos papeis da companhia e amplia a confiança dos acionistas.
Entendemos que a sustentabilidade da Kepler Weber e a geração de valor ao acionista exigem responsabilidade na gestão do negócio. Também nos exige o compromisso social, a integridade, o cuidado com cada um dos colaboradores, o respeito e o compromisso com todos os nossos clientes. Esses são princípios que fazem parte da nossa jornada.
AgriBrasilis – Como o senhor enxerga o cenário de demanda por silos e de déficit de armazenagem no Brasil? Quais as tendências para o longo prazo?
Bernardo Nogueira – A armazenagem, que já era essencial para a eficiência do agricultor e a segurança alimentar, passou de necessária para crítica. Vimos no início do ano, pela primeira vez, a produção agrícola superar a capacidade estática do país já na primeira safra. Esse cenário tornou ainda mais urgente investir em unidades de beneficiamento e armazenagem de grãos.
Estamos caminhando para uma safra que se aproxima de 320 milhões de toneladas, segundo a Conab. Sem ter onde guardar o grão, o agricultor enfrentou, ao longo de 2023, prêmios negativos de soja. A pedido da Kepler Weber, uma consultoria independente estimou em R$ 30 bilhões os prejuízos provocados ao agronegócio pela deficiência logística. Para 2024, a estimativas indicam mais uma vez prêmios negativos. Ou seja, o produtor já começa o ano sabendo que vai perder dinheiro por falta de eficiência.
“A pedido da Kepler Weber, uma consultoria independente estimou em R$ 30 bilhões os prejuízos provocados ao agronegócio pela deficiência logística”
AgriBrasilis – 61% dos produtores não têm estruturas para guardar grãos. Por que o cenário da armazenagem no Brasil não evolui?
Bernardo Nogueira – Existem fatores históricos que precisam ser considerados. O produtor sempre se preocupou muito com a expansão de terra, ou seja, usar o que ganhou com a safra para comprar mais áreas. Com o avanço da tecnologia, a produção agrícola deu um salto no campo. Com isso, o agricultor percebeu que investir em pós-colheita representa a possibilidade de melhorar o faturamento, maximizando os resultados nesta etapa em até 15%. A cultura de armazenagem passou a ser discutida com o rigor que merece.
Um estudo da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos, feito com base na produção de 2020, revelou que seriam necessários investimentos de R$ 10 bilhões por ano, durante dez anos, para o Brasil conseguir zerar o déficit de armazenagem. O estudo considerou a produção de grãos para a safra 2020/21, que foi de 272,5 milhões de toneladas. Hoje, já estamos produzindo 320 milhões de toneladas.
Por mais que o setor tenha conseguido ampliar a capacidade estática todos os anos, a partir de investimentos próprios dos agricultores e de aportes do Plano Safra, o ritmo não é suficiente para acompanhar o crescimento da safra.
AgriBrasilis – Quais são os riscos do déficit de armazenagem no Brasil?
Bernardo Nogueira – O déficit de armazenagem no Brasil é um problema crítico, que ameaça a competitividade do país e atinge frontalmente a segurança alimentar do Brasil. Não ter onde armazenar, de forma adequada, grande parte da produção brasileira de grãos impacta a eficiência logística e a rentabilidade do produtor. Sem ter onde guardar, ele precisa escoar a produção imediatamente após a colheita, pagando mais caro pelo frete e tendo que vender o grão a ‘preço de balcão’. Além de prejudicar a rentabilidade dos produtores, o déficit de armazenagem também pode gerar perdas de qualidade dos grãos, devido à exposição a fatores climáticos e à deterioração natural.
Para mitigar os impactos do déficit de armazenagem, é necessário investir em infraestrutura. No caso do Brasil, os financiamentos facilitam o acesso dos agricultores às unidades de beneficiamento e armazenagem de grãos. No Plano Safra deste ano foram destinados R$ 6,6 bilhões à linha PCA (Plano de Construção e Ampliação de Armazéns). Como alternativa inovadora, a Kepler Weber, o BNDES e o BTG Pactual Asset lançaram em dezembro de 2022 um Fiagro/FIDC de R$ 300 milhões. Esse Fiagro financia o projeto completo de pós-colheita: tanto os equipamentos, quanto as obras de infraestrutura da planta.
AgriBrasilis – Recentemente ocorreram casos de explosões em silos agrícolas. Que tecnologias garantem a segurança dos silos agrícolas? É possível prevenir esse tipo de situação?
Bernardo Nogueira – As unidades de armazenagem movimentam milhões de toneladas de grãos em cada safra e necessitam de manutenção para que sua eficiência e segurança sejam garantidas. Além disso, a operação deve seguir protocolos, com mão-de-obra qualificada, o que é um desafio para os agricultores.
Temos investido no desenvolvimento de equipamentos e tecnologias que permitam ampliar a eficiência e a segurança das unidades. Um dos exemplos é o lançamento da Rosca Varredora, equipamento que fica na parte interna dos silos e elimina a necessidade de trabalhadores atuarem em ambiente confinado.
Este ano, a Kepler Weber apoiou a criação da primeira norma do Brasil para dimensionamento de silos, a ABNT 17066. Anteriormente, as diretrizes de regulamentação desse mercado vinham de fora do país. Com isso, a companhia desenvolveu uma nova linha de silos, com ganhos em segurança operacional.
AgriBrasilis – Como os sensores para monitoramento de grãos mudaram o cenário da armazenagem e pós-colheita?
Bernardo Nogueira – Esse é um ponto fundamental para o desenvolvimento do segmento. A utilização de tecnologia na agricultura tem permitido uma revolução no campo nos últimos anos. O agricultor que dispõe de dados na hora de tomar decisões consegue atingir seus objetivos de forma muito mais assertiva. É por isso que em 2023 nós concluímos o processo de compra de 50% mais uma ação da Procer, principal player da América Latina com foco específico em automação e monitoramento para a armazenagem de grãos. Com a tecnologia da Procer, já temos conectados mais de cinco mil silos e a expectativa é atingir 50% da capacidade estática do país nos próximos anos.
A conectividade traz a armazenagem para um novo patamar, melhorando a qualidade do grão, porque consegue determinar temperatura e umidade dentro dos silos, além de reduzir o consumo de energia.
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