Plantas daninhas resistentes ameaçam a produção de soja no MT

“Os herbicidas não estão obsoletos e devem ser utilizados de forma correta, com dose adequada, recomendação correta quanto ao alvo…”

Anderson Luis Cavenaghi é diretor da área de Ciências Agrárias, Biológicas e Engenharias no Centro Universitários de Várzea Grande – Univag, onde coordena projetos de monitoramento de resistência de plantas daninhas, principalmente no Mato Grosso. Cavenaghi é engenheiro agrônomo, mestre e doutor em proteção de plantas pela Universidade Estadual Paulista, Unesp de Botucatu-SP.

Anderson Cavenaghi, diretor na Univag


AgriBrasilis – Qual a situação atual da resistência de plantas daninhas no Mato Grosso? Quais as culturas mais afetadas?
Anderson Cavenaghi – O maior problema atualmente é o capim-pé-de-galinha (Eleusine indica) com resistência múltipla aos inibidores da EPSPs [por exemplo, o glifosato] e ACCase [por exemplo, o haloxifope]. Além dessa planta daninha, outras importantes, como a buva (Conyza bonariensis), o capim-amargoso (Digitaria insularis) e o caruru (Amaranthus spp.) apresentam resistência ao glifosato, o que dificulta o manejo.

Quanto às culturas, a maior dificuldade ocorre na soja, por ter a maior área plantada e menos opções de herbicidas para controle de plantas resistentes em pós-emergência. Mesmo assim, as plantas resistentes estarão presentes na áreas e serão problema para qualquer cultura ali estabelecida, como algodão e milho, em proporção maior ou menor, dependendo da espécie que ocupa a área.

AgriBrasilis – Como é realizado o monitoramento da resistência? Qual a diferença entre plantas resistentes e tolerantes?
Anderson Cavenaghi – No caso da Univag, o monitoramento é realizado com a coleta de sementes em áreas onde ocorrem problemas de controle. Essa coleta é realizada principalmente por representantes de multinacionais, com os quais executamos projetos de monitoramento em parceria.

As sementes são encaminhadas para a Univag para estudos de resistência aos herbicidas, ou seja, testes com produtos utilizados na área de coleta, herbicidas alternativos para controle, curvas de dose resposta e uso de biologia molecular para tentar entender o que ocorre em cada caso.

A tolerância contra determinado herbicida indica que uma espécie não será bem controlada, pois nunca foi totalmente suscetível, como é o caso da trapoeraba (Commelina spp.) ao glifosato, por exemplo.

A resistência indica que não haverá controle para uma espécie que anteriormente era suscetível ao herbicida, como aconteceu com o capim-pé-de-galinha ao glifosato, por exemplo.

AgriBrasilis – Quais herbicidas têm apresentado maior número de plantas resistentes? É possível considerar que alguns herbicidas, como o glifosato, estejam se tornando obsoletos?
Anderson Cavenaghi – Ultimamente, a grande preocupação, principalmente devido às culturas RR, é o herbicidas glifosato, mas os inibidores da ALS [imazaquim, imazetapir, clorimurom, metsulfurom, diclosulam, dentre outros] deixaram de controlar plantas importantes como leiteiro (Euphorbia heterophylla), picão-preto (Bidens pilosa) e caruru há mais tempo, devido à resistência.

Os herbicidas não estão obsoletos e devem ser utilizados de forma correta, com dose adequada, recomendação correta quanto ao alvo, etc. Deve-se praticar a rotação de sítios de ação, dentre outros cuidados.

AgriBrasilis – O que é resistência múltipla? Quais os casos identificados?
Anderson Cavenaghi – A resistência múltipla é a que mais tem causado preocupação, em função da perda de mais de um sítio de ação no controle de um mesmo biótipo resistente. Vários casos já foram registrados no Brasil e aconselho acesso à pagina www.weedscience.com para conhecer todos os casos já mencionados.

AgriBrasilis – Que estratégias devem ser adotadas para manejo de plantas daninhas resistentes aos herbicidas?
Anderson Cavenaghi – A principal delas é utilizar herbicidas com diferentes sítios de ação na área com problema de resistência, lembrando sempre da importância do uso de herbicidas pré-emergentes nestas áreas.

AgriBrasilis – Por que a importância do caruru (Amaranthus palmeri) tem aumentado nas últimas safras? O senhor poderia comentar sobre o histórico dessa praga, desde sua introdução no Brasil em 2015?

Anderson Cavenaghi – O caruru-palmeri foi encontrado inicialmente em Mato Grosso, porém uma planta foi encontrada recentemente em Mato Grosso do Sul, o que chamou a atenção de todos novamente.

O primeiro relato, em 2015, foi possível exatamente porque existiam projetos de monitoramento em andamento e recebemos semente de A. palmeri para avaliação. Uma vez identificado, pesquisadores, empresas de defensivos, órgãos públicos e produtores rurais se uniram para entender o que estava acontecendo, informar a sociedade e combater essa planta. Isso levou a uma redução na densidade dessa espécie nas primeiras propriedades infestadas, porém, apesar de lento, ocorreu um aumento no número de propriedades identificadas com a espécie.

Para combater o caruru-palmeri, foi publicada a Instrução Normativa nº 047/2015, atualizada em 2020, através da IN Indea-MT 003/2020, com regras para erradicação e contenção da planta invasora. Esse conjunto de ações impediu que o problema se tornasse muito maior até o momento.

 

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