“O histórico climático da região produtora deve ser o pilar para a elaboração do programa de controle.”
Gabriela Vieira Silva é bióloga pela Universidade Estadual do Norte do Paraná, engenheira agrônoma pelo Centro Universitário Filadélfia, mestre em entomologia pela Universidade Federal do Paraná, e doutora em fitossanidade pela Universidade Estadual de Londrina em parceria com a Embrapa Soja.
Silva é sócia-fundadora da Empresa Agribela – Pesquisa e Desenvolvimento de Tecnologias Biológicas, gerente do Centro Biotecnológico da Biomassa e professora no Programa de Mestrado em Agronomia da Universidade Estadual do Norte do Paraná.
Bilhões de reais são perdidos, anualmente, em decorrência do ataque de insetos que se alimentam da cana. Seja na raiz, no colmo, ou nas folhas, o complexo de pragas dessa cultura é dinâmico e não tem tempo para “brincadeiras”. Então, qual a receita para evitar tamanho prejuízo?
Antes da resposta, vale ressaltar alguns pontos. O complexo de pragas da cana de açúcar é composto, principalmente, por espécies das ordens Lepidoptera, Coleoptera, Hemiptera, Hymenoptera e Isoptera; exemplificando, broca da cana, bicudo, cigarrinha, formigas cortadeiras e cupins, respectivamente. Cada um desses insetos possui características biológicas e de comportamento marcantes, mas há uma similaridade entre eles: todos ocorrem quando as condições, bióticas e abióticas, são propícias. Parece óbvio, mas parte daqui o manejo para driblar os danos que eles podem causar.
O histórico climático da região produtora deve ser o pilar para a elaboração do programa de controle. Os insetos são reativos a variáveis temporais, especialmente temperatura e umidade. O trio broca-cigarrinha-bicudo, por exemplo, apresenta picos populacionais em períodos onde os índices pluviométricos são maiores, embora ocorram o ano todo. Assim, os esforços de amostragem e monitoramento devem ser intensificados nessas épocas.
Apesar de não haver níveis de controle estabelecidos para todas as pragas, na cana-de-açúcar a literatura e experiência do setor dão a segurança sobre qual é o melhor momento de agir para as principais espécies que ocorrem. Os níveis de ação, indicados pelo número de indivíduos/área ou pelo percentual de injúrias/área, devem ser criteriosamente seguidos, a fim de que os resultados obtidos sejam os mais eficazes, evitando-se desperdícios e retardando a ocorrência de populações resistentes.
Como ferramentas, dentro do manejo integrado de pragas (MIP) da cana, temos os inseticidas, químicos ou biológicos. Embora não seja a cultura mais representativa em área (são aproximadamente 8,5 milhões de hectares no Brasil), é uma das mais expressivas em diversidade de produtos. Se olharmos para as possibilidades biológicas, temos vespas parasitoides (Cotesia flavipes, Trichogramma galloi e Tetrastichus howardii), fungos entomopatogênicos (Metarhizium anisopliae e Beauveria bassiana) e bactérias (Bacillus thuringiensis) sendo utilizados em grandes áreas. Além disso, os inseticidas químicos, cada vez mais seletivos e menos agressivos ao ambiente, também estão disponíveis para todas as pragas.Em posse dos melhores produtos, é indispensável a melhor tecnologia de aplicação. Para os produtos químicos, deve-se priorizar aplicação terrestre, com bicos e pontas adequados, assim como vazão, respeitando as doses recomendadas.
Para os microbiológicos, deve-se fazer o mesmo: seguir as doses recomendadas, produzir a calda da forma correta, aplicar com as condições adequadas.
Sobre os macrobiológicos (vespas), deve-se ter atenção especial sobre a qualidade do produto, o tempo de prateleira e condições de aplicação. Hoje, a tecnologia de liberação desses organismos avançou muito, o que proporciona alta eficiência.
Dentro das ferramentas, não podem ser esquecidas as variedades de cana. Sabe-se que cada uma tem suas peculiaridades, como a susceptibilidade ou não a determinadas pragas, além das variedades transgênicas. A escolha do local correto, com base no histórico de ocorrência da praga e características edafoclimáticas, é condição indispensável para o manejo.
Ressaltados estes pontos, vamos a resposta para a pergunta inicial: não há receita pronta! O manejo integrado de pragas é um conceito abrangente e apresenta as premissas para o sucesso do canavial. Cabe aos responsáveis o entendimento da biologia e comportamento das espécies, o acesso as melhores ferramentas e, especialmente, a tomada de decisão/ação no momento correto. Assim é possível o encaixe perfeito das peças do quebra-cabeça do MIP e o sucesso na condução do canavial.
Exemplos de ataques de praga na cultura da cana-de-açúcar
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