Impactos ambientais do cultivo de cana-de-açúcar

“A cana é referência quando se trata do uso biológico de defensivos…”

Pedro Dinucci é presidente do conselho de administração na Usina São Manoel, formado em engenharia civil pela Escola Politécnica da USP, com MBA pela London Business School.

Pedro Dinucci, presidente do conselho de administração na Usina São Manoel


AgriBrasilis – Quais são os principais impactos ambientais da produção de cana-de-açúcar?

Pedro Dinucci – A cana é considerada uma cultura semiperene, ou seja, não necessita ser plantada todos os anos. O plantio ocorre a cada 5 ou 6 anos, minimizando os impactos no solo e reduzindo as emissões de CO2. Outro fator importante são os resíduos industriais, como torta-de-filtro e vinhaça, decorrentes do processamento da “própria” cana e que são utilizados nos canaviais como fonte de nutrientes orgânicos, reduzindo significativamente o uso de fertilizantes minerais.

A cana é referência quando se trata do uso biológico de defensivos, principalmente no caso do controle biológico de pragas. Assim como grande parte das gramíneas, é uma grande fixadora de carbono no solo, fator esse que é de extrema relevância para o desenvolvimento radicular das plantas. Uma vez que esse carbono é retido no solo, deixa de ser liberado da atmosfera.

Também não é possível deixar de citar o caso do etanol, biocombustível produzido a partir da cana e que, quando consumido, emite 90% menos CO2 se comparado com a gasolina.

Um ponto de atenção do setor é o alto consumo de diesel nas operações de colheita e transporte da cana até a indústria, que acarreta no maior volume de emissões. No momento, não há ações que sejam possíveis realizar para reduzir drasticamente o consumo desse combustível, uma vez que os veículos disponíveis no mercado não apresentam tecnologias superiores as que possuímos em nossa frota. Outro ponto de relevância são as ocorrências de incêndios agrícolas. Apesar da prática do uso de fogo como método pré-colheita não fazer mais parte do dia-a-dia das usinas há pelo menos 10 anos, e de toda a colheita ser realizada de forma mecanizada, ainda há muitos incidentes com fogo provocados por terceiros em áreas de cana. Esses pequenos focos de incêndio, quando encontram um cenário propício para propagação, como tempo seco, baixa umidade, calor e vento, tomam proporções que fogem do controle e podem causar grandes prejuízos ambientais, sociais e financeiros.

“Um ponto de atenção do setor é o alto consumo de diesel nas operações de colheita e transporte da cana até a indústria, que acarreta no maior volume de emissões”

AgriBrasilis – Quais práticas focadas em sustentabilidade são o diferencial da Usina São Manoel?

Pedro Dinucci – Alguns programas foram pensados justamente para promover a sustentabilidade da comunidade em que estamos inseridos, como por exemplo, o Programa Ciclo do Mel. Desde o seu lançamento, em 2015, cerca de 2.500 caixas de abelhas foram instaladas em mais de 500 hectares de vegetação. O programa é realizado em conjunto com a Associação de Apicultores de Botucatu, responsável pela gestão das colmeias, e com a Casa Santa Maria, entidade local sem fins lucrativos que atende crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade social. No final da coleta do mel, a Associação vende o mel produzido nas colmeias, distribui os lucros entre seus associados e parte do dinheiro da venda de cada quilo de mel é doada para a Casa Santa Maria. Esse programa é um importante indicador biológico, uma vez que a existência de abelhas em nossas áreas demonstra que o uso de pesticidas tem ocorrido de forma segura.

Outro programa de destaque é o Bicho Vivo, realizado em parceria com a Polícia Militar Ambiental de SP e com a Vigilância Ambiental do município de São Manuel. A iniciativa visa o monitoramento da fauna local com uso de câmeras posicionadas em locais estratégicos e da contribuição de colaboradores em campo. Esses dados são armazenados em banco de dados e permitem à São Manoel avaliar a fauna local e adequar suas medidas de proteção.

A vegetação nativa também é destaque em nossas atividades. O programa de restauração iniciou na década de 80, com a implantação do primeiro viveiro de mudas nativas da usina. Com base no levantamento florístico realizado em parceria com a ESALQ-USP em 2009, possuímos 100% das espécies indicadas para nossa região, segundo o Instituto de Botânica de SP, preservadas em nossas áreas de vegetação nativa. Atualmente, nosso viveiro possui cerca de 100 mil mudas nativas de ocorrência regional de 94 espécies diferentes, utilizadas para plantio em nossas áreas de restauração.

AgriBrasilis – Certificações (como Bonsucro, RenovaBio, Etanol Mais Verde) fazem mesmo a diferença? Por quê?

Pedro Dinucci – Certamente fazem a diferença. As certificações possuem indicadores de desempenho e, para manutenção do certificado, essa melhoria deve ser contínua. A São Manoel é signatária do Protocolo Agroambiental (Etanol Mais Verde) desde 2007, certificação essa que possuía dentre os indicadores a eliminação gradativa da queima da cana como método pré-colheita; métrica de consumo de água (m³/tc – metro cúbico por tonelada de cana processada); e cadastro ambiental rural das áreas de fornecimento de cana. A certificação Bonsucro foi implantada em 2011, sendo a São Manoel a segunda usina no mundo a possuir essa certificação. Já a certificação RenovaBio demonstra nosso compromisso com a produção de biocombustíveis (etanol) de forma eficiente, sendo que, quanto melhor for nossa eficiência produtiva, maior será nossa emissão de Créditos de Descarbonização.

AgriBrasilis – O que é e qual é a importância do corredor ecológico adotado nas lavouras da empresa?

Pedro Dinucci – Corredores ecológicos são áreas de vegetação implantadas com o objetivo de conectar um fragmento florestal a uma Área de Preservação Permanente. Os corredores têm papel importante no equilíbrio e na preservação das espécies de fauna e flora, pois facilitam o deslocamento dos animais e a propagação de sementes de espécies nativas. O deslocamento da fauna nessas áreas se torna mais segura, evitando que animais transitem por áreas agrícolas e estradas rurais, minimizando possíveis incidentes. Esses corredores também favorecem o banco de sementes existente no solo e a perpetuação das espécies de ocorrência regional, contribuindo para a manutenção da biodiversidade.

AgriBrasilis – De que forma é realizado o manejo por drones na área e como isso se relaciona com a busca por sustentabilidade?

Pedro Dinucci – Os drones possuem várias utilizações na área agrícola como o monitoramento das áreas, o mapeamento, a coleta de dados e a aplicação de defensivos. Eles auxiliam na sustentabilidade, pois diminuem a utilização de maquinário agrícola e permitem a aplicação de produtos agrícolas de forma localizada, reduzindo o impacto ambiental.

AgriBrasilis – Como o clima e as queimadas têm afetado a produtividade da Usina?

Pedro Dinucci – As queimadas podem resultar na perda de nutrientes essenciais do solo, como nitrogênio e carbono. Nesses casos, é necessário repor os nutrientes perdidos através da adubação organomineral. As queimadas também interferem no ciclo da cana, sendo necessário adiantar a colheita ou, em casos de cana sem porte de colheita, é necessário a roçagem da mesma.

 

 

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