“Uma possível consequência é que uma parcela da produção atual, destinada aos EUA, seja forçada a sair desse mercado…”
Isabel Quiroz é sócia fundadora e diretora-executiva da iQonsulting, consultoria chilena de fruticultura.
Quiroz é engenheira agrônoma pela Universidade Católica do Chile, com mestrado em mercados, marketing e sustentabilidade.

Isabel Quiroz, sócia fundadora da iQonsulting
AgriBrasilis – Como a tarifa de 10% imposta pelos EUA afetará a indústria de frutas do Chile?
Isabel Quiroz – Em geral, esse aumento será repassado ao consumidor final. Nessa perspectiva, e considerando as principais exportações de frutas do Chile para os EUA, uvas, mirtilos, frutas de caroço, tangerinas e maçãs serão os cultivos mais afetadas pela tarifa.
O primeiro nível afetado da cadeia será o consumidor. Os agricultores também devem acabar sendo prejudicados. É improvável que os níveis intermediários sejam afetados, como os varejistas, agentes intermediários e importadores.
Uma possível consequência é que uma parcela da produção atual, destinada aos EUA, seja forçada a sair desse mercado a explorar novas alternativas. Portanto, é muito provável que o Chile veja um declínio nas exportações dos principais itens que exporta, concentrando-se apenas em itens de alta qualidade, que podem arcar com esse aumento das tarifas.
AgriBrasilis – Quais foram os resultados da missão internacional realizada em março para fortalecer relações agrícolas entre Brasil e Chile?
Isabel Quiroz – As relações entre Brasil e Chile são muito próximas, e isso se reflete no aumento sistemático das exportações entre os países.
A missão internacional pode ser considerada muito bem sucedida, com um importante nos avanços para facilitar a troca de bens e serviços e expandir o escopo dos acordos existentes entre o Chile e o Brasil.
O Brasil é atualmente o principal parceiro comercial do Chile nas exportações de frutas na América Latina. O Brasil é um país muito diverso, com nichos de mercado variados, capaz de consumir uma grande variedade de produtos. O conhecimento dos produtores e exportadores chilenos sobre esse mercado lhes permitirá posicionar melhor seus produtos. Um exemplo disso foi a expansão das variedades de maçã no Brasil, em que variedades consideradas populares apenas nos EUA ou na Europa, como Honey Crisp e Pink Lady, também encontraram seu lugar no país.
“…agora é possível irrigar com metade da água usada há 15 anos em muitos setores, sem afetar a produtividade.”
AgriBrasilis – Como o setor está inovando para conquistar mais mercados?
Isabel Quiroz – Atualmente, a principal linha de inovação é a transformação para uma agricultura sustentável. Cada vez mais empresas têm buscado essa transformação, tanto os produtores quanto os exportadores, e certamente esse será o grande impacto que o Chile terá no mercado no futuro.
No Chile, é possível produzir agricultura com impacto ambiental mínimo, ou até mesmo com impacto positivo quando falamos de agricultura regenerativa. Se olharmos para os projetos atuais, a maioria está na área da pecuária regenerativa, mas os fruticultores também estão indo seguindo esse caminho.
Outro ponto é a inovação tecnológica, que inclui gerenciar a produção com dados em tempo real e introduzir novas genéticas com variedades mais alinhadas aos interesses do mercado. Sabemos que as pessoas buscam produtos que satisfaçam não apenas o sabor e a necessidade de um produto de qualidade, mas também querem um produto prático e fácil de consumir, que seja saudável e nutritivo.
Os mercados estão em constante mudança e, portanto, a diversificação e o forte posicionamento do Chile podem facilitar transferências de produtos quando um mercado falha. Nesse sentido, a América Latina e o Brasil em particular renovaram o interesse dos exportadores chilenos, pela capacidade de consumo e pela proximidade do mercado.
AgriBrasilis – Quais têm sido as consequências da seca para a fruticultura no país?
Isabel Quiroz – A seca causou uma reorganização dos espaços produtivos. Um número significativo de hectares produtivos foi removido do sistema, incluindo no caso das uvas de mesa, abacates, nozes e amêndoas. Mesmo assim, a tecnologia veio para ajudar os produtores: agora é possível irrigar com metade da água usada há 15 anos em muitos setores, sem afetar a produtividade.
AgriBrasilis – Por que a inovação por meio de novas variedades de maçã não teve os resultados esperados?
Isabel Quiroz – A introdução de uma nova variedade, tanto produtiva quanto comercialmente, envolve muitos riscos. Nem sempre a variedade produzirá bons resultados só porque é nova.
A questão é que é muito difícil realizar testes e ao mesmo tempo aumentar a oferta de uma variedade que se adapte ao mercado. Na maioria das vezes isso é feito em paralelo. Quando uma variedade tem alta aceitação, isso é muito positivo para os produtores.
Em alguns casos não há aceitação, que é o que observamos no Chile com algumas das variedades de maçã que foram introduzidas. Entre elas está a variedade Kanzi, com todas as características que deveriam ser adaptadas ao gosto europeu. Não foi esse o caso. Até a produção europeia de Kanzi está com problemas. Os preços atingiram valores que não são convenientes para os produtores locais, nem para o fornecimento importado da variedade.
Em última análise, a opção da indústria chilena foi fortalecer suas linhas básicas ou de commodities e ser muito eficiente nelas. Variedades como Gala, Fuji, Pink Lady no Chile têm uma produção tão alta que quase podem ser consideradas commodities. Outras variedades básicas, como a Red Delicious ou a maçã verde, estão sendo valorizadas novamente porque não existem outras alternativas.
No entanto, novas variedades continuam sendo testadas e, no futuro, certamente veremos mudanças importantes no mercado de maçãs.
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