Altas temperaturas e precipitação irregular prejudicaram soja em 2023

soja MT

“…no momento do plantio da soja, nós tivemos plantas daninhas já emergidas, velhas e estressadas devido às altas temperaturas e falta de chuva…”

Lucas Barcellos é pesquisador na área de plantas daninhas da Fundação MT, engenheiro agrônomo, mestre e doutor pela Universidade Federal de Viçosa.

soja

Lucas Barcellos, pesquisador da Fundação MT


AgriBrasilis – O atraso no plantio de soja vai prejudicar a safra de milho?

Lucas Barcellos – Essa é uma resposta muito pessoal, própria da realidade de cada produtor. Acredito que, em casos pontuais, o produtor possa sim sair da janela ideal de plantio do milho e ter a safra impactada negativamente, principalmente se a chuva “cortar” mais cedo, antes do enchimento dos grãos. Mas existem outros fatores, como o preço da commodity, que pode impactar mais fortemente na safra do milho.

AgriBrasilis – O que mais prejudicou o sojicultor esse ano?

Lucas Barcellos – Com certeza foram as condições climáticas. As altas temperaturas e baixos volumes de precipitação na região Centro-Oeste do Brasil, além de afetarem os aspectos morfofisiológicos da soja, proporcionaram ataques severos de pragas e plantas daninhas nas lavouras. A adversidade climática resultou em dificuldade de controle de pragas e plantas daninhas e na sensibilidade da cultura aos produtos químicos.

AgriBrasilis – O capim pé-de-galinha coloca em risco a soja em MT? Que outras plantas invasoras são preocupantes?

Lucas Barcellos – O capim pé-de-galinha (Eleusine indica), e também outras espécies de plantas daninhas, como: capim amargoso (Digitaria insularis), buva (Conyza bonariensis), vassourinha-de-botão (Spermacoce verticillata), caruru (Amaranthus spp.), sorgo-de-alepo (Sorghum halepense), e até mesmo o milho tiguera têm desafiado muito o produtor.

Devido à dificuldade de controle com herbicidas, seja por conta de plantas resistentes ou tolerantes, faz-se necessário a adoção de práticas que integrem todo o sistema produtivo da área para garantir uma melhor eficiência de controle das plantas daninhas.

AgriBrasilis – Quais os principais pontos a serem considerados para um manejo eficiente?

Lucas Barcellos – Não podemos mais pensar apenas no controle químico (uso de herbicidas) como ferramenta única. A complexidade das plantas daninhas tolerantes ou resistentes aos herbicidas exige que o produtor utilize o manejo integrado de plantas daninhas (MIPD).

O MIPD consiste em diferentes estratégias de manejo, desde a prevenção da ocorrência de espécies-problema na lavoura até métodos culturais, mecânicos e físicos. Todas essas práticas integradas direcionam o melhor uso dos recursos para a soja e possibilitam que a cultura “vença” a competição com as plantas daninhas.

O controle químico é mais uma ferramenta, e que certamente contribui com o manejo, desde que seja usada de forma planejada e consciente, com a rotação de mecanismos de ação no sistema de produção. Além disso, é imprescindível a adoção de dessecação antecipada (manejo outonal) e uso de herbicidas que inibem ou retardam a emergência de plantas daninhas (herbicidas pré-emergentes).

“Então, no momento do plantio da soja, nós tivemos plantas daninhas já emergidas, velhas e estressadas…”

AgriBrasilis – O senhor disse que as altas temperaturas estão dificultando o controle de plantas invasoras. Por quê? Quais as consequências?

Lucas Barcellos – Não só as altas temperaturas, mas a associação delas com o momento em que tivemos precipitação. O que aconteceu em muitas regiões do MT foi chuva na entressafra, que proporcionou a emergência de plantas daninhas, em meados de junho/julho. O produtor que não se atentou em fazer a dessecação antecipada e deixou para o plantio da soja encontrou plantas daninhas já velhas na área e, em muitos casos, plantas perenizadas, de rebrote vindo da safra anterior.

Então, no momento do plantio da soja, nós tivemos plantas daninhas já emergidas, velhas e estressadas devido às altas temperaturas e falta de chuva. Nessa condição, os herbicidas dessecantes não tiveram a performance desejável sobre as plantas daninhas, especialmente sobre as gramíneas, como o capim pé-de-galinha, capim amargoso e milho tiguera. Isso resultou em alta competição das daninhas com a soja, comprometendo o estande inicial, além do estresse da soja causado por herbicidas pós-emergentes.

AgriBrasilis –  Essa safra é pior quando comparada às anteriores? 

Lucas Barcellos – Em relação às condições climáticas, na safra passada (2022/23) tivemos quantidade e distribuição das chuvas que proporcionaram uma ótima performance do potencial produtivo da soja e da segunda safra.

A safra 2022/23 teve água disponível nos momentos mais importantes para a soja, temperaturas próximas das condições ótimas e radiação solar adequada. Em 2023/24, todos esses componentes do clima apresentaram comportamento distinto, impactando nos aspectos fisiológicos da soja e no fluxo de pragas e plantas daninhas. Mesmo assim, essa não é a primeira vez que a agricultura passa por anos desafiadores como esse. Na verdade, anos desafiadores são até os mais frequentes.

 

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