“… haverá redução de precipitação com reflexo direto na produtividade de milho, arroz e feijão”
Eduardo Delgado Assad, pesquisador na Embrapa Informática Agropecuária, explica efeitos das mudanças climáticas na agricultura sulamericana.

Eduardo Delgado Assad, pesquisador na Embrapa Informática Agropecuária
Eduardo Delgado Assad é engenheiro agrícola pela Universidade Federal de Viçosa, com doutorado pela Universidade de Montpellier, França. Especializado em sensoriamento remoto no CNES (Centre National d´Études Spatiales) em Toulouse, é pesquisador da Embrapa desde 1987. Foi chefe de Pesquisa e Desenvolvimento da Embrapa Cerrados e da Embrapa Informática Agropecuária, coordenador técnico nacional do Zoneamento Agrícola de Riscos Climáticos do Ministério da Agricultura, e secretário de Mudanças Climáticas e Qualidade Ambiental do Ministério do Meio Ambiente.
A agricultura é um dos setores mais afetados por fenômenos naturais extremos. Com as alterações climáticas, riscos para a segurança alimentar e nutricional são multiplicados pelo aumento da frequência e intensidade dos eventos extremos, bem como catástrofes relacionadas ao clima. Aumento da temperatura média implica em alterações na precipitação e vento. Nos últimos 20 anos, estudos feitos no Brasil evidenciaram o impacto, a partir de análises de vulnerabilidade da produção de grãos em face de eventos extremos e alterações climáticas.
O Brasil é grande produtor de grãos, carne e frutas, e o setor agropecuário contribui com 21,4% do PIB e 19,5% da força de trabalho. Na última safra de 2020, foram produzidos 232 milhões de toneladas de grãos. Alguns efeitos importantes de perdas na produção foram observados, principalmente para milho safrinha e soja. Essas perdas foram devidas a variações climáticas como seca intensa e ondas de calor.
Mais de 90% da agricultura brasileira é de sequeiro, depende da estação chuvosa, tanto em termos de quantidade quanto de distribuição. A interação entre chuva, temperatura e água no solo é determinante para a produção no Brasil. Para estimar possíveis perdas, são utilizados modelos climáticos que permitem verificar a produtividade atual e estimar a futura, principalmente em termos de deficiência hídrica.
Projeções dos efeitos das alterações climáticas na agricultura no Brasil para 2050 indicam que o setor poderá sofrer perdas expressivas. As regiões mais vulneráveis às alterações climáticas seriam a Amazônia e o Nordeste: Na Amazônia, o aumento da temperatura pode atingir 8°C até 2100, onde modelos indicam a possibilidade de mudanças na floresta amazônica para vegetação tipo savana. A agricultura sofreria perdas expressivas em todos os estados, com exceção dos mais frios do Sul e do Sudeste, que registariam temperaturas amenas.
Para estimativas de produtividade futura são utilizados dados oficiais do Brasil do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, que disponibiliza uma série histórica de dados de área plantada, produção e produtividade em cada município do Brasil. Dessa maneira é estimada a perda de produtividade em função dos parâmetros climáticos futuros, utilizando os modelos climáticos do IPCC, no caso específico o modelo Hadgem2-ES, adaptado para o Brasil e fornecido pelo INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) conhecido como ETA-Hadgem.
As projeções futuras são feitas para as culturas de soja, milho, arroz, feijão. Considerando a heterogeneidade brasileira em termos de clima, solo, relevo, vegetação, as estimativas foram feitas para os Biomas Amazônia, Cerrado, Semiárido, Mata-Atlântica e Pampa. A maior parte da produção agrícola está concentrada no Bioma Cerrado e região sul da Mata Atlântica.
Na tabela abaixo são indicadas as possíveis perdas em cada bioma brasileiro para cada cultura em períodos que variam de 2010 até 2050. Os períodos mais críticos são as décadas de 2020 – 2030 e 2030 – 2040. Perdas mais acentuadas estariam no Cerrado e Mata-Atlântica, podendo ser maiores do que 30% em relação ao período de 2010 a 2020. Essa situação ocorre se nada for feito para amenizar os impactos das mudanças do clima.

Efeitos das mudanças climáticas na produtividade das culturas nos biomas brasileiros
A adoção de práticas de baixa emissão de carbono, que já é uma política oficial de financiamento agrícola, poderá reduzir esse impacto. Alguns resultados ainda não publicados mostram que aqueles que adotaram essas práticas em condição de eventos extremos de deficiência hídrica perderam 10% na produtividade. Agricultores que não adotaram perderam 25% na produtividade.
Estimativa de perdas de produtividade para culturas de soja, milho, arroz e feijão em 5 Biomas brasileiros, entre os anos 2011 a 2050.
Na América Central, principalmente nos países como Costa Rica, Honduras, Guatemala e El Salvador, resultados indicam os impactos das mudanças climáticas na agricultura. Haverá redução de precipitação com reflexo direto na produtividade de milho, arroz e feijão.
Em todos os casos há uma tendência de redução de produtividade, mesmo que as perdas sejam atenuadas pelo incremento de tecnologia. As possibilidades de redução dos impactos vão passar obrigatoriamente pela adoção de sistemas integrados, que na sua essência, atuam diretamente no manejo e conservação de solo e água.
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