“Práticas como sistemas integrados, agricultura de baixo carbono e conservação já estão em curso no campo…”
Eduardo Bastos é CEO do Instituto Equilíbrio, engenheiro agrônomo formado pela ESALQ/USP, com MBA pela Fundação Dom Cabral e FGV.
Bastos é diretor-executivo do Instituto de Estudos do Agronegócio na Associação Brasileira do Agronegócio; presidente da Câmara do AgroCarbono no MAPA e integrante do Comitê Interministerial do Plano Nacional de Conversão de Pastagens Degradadas.
AgriBrasilis – Qual o papel do Brasil em relação à segurança alimentar, climática e energética?
Eduardo Bastos – O Brasil ocupa uma posição estratégica única: é um dos poucos países com capacidade real de liderar simultaneamente as agendas alimentar, climática e energética. Produzimos alimentos em escala global, com eficiência e espaço para expandir sem precisar abrir novas áreas. Na agenda climática, somos protagonistas com práticas de agricultura regenerativa, sistemas integrados e políticas como o Plano ABC+. E, no campo energético, temos uma das matrizes mais limpas do mundo, com destaque para bioenergia e fontes renováveis.
Essas agendas se encontram no campo. O agro é onde se cruzam produção de alimentos, uso da terra e energia. Se promovermos equilíbrio entre produtividade e preservação, com políticas públicas estáveis, ciência e inovação, o Brasil pode se tornar referência global em soluções integradas de desenvolvimento sustentável.
AgriBrasilis – Por que a COP30 é importante para o agro?
Eduardo Bastos – A COP30 será uma vitrine global — e uma chance de ouro para mostrar que o agro brasileiro não é parte do problema, mas parte da solução. Práticas como sistemas integrados, agricultura de baixo carbono e conservação já estão em curso no campo. A COP pode reposicionar o setor, atrair investimentos e consolidar o Brasil como líder climático no uso da terra. Mas, para isso, o agro precisa estar à mesa com dados, propostas, financiamento e protagonismo.
AgriBrasilis – Quais são os principais planos de ESG no agro e qual é a relevância da conversão de pastagens?
Eduardo Bastos – O agro vem evoluindo em ESG com foco em rastreabilidade, uso eficiente de recursos e boas práticas. O Plano ABC+ é um dos pilares dessa evolução. A conversão de pastagens degradadas é um dos caminhos mais eficazes para gerar renda, aumentar a produtividade e evitar emissões sem precisar abrir novas áreas. Com mais de 90 milhões de hectares subutilizados, o Brasil tem a chance de transformar passivo ambiental em ativo econômico — e com isso consolidar seu protagonismo sustentável.
AgriBrasilis – “Não existe transição climática sem financiamento.” Em que patamar se encontra o crédito verde no Brasil?
Eduardo Bastos – O financiamento verde está em fase de amadurecimento no Brasil. Iniciativas como o Programa Nacional de Conversão de Pastagens Degradadas já mobilizaram 30 bilhões em crédito, mas ainda representam apenas uma fração da escala necessária.
Além do crédito rural tradicional, começam a surgir novos instrumentos — como equity e barter agreements — com investidores estrangeiros interessados em projetos sustentáveis de longo prazo. Isso é positivo, mas exige uma estrutura mais robusta: regulação clara, acesso para pequenos produtores e segurança jurídica.
O apetite global por ativos sustentáveis é real. O Brasil tem solo, sol, ciência e gente pronta para inovar. Se organizarmos os instrumentos certos, podemos ser o maior receptor de crédito verde do mundo — não por caridade, mas por visão estratégica.
AgriBrasilis – Como mensurar os resultados da transição climática no agro?
Eduardo Bastos – Medir é essencial. Sem mensuração, não há como comprovar impacto, melhorar práticas ou gerar valor. O Brasil precisa urgentemente de um MRV tropical — um sistema de Monitoramento, Reporte e Verificação adaptado à nossa realidade agrícola: solos diversos, múltiplas safras, integração lavoura-pecuária-floresta.
Esse sistema deve incluir dados sobre emissões evitadas, carbono no solo, produtividade, biodiversidade e eficiência no uso de recursos. Já temos iniciativas promissoras como o Plano ABC+ e avanços no REDD+, mas falta escala e integração no agro.
O MRV tropical é o caminho para gerar confiança, atrair investimentos e transformar boas práticas em vantagem competitiva. É hora de consolidar isso com protocolo, tecnologia e capacitação.
AgriBrasilis – Onde o Brasil precisa avançar para transformar metas climáticas em resultados concretos?
Eduardo Bastos – Precisamos transformar discurso em prática. Isso requer avanços simultâneos em três frentes fundamentais: governança, incentivos e capacitação.
Governança significa ter metas nacionais claras, baseadas em dados, e alinhamento entre as esferas federal, estadual e municipal. Também exige articulação com o setor privado e coerência regulatória. Já os incentivos devem incluir mecanismos como financiamento verde, seguro rural climático e mercado de carbono — instrumentos que tornem a transição não apenas necessária, mas vantajosa para quem produz. Por fim, a capacitação é o que garante que o conhecimento chegue à ponta: técnicos, produtores, cooperativas e gestores locais preparados para aplicar, monitorar e escalar boas práticas.
O Brasil já tem uma base sólida: ciência reconhecida, tecnologias disponíveis, práticas eficientes. O que falta é coordenação, escala e velocidade para transformar isso em entregas concretas e mensuráveis.
É exatamente nesse contexto que o Instituto Equilíbrio atua. Nosso papel é construir pontes entre o setor produtivo, a ciência e os formuladores de políticas públicas, promovendo o diálogo técnico, a produção de evidências e o desenvolvimento de soluções viáveis para o país. Acreditamos que o Brasil pode — e deve — liderar a agenda de clima e desenvolvimento com base em dados, neutralidade técnica e responsabilidade institucional.
Nosso compromisso é posicionar o agronegócio brasileiro como protagonista da transição verde, oferecendo inteligência estratégica para a formulação de políticas públicas inovadoras e a implementação de soluções climáticas aplicadas. Não basta ter metas ambiciosas — é preciso entregá-las. E o IE existe para ajudar o Brasil a transformar potencial em realidade.
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