Pesquisador do IAC fala sobre tecnologia e segurança na aplicação de agrotóxicos no Brasil

Published on: July 7, 2025

“…costumo dizer que uma pulverização segura só é possível quando se tem um bom equipamento…”

Hamilton Humberto Ramos é pesquisador científico do Centro de Engenharia e Automação do Instituto Agronômico – IAC

Ramos é formado em agronomia, com mestrado e doutorado pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho.

Hamilton Humberto Ramos, pesquisador do IAC


AgriBrasilis – Como realizar a aplicação de agrotóxicos de forma segura?

Hamilton Ramos – A aplicação segura de um agrotóxico depende de fatores que vão desde a aquisição do produto, passando pelo transporte até e dentro da propriedade, pelo armazenamento, pela aplicação e pelo descarte das sobras e das embalagens. Cada uma destas fases possui especificidades que tornam a utilização segura. 

Com relação especificamente a aplicação, costumo dizer que uma pulverização segura só é possível quando se tem um bom equipamento (sem vazamentos, com bom sistema de agitação, com filtros adequados, pontas dentro da vida útil, etc), bem regulado (velocidade compatível, tamanho de gota adequado, perdas reduzidas, boa cobertura do alvo, etc) e operado por uma pessoa capacitada (capaz de identificar possíveis necessidades de alteração na regulagem ou de parar a pulverização pulverização por exemplo).

AgriBrasilis – Quais fatores são determinantes na Tecnologia de Aplicação (TA) para garantir um manejo adequado?

Hamilton Ramos – Para garantir o manejo adequado, primeiro deve-se entender se a aplicação é necessária, e aqui entram os conceitos de manejo integrado de pragas e doenças. Uma vez que ela é considerada necessária, o objetivo da Tecnologia de Aplicação é “colocar o produto biologicamente ativo no alvo (seja ele químico ou biológico), em quantidade necessária, de forma econômica e com o mínimo de contaminação de outras áreas”. Assim, é fundamental conhecer o alvo biológico (onde a praga se localiza na planta), o alvo químico (onde se deve colocar o produto para ele ter capacidade de atingir a praga), o momento da aplicação (se de forma preventiva ou curativa, se na pós ou pré emergência do mato, etc), as condições ambientais no local e época de aplicação bem como as condições de manutenção e regulagem do pulverizador. Não existe um fator mais importante, todos são responsáveis pelo sucesso da pulverização.

AgriBrasilis – Quais as diferenças na TA entre produtos biológicos e químicos?

Hamilton Ramos – Em termos de Tecnologia de Aplicação os princípios são os mesmos. Mudam alguns conceitos como alvo químico, preparo de calda, cobertura necessária do alvo, etc. Para cada tipo de produto, seja ele químico ou biológico, existe uma Tecnologia de Aplicação mais adequada.

“São avaliadas as funcionalidades dos adjuvantes para identificar suas potencialidades…”

AgriBrasilis – O que é avaliado para a obtenção do Selo Oficial de Funcionalidade para Adjuvantes Agrícolas?

Hamilton Ramos – São avaliadas as funcionalidades dos adjuvantes para identificar suas potencialidades. Um adjuvante, quando colocado na calda de pulverização com um produto químico ou biológico, tem a função de melhorar o processo de pulverização (utilitários) ou potencializar a eficácia do produto associado a ele depois que atingir o alvo (potencializadores). Para realizar estas funções, eles podem ter diferentes funcionalidades, como redutor de evaporação, redutor de deriva, tensoativo, espalhante, etc. Assim, é importante conhecer estas funcionalidades para selecionar o melhor adjuvante para os diferentes cenários de pulverização. 

Por exemplo, no uso de gotas grossas um redutor de evaporação pode não ser importante, mas um espalhante, que auxilie a melhorar a cobertura de pulverização, sim. Por outro lado, a utilização de gotas finas já produz uma cobertura maior do alvo, o que faz com que um espalhante possa não ser necessário, no entanto, elas são mais suscetíveis a evaporação, podendo ser perdidas no trajeto entre o bico e o alvo. Neste caso, um redutor de evaporação seria importante. Por este motivo, no IAC buscamos desenvolver métodos para a avaliação individual de cada uma destas funcionalidades, como forma de auxiliar tecnicamente os fabricantes de adjuvantes na recomendação de seus produtos. 

Para a obtenção do selo, é necessário que os fabricantes de adjuvantes utilizem em seus produtos os métodos já desenvolvidos pelo IAC e que assinem conosco um termo de uso da marca, que é gratuito.

AgriBrasilis – Em que consiste o curso de treinamento de aplicação de agrotóxicos do IAC?

Hamilton Ramos – No IAC temos diferentes cursos de aplicação de agrotóxicos. Temos, por exemplo, os proporcionados pelo Programa Aplique Bem, que é parceria do IAC com a UPL, voltado a aplicadores e usuários. Esses treinamentos são itinerantes, ou seja, vão até as propriedades de diferentes regiões do país por meio dos nossos Tech Móveis, que são veículos especialmente adaptados para este tipo de treinamento, totalmente gratuitos ao produtor. Esses treinamentos têm a duração de 8 horas teórico-práticas e a limitação de 20 pessoas por turma como forma de elevar a assimilação do aprendizado. Atuando desde 2007, já foram atendidas mais de 90.000 pessoas em 23 estados brasileiros. 

Outro tipo de treinamento é o proporcionado pela UR – Unidade de Referência em Tecnologia e Segurança na Aplicação de Produtos Químicos e Biológicos. Esses treinamentos são desenvolvidos tanto à distância (EAD) em nossa plataforma, quanto presencialmente de forma teórico-prático, e são voltados a agentes multiplicadores, ou seja, professores e técnicos dedicados ao treinamento de pessoas. Nesse caso, além dos treinamentos pré-formatados, existe a possibilidade do desenvolvimento de “in company”, desenvolvidos para empresas para a solução de problemas específicos. 

AgriBrasilis – Como a falta de recursos tem afetado as pesquisas do Instituto?

Hamilton Ramos – Tem afetado muito, e de forma significativa. Para o desenvolvimento de projetos, para uma parte dos pesquisadores do IAC em função da área de pesquisa mais aplicada, ainda é possível a parceria com a iniciativa privada por meio de Fundações como a FUNDAG – Fundação de Apoio à Pesquisa Agrícola, o que tem sido fundamental para a manutenção de muitos programas de pesquisa. No entanto não há concurso para reposição de pesquisadores ou de pessoal de apoio, os salários estão sem reajuste a mais de 10 anos reduzindo o interesse pela carreira e os investimentos para manutenção de equipamentos e infraestrutura praticamente não existem.

No Centro de Engenharia e Automação, nos últimos 30 anos tivemos uma redução de mais 70% no número de pessoas dedicadas a pesquisa, entre pesquisadores e pessoal de apoio, levando a paralisação de áreas de pesquisa como Ensaio de máquinas, implementos e componentes e de Fontes de energia alternativa na agricultura. Infelizmente somos a regra e não a exceção.

 

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