Agtechs bem-sucedidas se conectam aos desafios reais do agro

Published on: June 26, 2025

“O Radar Agtech Brasil 2024 traz casos emblemáticos de inovação aberta e cocriação entre startups e grandes corporações…”

Luiz Ojima Sakuda (esquerda) é sócio da Homo Ludens e co-coordenador do Radar Agtech, formado em administração pela FGV, com doutorado em engenharia de produção pela USP.  

Aurélio Favarin (direita) é pesquisador da Embrapa e co-coordenador do Radar Agtech, formado em relações públicas pela UEL, com mestrado pela Universidade de Madrid. 


AgriBrasilis – O que faz uma agtech vencer onde tantas falham?
Sakuda e Favarin – É possível observar que as agtechs mais resilientes compartilham algumas características: 

– Foco em resolver desafios reais da cadeia produtiva agroalimentar, principalmente dentro da porteira, como tecnologias associadas à aplicação e monitoramento, além do foco em temas que dão sustentação à produção agropecuária, como crédito. 

– Capacidade de adaptação e integração regional, entendendo a diversidade dos biomas, perfis de produtores e cadeias produtivas — por exemplo, a interiorização das soluções e a personalização dos modelos de negócio conforme o segmento da cadeia (antes, dentro e depois da porteira). 

– Participação em ecossistemas estruturados, que possuam bom volume e diversidade de ambientes de inovação e programas de inovação aberta. Em 2024, foram mapeados 451 ambientes de inovação, mostrando a importância de inserção em redes bem conectadas e estruturadas. 

Resiliência financeira e estratégica: Acesso a capital e governança sólida são decisivos. 

AgriBrasilis – Por que o número de agtechs financeiras cresceu tanto?
Sakuda e Favarin – As AgFintechs se tornaram protagonistas por diversas razões. O acesso a crédito rural tradicional ainda é uma dor para pequenos e médios produtores. AgFintechs oferecem soluções mais acessíveis, digitais e adaptadas à realidade do campo e dos produtores, com produtos customizados. 

AgriBrasilis – A falta de digitalização no campo ainda é um obstáculo?
Sakuda e Favarin – A conectividade rural permanece um desafio importante, mas com avanços expressivos. Dados da Pesquisa TIC Domicílios 2024 mostram que os domicílios rurais brasileiros que possuem acesso à internet passaram de 22,3% em 2015 para 73,8% em 2023. Ainda assim, persistem desigualdades regionais e limitações de infraestrutura, especialmente em áreas de baixa densidade populacional. 

A falta de conectividade impacta diretamente o uso pleno de tecnologias. Capacitação técnica também é uma barreira. Muitos produtores ainda não têm familiaridade com soluções digitais e demandam formação continuada. 

AgriBrasilis – Quais os exemplos de destaques da colaboração entre startups e grandes empresas do agro? 

Sakuda e Favarin – O Radar Agtech Brasil 2024 traz casos emblemáticos de inovação aberta e cocriação entre startups e grandes corporações, como Programas da Embrapa, PwC Agtech Innovation e do Agro Valley Londrina, que conectam diferentes atores do ecossistema de inovação, como startups, grandes empresas, investidores, universidades e produtores rurais. Para colocar alguma exemplos: 

– Soja Baixo Carbono, coordenado pela Embrapa Soja, em parceria com o setor privado, foca no estabelecimento de um protocolo soja baixo carbono; 

– AgNest: farmlab localizado em Jaguariúna, coordenado pela Embrapa, em parceria com Banco do Brasil, Jacto e outras organizações, oferece um espaço de experimentação para startups conectadas às instituições envolvidas; 

– Soja Sustentável do Cerrado: liderado pela PwC Agtech Innovation, com participação da Embrapa e parceiros, fomenta o desenvolvimento de tecnologias conectadas à soja para o Cerrado; 

– Agro Valley Londrina: governança do ecossistema de inovação de Londrina/PR, com a participação da Cocriagro, Embrapa Soja, Sebrae, Integrada, IDR-PR, UTFPR, etc. 

AgriBrasilis – Qual é o papel das incubadoras e os ecossistemas de inovação?
Sakuda e Favarin – As incubadoras funcionam como berçários de inovação, sendo responsáveis pelos primeiros estágios de desenvolvimento de startups e suas tecnologias. De forma geral, a maior parte das incubadoras são públicas. As aceleradoras, por sua vez, são em geral privadas, focadas em dar escala para as tecnologias das startups.
Os ecossistemas de inovação fortalecem a governança territorial, essencial para sustentar a inovação no longo prazo, especialmente diante das pressões climáticas e da agenda ESG. 

AgriBrasilis – O que os novos levantamentos da Radar Agtech revelam sobre o setor? 

Sakuda e Favarin – O Radar Agtech 2024 trouxe avanços estruturais importantes:
– Crescimento de 1.125 (2019) para 1.972 agtechs (2024), com maior diversidade regional e segmentação mais equilibrada da cadeia agroalimentar (antes, dentro e depois da fazenda).
– Segmento “dentro da fazenda” ultrapassou os demais, com 818 agtechs (41,5%), refletindo o avanço da digitalização na produção primária.
– Investimentos robustos: US$ 550 milhões captados em 2024 (+25% vs. 2023). Cinco rodadas brasileiras representaram 30% de todo o volume captado na América Latina.
– Tendências apontadas pelos investidores incluem: bioinsumos, IA, IoT, rastreabilidade via blockchain, genômica, carne cultivada e soluções de economia circular.
O ecossistema agroalimentar está mais maduro, resiliente e conectado, com potencial para liderança global em inovação aplicada ao agro. 

AgriBrasilis – O que é o Radar Agtech e quais as ações planejadas do projeto?
Sakuda e Favarin – O Radar Agtech projeta um futuro de expansão e internacionalização, com diversas iniciativas estratégicas em desenvolvimento. Entre os principais planos estão a publicação do Radar em inglês e espanhol, ampliando seu alcance e influência na América Latina e em mercados globais. Estão previstas ainda pesquisas e eventos regionais e temáticos, como estudos voltados a políticas públicas, webinars, premiações e programas de capacitação tanto para produtores quanto para startups. Uma nova plataforma digital de conexão com suporte de inteligência artificial também está em fase de desenvolvimento, reforçando o papel do Radar como ferramenta interativa de articulação do ecossistema. Essa visão de futuro consolida o Radar Agtech como um hub de conhecimento e inovação estratégica para o agro, com impacto crescente na formulação de políticas, fomento ao empreendedorismo e integração entre ciência, tecnologia e mercado.

 

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