O crescimento e a versatilidade do sorgo no Brasil

“Em 2023, o incremento da área cultivada de sorgo foi superior ao que ocorreu para o milho e a soja, principalmente em função do menor custo de produção…”

Carlos Juliano Brant Albuquerque é professor adjunto da Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG, agrônomo, mestre e doutor pela Universidade Federal de Lavras.

Carlos Albuquerque, professor da UFMG


Por que plantar sorgo?

O sorgo tem se mostrado eficiente para uso em sucessão à soja ou no verão nas regiões semiáridas do Brasil. O sorgo é uma planta bastante versátil, podendo ser usado na fabricação de ração (sorgo granífero), produção de forragem (sorgo silageiro ou corte/pastejo), produção de bioenergia (sacarino e biomassa), fabricação de vassoura e artesanato (sorgo vassoura), etc. Essa versatilidade é um diferencial.

A capacidade do sorgo de ser produtivo mesmo em condições de temperaturas altas e veranicos acentuados, seu menor custo de produção, o ciclo curto, a qualidade nutricional dos seus grãos e forragens, tudo isso tem despertado o interesse dos produtores e consumidores.

O plantio de sorgo está crescendo no Brasil

Acompanho a cultura do sorgo no Brasil desde 2002. Nesse período, como agrônomo recém formado, filho e neto de produtores rurais do semiárido mineiro, nós considerávamos o sorgo como a principal cultura para alimentação do rebanho leiteiro no período seco do ano. Nessa época, o sorgo era componente importante nos sistemas de produção do cerrado, que envolviam soja no verão e sorgo safrinha em sucessão para formar palha no plantio direto e gerar renda com os grãos.

Em 2023, o incremento da área cultivada de sorgo foi superior ao que ocorreu para o milho e a soja, principalmente em função do menor custo de produção quando comparado com o milho. Atualmente, o principal sistema de produção do sorgo no Brasil (80%) é caracterizado pelo grupo granífero em áreas do Cerrado (soja e sorgo em sucessão).

Além do elevado preço das sementes do milho, a grande incidência de cigarrinha e consequente dificuldade de controle fez com que incrementos no custo de produção dessa cultura despertassem maior interesse por parte dos produtores em substituir o milho pelo sorgo.

O menor custo de produção (preço de sementes e baixo uso de defensivos), a maior valorização dos grãos no mercado interno e a estabilidade de produção ante as condições climáticas diversas deixaram a cultura do sorgo mais atrativa economicamente.

“No Brasil, a percepção é de que o sorgo é uma cultura rústica, resistente às intempéries do clima, à seca, e pouco exigente ao uso de insumos”

O grão do sorgo é um valioso recurso para alimentação animal. A qualidade da forragem de sorgo foi bem difundida e é bem aceita pelos pecuaristas. Sorgos silageiros muito altos, com baixa produção de grãos, de colmos fibrosos, com baixa relação panículas/colmo + folhas, perdem a disputa em qualidade quando comparados com milhos em geral, embora tenham altíssimo potencial de produção de matéria seca.

As diferenças nutricionais entre milhos e sorgos de porte mediano e de grande produção de grãos são bem menores ou inexistem. Entretanto, quando o milho passa por condição de estresse hídrico, a qualidade da silagem do sorgo no mesmo ambiente é superior.

O Brasil passa por um momento de fortes demandas energéticas. Os grupos produtores de energia buscam novas culturas produtoras de biomassa, e que se encaixem aos panoramas agrícola e industrial desses empreendimentos. Os sorgos dos tipos sacarino e biomassa são promissores para a produção de etanol de primeira geração e energia, respectivamente. Por serem de crescimento rápido e totalmente mecanizáveis, o interesse por essas espécies tem sido crescente. Contudo, ainda existe a necessidade de aprendizado sobre as boas práticas agrícolas da lavoura, visando máximas produtividades e ajustando o manejo cultural para cada região produtora e cultivar escolhida.

A indústria nacional de sementes tem atendido à demanda por cultivares de sorgo, garantindo o crescimento da área plantada com essa cultura. Em anos recentes, instituições nacionais e multinacionais têm entrado no mercado de sementes do sorgo gerando novas opções para os produtores.

A utilização de sorgo em consórcio para renovação de pastagens tem se mostrado interessante para amortizar custos e promover o incremento de carne e de leite em propriedades rurais. O uso do sorgo é destaque em condições marginais de cultivo para a maioria dos cereais. Nesse caso, prevalecem sistemas de produção em regiões semiáridas ou como opção em áreas do Cerrado, quando o plantio do milho estiver atrasado. Em ambas as situações, o consórcio do sorgo com forrageiras tem se mostrado prática vantajosa.

No geral, as diversas espécies de braquiárias são mais indicadas para esquemas de consórcio. Após semeadura a lanço da forrageira, o sorgo deve ser semeado na área com as rodas do trator incorporando. Em função do planejamento estratégico, o produtor pode optar por menores espaçamentos para maiores produtividades do sorgo ou maiores espaçamentos para maiores produtividades da forragem. É importante respeitar a população de plantas estabelecida para cultura independente do espaçamento adotado.

Mudanças de percepção

No Brasil, a percepção é de que o sorgo é uma cultura rústica, resistente às intempéries do clima, à seca, e pouco exigente ao uso de insumos. Informações distorcidas como essas prejudicam e penalizam a cultura. A rusticidade do sorgo tem que ser entendida como a habilidade da espécie de suportar melhor altas temperaturas e a deficiência hídrica quando confrontada com outros cultivos nas mesmas condições de investimento tecnológico. Isto significa que uma lavoura de sorgo, se tão bem conduzida como uma de milho, produzirá mais do que o milho no ambiente “ruim”.

Felizmente, a maioria dos produtores já entende a necessidade de aplicação de defensivos na cultura do sorgo. O maior problema é a carência de produtos registrados no Brasil. Recentemente, a cultura foi beneficiada com uma nova opção no controle de plantas daninhas com uso de safener [substâncias que buscam proteger plantas do efeito tóxico causado por herbicidas] recomendado para proteção das sementes contra a ação fitotóxica do herbicida S-metolacloro.

Até 2021, praticamente apenas a atrazina era usada para controle de plantas invasoras em lavouras de sorgo. O tratamento de sementes e uso de inseticidas baseados em neonocotinoides tem propiciado uma proteção do sorgo contra o ataque do pulgão (Melanaphis sachari / Melanaphis sorghi), praga responsável por grandes prejuízos.

Brasil entre os oito maiores produtores de grãos de sorgo

Os números da cultura passaram a frequentar as estatísticas oficiais. Estamos hoje entre os oito maiores produtores de grãos de sorgo do mundo. A área plantada evoluiu positivamente nos últimos cinco anos. Mesmo assim, a nossa produtividade está abaixo dos resultados experimentais.

O sorgo granífero é uma cultura estabelecida em sucessão à soja no Sudeste, Centro-Oeste. Está chegando ao Oeste da Bahia e crescendo no Tocantins e Sul do Piauí. Apesar das regiões semiáridas do Brasil serem carentes de matérias-primas para alimentação animal e dependentes da importação de milho de outras regiões, os agentes envolvidos nas políticas de abastecimento não conseguiram entender a contribuição que a cultura do sorgo pode oferecer aos mercados regionais. É importante que existam maiores incentivos públicos aos produtores dessas regiões como forma de fomentar a inserção do sorgo para maior desenvolvimento econômico e social.

 

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