Por que o PIB do agro caiu em 2022?

PIB agro

“O principal fator foi o aumento dos custos com insumos, principalmente no campo…”

Nicole Rennó é professora do departamento de economia da Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” – Esalq/USP, e pesquisadora do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada – Cepea, da Esalq/USP.

Rennó é economista, mestre e doutora em economia pela Esalq/USP.

Nicole Rennó, pesquisadora do Cepea


AgriBrasilis – O PIB do agronegócio registrou queda de 4,22% em 2022. O que ocasionou esse retrocesso? Quais as diferenças no desempenho da agricultura e pecuária e por quê?

Nicole Rennó – É importante fazer algumas considerações sobre a metodologia de cálculo do Cepea e da CNA. Como existem diferenças ante a metodologia do PIB do IBGE, isso costuma gerar um pouco de confusão.

O Cepea acompanha o PIB de toda a cadeia do agronegócio “dentro e fora da porteira”. O IBGE, quando fala em PIB agropecuário, considera só a agropecuária, ou seja, só “dentro da porteira”. Agroindústrias, por exemplo, fazem parte do setor industrial para o IBGE.

Para o Cepea, os desempenhos das indústrias “antes e depois da porteira”, da agropecuária e dos agrosserviços são todos computados. O resultado do PIB do agronegócio é uma média dos desempenhos desses segmentos.

Outra diferença é que as variações de PIB do IBGE que estamos acostumados a acompanhar são variações de volume. Na metodologia do Cepea e da CNA, nosso interesse é acompanhar como está a renda real do agente do agronegócio. Então, além das variações de volume, analisamos e computamos variações nos preços dos produtos agropecuários e agroindustriais, e as variações dos custos das atividades que compõem o setor.

PIB da agricultura

O que causou a queda do PIB do agronegócio em 2022? Essa foi uma queda, vale mencionar, frente ao PIB recorde alcançado em 2021. Essa queda se concentrou no lado agrícola do PIB, no ramo da agricultura, principalmente “dentro da porteira”, mas também nas agroindústrias.

O principal fator foi o aumento dos custos com insumos, principalmente no campo. 2022 foi um ano de preços altos; os preços agropecuários e agroindustriais estavam num patamar elevado, mas os custos subiram numa intensidade muito maior. Isso pressionou a renda real do agente do agronegócio, que é o que buscamos representar quando demonstramos essa queda de 4,22%.

A quebra da safra da soja pesou bastante. Essa é a principal cultura dentro do PIB agrícola. O que acontece com a soja tem um reflexo importante no resultado agregado e, como a gente teve uma quebra significativa devido ao clima, isso se refletiu no PIB.

Nós tivemos também algumas agroindústrias com produção menor, como a indústria florestal. A produção de madeiras, de móveis, as indústrias de vestuários e têxteis tiveram um desempenho fraco em termos de volume.

PIB da pecuária

O PIB da pecuária apresentou alta. O setor apresentou alívio nos custos frente ao recorde que tinha sido alcançado em 2021. Ao mesmo tempo, em 2022 os preços de vários produtos ficaram em bom patamar.

Assim como a soja para a agricultura, no caso da pecuária a produção de bovino pra corte é muito importante no PIB e o Brasil obteve ganhos de produção depois de alguns trimestres seguidos com a produção de boi em queda. Essa produção subiu em 2022 e impulsionou o PIB do ramo pecuário.

AgriBrasilis – Qual a participação do agronegócio na inflação de 2022, que fechou em 5,79% ao ano? Por que certos setores apontam o agronegócio como vilão da inflação?

Nicole Rennó – O agronegócio teve uma participação importante na inflação de 2022. Talvez por isso tenha sido denominado por certos setores como vilão da inflação.

Tivemos uma inflação elevada, acima da meta medida pelo IPCA, e de fato o grupo de alimentos e bebidas, mais relacionado com o agronegócio, esteve entre os que mais subiu.

Preços agropecuários e agroindustriais estavam em patamar elevado, embora não tanto quanto os custos, mas designar o agronegócio como vilão indicaria de alguma forma que esse aumento de preços estava sob controle do produtor rural, e isso não é verdade.

Nós tivemos, desde 2019, uma sequência de problemas climáticos e sanitários, além da guerra entre Rússia e Ucrânia. O aumento de preços de alimentos no ano passado e retrasado foi global, não foi um fator especifico do Brasil. No Brasil, ela chegou até com mais força porque o câmbio estava desvalorizado, mas todos esses fatores que eu mencionei estão fora do controle do produtor.

Agribrasilis – A quantidade de empregos no agronegócio diminuiu 17% em apenas uma década. Por que isso ocorreu? Qual o nível de qualificação no setor?

Nicole Rennó – A quantidade de empregos que reduziu durante essa década foi na agropecuária “dentro da porteira”, que apresentou queda de 15%.

Considerando o agronegócio como um todo, essa queda entre 2012 e 2022 foi de apenas 3%, porque a quantidade de pessoas trabalhando nas indústrias “antes da porteira” aumentou. A quantidade de pessoas trabalhando nos agrosserviços aumentou também. Nas agroindústrias esse patamar ficou estagnado.

A queda na população empregada “dentro da porteira” é um movimento que acontece já há algumas décadas, e não é especifico do Brasil: acontece ao longo do processo de desenvolvimento dos países. A agropecuária tende a perder espaço como empregadora à medida que se moderniza, substitui trabalho por capital, por máquinas, tecnologias que poupam trabalho. Essa modernização vem acontecendo na agropecuária brasileira. Também existe uma tendência dos trabalhadores de

Esse movimento de queda do número de empregos na agropecuária deve continuar acontecendo nos próximos anos, embora a taxas decrescentes.

Em relação ao nível de qualificação no setor, ele ainda é baixo comparado com a média do mercado de trabalho brasileiro. Proporcionalmente, temos no agronegócio muito mais gente com escolaridade até o ensino fundamental e muito menos gente com ensino superior completo, se comparado com o cenário brasileiro.

Por outro lado, na última década esse nível de qualificação tem crescido de forma muito mais acelerada no agronegócio do que no Brasil como um todo, o que reflete a modernização do setor, e a demanda por trabalhadores mais qualificados, que saibam lidar com novas tecnologias, com toda a complexidade da gestão que existe na agropecuária hoje em dia.

AgriBrasilis – Qual a atual situação do mercado de trabalho do agro?

Nicole Rennó – Nos últimos dois anos, o mercado de trabalho do agronegócio tem apresentado bom desempenho. Isso ocorre devido a forte recuperação após o impacto inicial da pandemia e como consequência da conjuntura favorável que tem marcado o setor.

Com relação ao PIB, os anos de 2020 e 2021 foram o melhor biênio da nossa série histórica. Tivemos recordes de rentabilidade, de renda real do produtor, que é o agente do agronegócio. Isso, naturalmente, tornou o mercado de trabalho aquecido também.

O mercado de trabalho do agro está numa situação atual positiva e a gente espera que isso se mantenha com certa estabilidade ao longo do 2023.

 

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