Biogás de cana-de-açúcar aposta em resíduos como matéria-prima

“…o que anteriormente era resíduo passa a ser considerado insumo para um novo processo, propiciando melhor aproveitamento da nossa principal matéria-prima, a cana.”

Victor Machado é gerente de planejamento e inteligência de negócios da Raízen Geo Biogás, graduado em engenharia de produção pela PUC do Rio de Janeiro e com MBA em finanças pela Universidade Federal do Rio de Janeiro.

A Raízen Geo Biogás é uma joint venture entre a Raízen e a Geo Energética. A Raízen tem participação de 85% das ações do empreendimento.

Victor Machado, gerente de planejamento e inteligência de negócios da Raízen Geo Biogás


AgriBrasilis – Como é realizada a produção de biogás? Quais suas características como combustível renovável?

Victor Machado – A produção de biogás é feita a partir de um processo biológico em que biodigestores convertem a matéria orgânica da torta e da vinhaça – subprodutos da cana-de-açúcar gerados durante o processo de produção do açúcar e do etanol – em metano e CO2. Na sequência há um processo de dessulfurização para a retirada de enxofre e depois há a possibilidade de purificação para produção de biometano ou envio para motogeradores, transformando em energia elétrica.

Após a extração do biogás, a vinhaça e torta processadas nos biodigestores também são utilizadas na produção de fertilizantes, um adubo ‘turbinado’, rico em potássio, fósforo e nitrogênio.

AgriBrasilis – Por que o uso de biogás tem apresentado crescimento acelerado no Brasil? Qual é a participação do biometano?

Victor Machado – Em termos econômicos e sustentáveis, é um mercado com grande potencial. Entendemos que o biogás tem um poder energético capaz de contribuir estrategicamente para a matriz energética nacional, ao reduzir consideravelmente desperdícios, e apostar nos resíduos como matéria-prima.

Com a mesma quantidade de cana, por exemplo, é possível aumentar a produção de energia em até 50%, sem acréscimo de área plantada. Ou seja, com mil toneladas de cana conseguimos produzir 50 MWh, utilizando a queima da palha e bagaço como combustível.   O gás proveniente da biodigestão de torta de filtro e vinhaça nos dá mais 25 MWh, o que aumenta em 50% o potencial de geração de energia elétrica.

Como o biogás serve tanto para a geração de energia elétrica quanto para a produção de biometano, ele está altamente conectado com o sistema de economia circular, considerando que essa tecnologia aproveita todos os resíduos provenientes dos processos produtivos para a geração de novos produtos.

Por ter composição química semelhante ao do gás natural, só que advindo de fontes renováveis, o biometano pode substituir o próprio gás natural, diesel, GLP ou óleo combustível, reduzindo em mais de 90% as emissões diretas de gases de efeito estufa.

As duas soluções contribuem diretamente com o meio ambiente e ajudam a descarbonizar a matriz energética brasileira e diversas cadeias produtivas.

AgriBrasilis – Que relação tem o biogás com a produção do etanol de segunda geração? Qual é o papel da economia circular nesse contexto?

Victor Machado – O etanol de segunda geração (E2G), assim como o biogás, é uma alternativa importante para aumentar a produção de biocombustível. Utilizando como matéria-prima o bagaço da cana-de-açúcar – biomassa extraída do processamento da cana e produção do etanol de primeira geração (1G) e açúcar –, o E2G tem potencial para aumentar em cerca de 50% nossa capacidade de produção de etanol, sem aumento de área de cultivo.

O processo de produção do E2G também gera vinhaça, um resíduo que será destinado à produção de biogás, aumentando o potencial de circularidade e aproveitamento de todos os subprodutos dos bioparques. Isso torna todo o processo ainda mais sustentável, já que maximizamos o reaproveitamento dos resíduos e insumos utilizados em nossas operações. Ou seja, o que anteriormente era resíduo passa a ser considerado insumo para um novo processo, propiciando melhor aproveitamento da nossa principal matéria-prima, a cana.

AgriBrasilis – A Raízen espera construir unidades de produção de biogás em todas as suas usinas, nos próximos dez anos. Para que será utilizado? É possível substituir todo o gás natural, diesel e GLP pelo biogás?

Victor Machado – Uma vez purificado, o biogás apresenta as mesmas características que o gás natural (96,5% metano).  Sendo assim, também pode ser utilizado, na forma de biometano, como substituto ao diesel como combustível de automóveis, tratores e caminhões.

Temos um projeto claro de liderar a transição energética no País, ao oferecer um portfólio completo de soluções renováveis em energia. Em 2020, a Raízen inaugurou a maior planta de biogás do mundo, produzido com resíduos agroindustriais, localizada junto ao Parque de Bioenergia Bonfim, em Guariba, SP. Essa unidade produz energia elétrica por meio de subprodutos da cana-de-açúcar.

Em 2022, divulgamos também a construção da nossa segunda planta de biogás, a primeira dedicada à produção de gás natural renovável (biometano). Essa planta será instalada no parque de bioenergia Costa Pinto, localizado em Piracicaba, SP. Os investimentos nessa e outras tecnologias reforçam a posição da Raízen como uma das empresas pioneiras no uso de resíduos de processos industriais para a produção de energia renovável em escala comercial.

AgriBrasilis – Quais os parceiros da Raízen nesse programa de expansão?

Victor Machado – Buscamos contribuir com soluções mais sustentáveis para nossos clientes e parceiros. Para isso, temos uma joint venture com a Geo Energética, empresa paranaense de biogás e hidrocarbonetos verdes derivados da cana-de-açúcar, a Raízen Geo Biogás. Pioneira no uso de resíduos de processos industriais para a produção de energia renovável em escala comercial, a Raízen tem participação de 85% das ações dessa joint venture.

A produção da planta de biometano no Bioparque Costa Pinto já está totalmente comercializada para a Yara Brasil Fertilizantes, Scania e para a Volkswagen do Brasil. São contratos de longo prazo, em que o biometano será utilizado na produção de hidrogênio e amônia verde, no caso da Yara, e para abastecer as fábricas da Scania e Volkswagen, permitindo uma redução de emissões de gases do efeito estufa de mais de 90%, quando comparado com a alternativa fóssil.

O objetivo da Raízen é oferecer um portfólio completo de soluções renováveis em energia para nossos clientes. Atualmente, temos três plantas de E2G em construção, anexas aos Parques de Bioenergia Bonfim, em Guariba, Univalem, em Valparaíso, e Barra, em Barra Bonita, todas no interior paulista, e já anunciamos outras cinco unidades. Nossa primeira planta de E2G da Raízen fica em Piracicaba, SP, e está em operação desde a safra 2014/15.

 

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