Como economizar através da tecnologia de aplicação

“Ajustar o procedimento de preparo para se obter uma calda homogênea pode implicar em melhor resultado de aplicação, podendo reduzir, durante o ciclo da cultura, uma ou até mais aplicações.”

Marcelo da Costa Ferreira, Phd em Agronomia e coordenador do NEDTA

Marcelo da Costa Ferreira é engenheiro agrônomo e doutor em agronomia pela Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias da Universidade Estadual Paulista – Unesp, Câmpus de Jaboticabal, com estágio pós-doc no Reino Unido, e coordenador do Núcleo de Estudo e Desenvolvimento da Tecnologia de Aplicação – NEDTA.

Ferreira é professor de tecnologia de aplicação de produtos fitossanitários da Unesp de Jaboticabal, realizando pesquisas sobre o preparo de caldas, formação de gotas, deriva das pulverizações e depósito de calda sobre os alvos.


AgriBrasilis – O que é tecnologia de aplicação de defensivos agrícolas e qual é sua importância?

Marcelo Ferreira – A tecnologia de aplicação de produtos fitossanitários é definida pelo uso de conhecimentos científicos para a correta colocação desses produtos no alvo, na quantidade necessária, quando e se necessário, de forma econômica e com o mínimo de contaminação do ecossistema. A tecnologia de aplicação tem grande importância para a economia do agronegócio. Envolve a manutenção da produção, uma vez que é a responsável pela transferência dos produtos biologicamente ativos até os organismos fitófagos que causam danos aos cultivos.

Caso a tecnologia de aplicação seja falha, não haverá bom controle dos alvos fitossanitários, sendo consolidados os prejuízos para a produção agro-silvo-pastoril. Haverá ainda a perda do próprio investimento para os tratamentos fitossanitários, que envolve a aquisição dos produtos, o custo com os pulverizadores e operadores.

No Brasil, são comercializados cerca de US$ 14 bilhões somente em produtos fitossanitários. Uma aplicação com resultado de controle abaixo do esperado significa uma perda considerável de dinheiro (de produtividade + produtos + tempo-homem-máquina). Também deve-se considerar alguns efeitos colaterais, como a perpetuação e até o aumento dos organismos na área, que seguirão causando prejuízos nos cultivos em safras sucessivas. Haverá ainda possível dano ambiental, pois, tendo sido o produto aplicado sem “atingir o alvo”, isso implica que o produto foi para alguma área exterior ao alvo. Sendo solo, ar, ou água, o posicionamento do produto em outras áreas causará impacto maior do que seria aceitável para uma aplicação bem-feita.

Considerando que atualmente há uma pressão da Comunidade Europeia, inclusa no Pacto Verde (Green Deal) de redução em 50% do uso e do risco dos produtos fitossanitários até 2030, a tecnologia de aplicação tem a sua importância ainda mais evidenciada.

Fonte: NEDTA – Núcleo de Estudo e Desenvolvimento da Tecnologia de Aplicação

AgriBrasilis – Que fatores afetam a aplicação de defensivos? Como é possível controlar esses fatores para otimizar as operações em campo?

Marcelo Ferreira – A produção agro-silvo-pastoril é complexa, uma vez que depende de fatores como a qualidade do solo e a meteorologia, que são muito dinâmicos ao longo do tempo. Esses fatores influenciam desde o crescimento dos cultivos até a ocorrência dos alvos biológicos. A seleção dos itens que comporão uma determinada aplicação é igualmente dinâmica e particularizada.

A seleção dos produtos, adjuvantes e equipamentos de aplicação, os procedimentos de preparo de caldas, a velocidade de trabalho, as pontas de pulverização, a pressão utilizada para produzir as gotas, influenciarão a cobertura e o depósito de calda nos cultivos que, por sua vez, serão influenciados pelo tamanho e estágio de desenvolvimento da cultura, do clima e do próprio cuidado com as calibrações dos pulverizadores.

A boa seleção do tamanho de gotas (modelo de ponta de pulverização, pressão de trabalho e uso de adjuvantes) é fundamental para a obtenção de melhores resultados em uma pulverização.

Ainda hoje há poucos profissionais realmente preparados para compreender esses fatores e decidir adequadamente sobre como deve ser a aplicação. Recorrer a profissionais com embasamento reconhecido na área é uma boa indicação.

AgriBrasilis – Como é possível economizar em produtos através da tecnologia de aplicação?

Marcelo Ferreira – Um bom preparo de calda já pode ser uma forma de economizar. No campo é muito comum se verificar problemas de incompatibilidades entre produtos nos reservatórios dos pulverizadores. Essas incompatibilidades nos mostram que os produtos estão sendo alterados em sua composição físico-química. Isso quer dizer que uma parte dos ingredientes ativos foi perdida e não resultará em controle dos alvos.

Frequentemente se verifica que produtos ficam incrustados no tanque, na tubulação e nos filtros do pulverizador. Se os produtos nem saíram do pulverizador, o que ou quanto do que se colocou no tanque foi aplicado? Sendo assim, as dosagens que chegam aos cultivos são menores que as esperadas, resultando em possíveis falhas no controle.

Ajustar o procedimento de preparo para se obter uma calda homogênea pode implicar em melhor resultado de aplicação, podendo reduzir, durante o ciclo da cultura, uma ou até mais aplicações, dado o melhor controle. Portanto, a boa tecnologia utilizada deverá significar uma utilização mais racional dos recursos, tornando mais econômico o tratamento fitossanitário.

Papel hidrossensível representando diferentes deposições de gota. Fonte: NEDTA – Núcleo de Estudo e Desenvolvimento da Tecnologia de Aplicação

AgriBrasilis – Como se deu o avanço da tecnologia de aplicação no Brasil? Qual é o nível de adoção entre os produtores?

Marcelo Ferreira – Essa é uma pergunta complexa, uma vez que há muitos “Brasis” dentro do Brasil. Temos equipamentos e técnicas muito desenvolvidos, disponíveis para utilização, mas o alcance não é equilibrado para toda a agricultura.

Trata-se de um problema sociológico que necessita de uma abordagem pública. Portanto, isso requer uma abordagem por segmento, o que daria algumas teses de doutoramento. Sendo assim, acho que podemos deixar resposta a esta pergunta para daqui a alguns anos.

AgriBrasilis – Para que servem os adjuvantes? Que tipos existem e com quais propósitos?

Marcelo Ferreira – Os adjuvantes servem para muitas coisas. A função mais comum é de redução da tensão superficial, que atua desde a formação das gotas até a absorção dos produtos, passando pela interação com os alvos.

É um assunto que está longe de ser conhecido em sua integralidade. Até as definições funcionais estão passando por uma revisão de especialistas, para a proposição de um consenso sobre a função dos adjuvantes.

Há um evento específico, que é o “Workshop sobre Adjuvantes em Caldas Fitossanitárias”. A próxima edição será realizada em agosto de 2023 em Ribeirão Preto, para a qual abro o convite aos interessados por esse tema, para uma atualização sobre o que há de mais recente relativo aos adjuvantes.

AgriBrasilis – É muito comum entre os agricultores a prática de misturar agrotóxicos na calda de pulverização. Essas misturas em tanque são seguras?

Marcelo Ferreira – Se as misturas forem feitas considerando boas práticas agrícolas, podem ser seguras, sim. Naturalmente dependerá da orientação de um profissional competente para indicar o que, quanto e como deverão se proceder. Uma vez bem recomendadas, bem orientadas e bem realizadas, podem ser seguras.