Semioquímicos podem reduzir uso de inseticidas em até 90%

“…semioquímicos são aplicados em menos de 1% da superfície da plantação, em pontos que modificam o comportamento dos insetos na área…”

Agenor Mafra-Neto, CEO e co-fundador da ISCA

Agenor Mafra-Neto é CEO e co-fundador da ISCA Inc., empresa fabricante de produtos semioquímicos para controle de pragas agrícolas.

Mafra-Neto é biolólogo, mestre em ecologia pela Unicamp, doutor em entomologia pela Universidade de Massachusetts e pós-doutor na mesma área pela Universidade de Iowa.


AgriBrasilis – Para que servem os produtos semioquímicos?

Agenor Mafra-Neto – Semioquímicos são químicos naturais que modulam a comunicação entre organismos, como entre os insetos e as plantas.

Utilizamos semioquímicos para manipular o comportamento de insetos na agricultura, no controle de pragas agrícolas, ao atrair o alvo para uma armadilha que contém o semioquímico e quantidades pequenas de inseticida, que pode debilitar ou matar a praga. Outra forma é através de feromônios sexuais, para interromper o acasalamento dos adultos, evitando a geração de lagartas. Semioquímicos também podem repelir insetos-praga. Essas formas de manejo de pragas correspondem aos mecanismos atrai-e-mata, interrupção de acasalamento e repelência, respectivamente.

Ao invés de serem aplicados em toda a superfície da plantação, como é feito com inseticidas convencionais, que tem que estar na superfície da planta para poder matar o inseto, os produtos semioquímicos são aplicados em menos de 1% da superfície da plantação, em pontos que modificam o comportamento dos insetos na área.

Nossa empresa traz produtos semioquímicos competitivos ao custo do uso de inseticidas convencionais no manejo de pragas, mas com inúmeros benefícios: são extremamente eficazes e incrementam o resultado da colheita; não criam riscos nem para o meio ambiente ou para insetos benéficos, como abelhas polinizadoras e vespinhas que parasitam pragas; protegem o consumidor, pois não deixam resíduos no produto agrícola.

AgriBrasilis – Podem ser utilizados também em cultivos extensivos?

Agenor Mafra-Neto – Historicamente, produtos semioquímicos foram usados em culturas de alto valor agregado, como frutas, nozes e vegetais. O alto custo por hectare e a necessidade de serem manualmente aplicados no campo impediam a adoção em cultivos extensivos. Isso está mudando.

Hoje existem formulações de produtos semioquímicos aplicadas mecanicamente. Sem essas novas formulações, seria impossível aplicar nas grandes áreas do cerrado brasileiro. Outro fator é a redução de custos de síntese dos ativos, através de melhores rotas químicas, ou através da bio-produção desses compostos. Com a diminuição do custo por hectare e com a aplicação mecânica, os produtores vêm adotando essas novas técnicas sustentáveis no manejo de pragas da soja, algodão e milho. Hoje, formulações atrai-e-mata estão sendo usadas em cultivos extensivos do cerrado brasileiro.

AgriBrasilis – Como é possível a redução do uso de inseticidas para a lagarta-do-cartucho em 90% através dos semioquímicos? Existem resultados similares no caso de outras pragas?

Agenor Mafra-Neto – As formulações do tipo atrai-e-mata são adjuvantes que potencializam a ação de inseticidas. Nesse caso, o produtor utiliza somente 2% do inseticida que utilizaria numa aplicação de cobertura convencional, e controla não só a mariposa da lagarta do cartucho (Spodoptera frugiperda), mas também as outras lagartas, como a Helicoverpa armigera, falsa medideira (Chrysodeixis includens), e outras.

Se um produtor tiver 100 L de inseticida e for aplicar de forma convencional com 1L/ha, ele vai poder proteger 100 hectares. Com a ajuda de um adjuvante atrai-e-mata, como o Noctovi, que comercializamos no Brasil, ele vai poder proteger 5000 ha. O produtor mantém a mesma efetividade de controle nesses 5000 ha e não usa 4900 litros de veneno.

AgriBrasilis – Como os feromônios podem ser produzidos em larga escala?

Agenor Mafra-Neto – Feromônios sempre foram sintetizados quimicamente, em pequenas quantidades, utilizando métodos de síntese caros, utilizados apenas em produtos agrícolas de alto rendimento.

Mesmo os feromônios vendidos no mercado mundial, em volumes mais altos, não conseguem reduzir o preço suficientemente para competir diretamente com outros agrotóxicos utilizados em controle de pragas. Isso tem mudado com o desenvolvimento de moléculas de feromônios produzidas a partir de processos biológicos. Por exemplo, a ISCA produz vários feromônios a partir de plantas modificadas para sintetizar essas moléculas. Estes processos inovadores reduzem o custo de síntese de feromônios para níveis aceitáveis para insumos de manejo de pragas de culturas agrícolas extensivas.

AgriBrasilis – A ISCA tem atuação na Argentina e no Brasil. Que produtos e soluções a empresa desenvolve nesse países? A empresa planeja atuar em outros países da América Latina?

Agenor Mafra-Neto – Participamos na Argentina do controle da traça da uva (Lobesia botrana), um inseto que promove a entrada de microrganismos fitopatogênicos, causadores de doenças e que prejudicam a qualidade do vinho. Nossa tecnologia Splat Lobesia utiliza uma formulação de feromônio fluida, que permite aplicação aérea, viabilizando a execução de um programa com apoio governamental que aplica nosso produto sobre toda a produção vinícola de Mendoza. Acabamos de receber o registro do Splat Lobesia e agora vamos levar essa solução para outras vinícolas que não participam do consórcio de Mendoza.

Danos de Lobesia botrana em inflorescências de videiras (A); danos nas bagas verdes (B); danos em bagas maduras. (Fonte: adaptado de “Priorização de Pragas Quarentenárias Ausentes no Brasil”, da Embrapa e Departamento de Sanidade Vegetal do MAPA. Fotos: Andrea Lucchi)

Estamos abrindo várias outras frentes na América Latina, incluindo o controle de mosca das frutas, de lagartas e percevejo em grandes culturas, e incrementando a polinização em cultivos. No Brasil, nossa história vem se desenvolvendo desde quando fundamos a companhia em 1997. Já fizemos muita coisa: ajudamos produtores de maçã e pêssego a controlar suas principais pragas e eliminar resíduos na fruta; ajudamos produtores de tomate a controlar a Tuta absoluta, uma traça que broca o tomate; trabalhamos com produtores de repolho e brócolis para controlar a lagarta Plutella xylostella, com produtores de café, uva e manga a controlar a mosca das frutas, e a aumentar produtividade e qualidade com incremento da polinização de frutas.

Um dos primeiros projetos comerciais da nossa empresa foi o programa de erradicação da Cydia pomonella (a lagarta da maçã) no Brasil, junto com Luís Borges, líder dos produtores brasileiros de maçã, estabelecendo um sistema baseado em semioquímicos para monitorar e controlar as pragas da maçã sem resíduos na fruta.

Hoje a ISCA esta muito bem posicionada, com atuação em 30 países, e protegendo alguns dos maiores mercados agrícolas mundiais. Nosso grande desafio e ambição é levar o semioquímico para agricultura extensiva no cerrado. Estamos fazendo isso com bastante sucesso e de forma sustentável.

Desde o começo a minha visão foi de que com o uso racional de semioquímicos poderíamos reverter o quadro de risco que o uso insustentável de agrotóxicos estava trazendo ao mundo. A agricultura do Brasil sempre foi central a minha visão de futuro, especialmente quando resolvi empreender, por isso inauguramos simultaneamente a ISCA no Brasil e nos EUA.

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