
A ferrugem asiática, causada pelo agente Phakopsora pachyrhizi, assombrou durante anos os campos brasileiros. No entanto, nesta safra de 2019/2020, o fenômeno tem uma incidência menor atualmente devido a um intenso trabalho e investimento no País, conforme explica Cláudia Vieira Godoy, engenheira agrônoma e doutora em fitopatologia e pesquisadora da Embrapa Soja (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária), em Londrina, no Paraná, onde atua na área de epidemiologia e controle de doenças de soja.
De acordo com a Embrapa, a média das perdas de 2001 a 2018 equivalem a U$2,8 bilhões por safra. Segundo a Conab a última safra (2018/2019) registrou produção de 115 milhões de toneladas de soja. Além disso, de acordo o Comitê Estratégico Soja Brasil (CESB), foi registrado um recorde de 123,88 sacas por hectare, restabelecendo o País entre os maiores produtores mundiais do grão.
A pesquisadora Cláudia Godoy concedeu entrevista à AgriBrasilis em que discorreu sobre a enfermidade que acomete a soja e de que maneira esse problema tem sido superado por aqui.
AgriBrasilis – Qual é o histórico da ferrugem asiática no Brasil? Como está a flutuação de incidência do fungo na produção nacional?
Dra. Cláudia Godoy – A doença, causada pelo fungo Phakopsora pachyrhizi foi identificada pela primeira vez no Brasil em 2001, e se espalhou rapidamente pelas regiões produtoras. Sua presença é constante nas safras, mas as perdas foram reduzidas ao longo dos anos em função das estratégias de manejo adotadas.
A incidência da ferrugem por aqui nos últimos anos tem sido baixa na safra principal, muito se deve ao escape. Uma grande parte das áreas produtoras não apresenta a doença ou isso acontece no final de ciclo pelo uso de cultivares precoces, semeadas no início da safra para fazer uma segunda colheita no verão.
AgriBrasilis – A nível nacional, qual é a gravidade da doença?
Dra. Cláudia Godoy – A gravidade é menor do que quando a doença foi introduzida no Brasil. Muitos produtores ainda têm [a patologia] como o principal alvo de controle nas aplicações de fungicidas, mas ela tem sumido das lavouras. Nas regiões que semeiam após novembro, a doença ainda pode demandar controle mais intensivo.
AgriBrasilis – Quais as principais estratégias de controle adotadas pelo produtor brasileiro contra o P. pachyrhizi? Como está o mercado de fungicidas atualmente?
Dra. Cláudia Godoy – Em 2006, se iniciou a adoção do vazio sanitário, período de no mínimo 60 dias durante a entressafra, no qual é proibida a semeadura de soja e é obrigatória a eliminação de plantas voluntárias para redução do inóculo do fungo.
Uma das medidas que reduziu sua incidência foi a utilização de cultivares de ciclo precoce. Sua adoção possibilitou o cultivo de duas safras de verão como soja-milho, soja-algodão e soja-feijão, tendo como consequência o escape da ferrugem.
Não dispensando fungicidas por utilizarem genes de resistência (Rpp), cultivares de soja com genes de resistência têm sido disponibilizadas.
Um dos grandes problemas é a resistência (menor sensibilidade) do fungo patógeno a fungicidas do grupo dos inibidores da desmetilação (IDM), inibidores da quinona externa (IQe) e inibidores da succinato desidrogenase (ISDH), sendo esses os três principais grupos sítio-específicos que compõem todos os fungicidas registrados em uso para o controle da doença.
Os fungicidas multissítios, como mancozebe, clorotalonil e cúpricos, começaram a ser utilizados na cultura da soja em 2013/14 para aumentar a eficiência dos fungicidas sítio-específicos e também como estratégia anti-resistência.

Perdas na produtividade da soja devido à Ferrugem Asiática. Cortesia da EMBRAPA
AgriBrasilis – O que é a rede de ensaios de fungicidas para o controle de doenças na cultura da soja? Quais os impactos da coleta de dados da rede?
Dra. Cláudia Godoy – As redes de ensaios são experimentos com o mesmo protocolo nos quais são avaliados produtos registrados e em fase de registros para diferentes alvos biológicos, em certas regiões produtoras.
Os experimentos têm sido realizados desde 2003 para ferrugem asiática e o grande mérito da rede é ter pesquisadores nas múltiplas regiões acompanhando as mudanças de sensibilidade dos fungos.
AgriBrasilis – Quais seriam as suas perspectivas para o futuro da produção brasileira levando em conta a pressão de seleção sob o fungo que muitas vezes é maior do que a própria velocidade de lançamento de novos produtos?
Dra. Cláudia Godoy – O controle com fungicidas no Brasil está bastante complicado pela resistência, mas a doença teve sua incidência reduzida em boa parte das regiões.
Apesar disso, ainda existem ingredientes ativos com eficiência aceitável e a associação com multissítios tem ajudado. Porém, o fato de alguns desses produtos estarem sendo suspensos na Europa talvez preocupe mais do que a resistência em si sobre o futuro do controle de doenças.

Ingredientes ativos testados em conjunto relacionado à perda de produtividade. Fonte: Embrapa, 2019; Adaptado.
