“O agronegócio brasileiro cresceu a taxas chinesas” Entrevista com Sylvia Brasil Coutinho, Presidente do banco UBS no Brasil

Publicado em: 9 de setembro de 2020

O atual cenário do Brasil é intensamente influenciado por fatores econômicos e políticos, o que gera pressões
na economia e impacta o País como um todo. O ano de 2020 aponta para alta volatilidade, afetando diversos setores e áreas, como o consequente aumento nos níveis de empregos informais e a falta de investimentos.

 

 

AgriBrasilis convidou uma personalidade no setor financeiro para discorrer sobre a temática. Sylvia Brasil Coutinho é formada em Engenharia Agronômica pela Escola Superior de Agricultura ‘Luiz de Queiroz’ da Universidade de São Paulo, onde também realizou pós-graduação, e possui MBA pela Columbia University em Nova York (EUA).

Desde 2013 é presidente do Grupo UBS no Brasil, um dos maiores bancos do mundo, e líder na América Latina. O Banco UBS é considerado o maior gerenciador de patrimônio global, com sede em Zurique, na Suíça, sua fundação data de julho de 1998, resultado da fusão da Union de Banques Suisses com a Société de Banque Suisse.

Sylvia Coutinho concedeu uma entrevista a AgriBrasilis, onde discorreu sobre a importância e perspectivas do agronegócio no País.

 

 

AgriBrasilis – Qual o patamar do agronegócio brasileiro atualmente?
Sylvia Coutinho –  O agronegócio continua e continuará muito importante para a economia brasileira. O ramo foi beneficiado com a desvalorização do real em tempos recentes, mas apresentou uma receita menor com as exportações em 2019, se comparado com o ano anterior. Apesar da competitividade, o setor é o que mais sofre proporcionalmente com as ineficiências ligadas à infraestrutura logística e de telecomunicações, além do “custo Brasil”.
Mesmo durante o último período de “depressão” econômica que sofremos, o agronegócio seguiu crescendo a taxas chinesas, o que mudou o eixo de geração de riquezas para o interior do Brasil.

AgriBrasilis – Qual é o principal papel dos bancos, em especial o UBS, nesse cenário?
Sylvia Coutinho – O agronegócio é um setor de capital intensivo. Assim, bancos podem atuar em várias frentes, fornecendo as diferentes modalidades de crédito para produtores e empresas, facilitando o acesso de produtores ao capital via estruturação e emissão de dívidas, ofertas de ações e outros produtos.

Com os juros baixos no nível histórico que se encontram hoje, vejo um ponto de inflexão no mercado de capitais brasileiro, em que o agronegócio e os demais setores deverão entrar fortes no financiamento. O UBS também pode atuar assessorando e negociando possíveis movimentos de fusões e aquisições por meio de suas equipes de Banco de Investimentos e uma equipe global de Research. E para as famílias que são proprietárias do agronegócio, o banco proporciona uma assessoria completa de Family Office, aconselhamento de investimentos e estruturação patrimonial, tanto em nível local quanto global.

AgriBrasilis – Como tem se dado as operações financeiras no agronegócio brasileiro? Essa economia apresentou crescimento nos últimos anos?
Sylvia Coutinho – No agronegócio, a indústria de açúcar e etanol tem sofrido com seus resultados, manifestados por uma série de empresas em recuperação judicial. Apesar de algumas poucas figuras se destacarem em suas operações, usinas e fazendeiros de cana de açúcar possuem grande espaço na melhoria da produtividade (no campo e na indústria), no processamento e na gestão de seus empreendimentos.

A partir dos anos 2000, o agronegócio viu suas exportações aumentarem em ritmo acelerado. Porém, após o fim do boom das commodities, em 2011, a receita com as exportações se estabilizou. Com a atual possível recuperação econômica, a questão é como ficará o segmento em uma economia local e global em transição. Ainda assim, se existe uma área na qual somos competitivos, essa é a de produção de alimentos, e incluiria também os biocombustíveis e as energias renováveis.

AgriBrasilis – Economicamente, o que se pode esperar para o futuro próximo?
Sylvia Coutinho – Após uma forte crise entre 2014 e 2016, e um período de grandes incertezas durante 2018, 2019 apresentou um início de recuperação para a economia. Espera-se um passo mais acelerado a partir de 2020, liderado principalmente pelos investimentos. Durante o período, devemos ver uma maior estabilidade para o real e para a inflação. Os juros reais já estão próximos do zero, puxando com força o crédito, sobretudo o privado. Novos empréstimos via sistema financeiro (apenas bancos) crescem a dois dígitos.

No externo, o coronavírus acaba puxando os preços de commodities para baixo. O UBS revisou o crescimento da China deste ano da casa dos 6% para 5,5%. O efeito pode ser temporário, mas enquanto o problema de saúde não se estabiliza, riscos ainda são significativos para o crescimento.

AgriBrasilis – Qual a recomendação para estrangeiros sobre o agronegócio brasileiro?
Sylvia Coutinho – De forma geral, nosso agronegócio possui inúmeras oportunidades, por ser um setor de tremenda vantagem competitiva, não só em virtude de suas características naturais, mas também por ter desenvolvido ao longo de décadas um vasto conhecimento e tecnologias de produção em solos tropicais. Por outro lado, tais vantagens são diminuídas pelo impacto negativo de ineficiências e gargalos, como nas áreas de infraestrutura, e pelo famoso “custo Brasil”.

Investimentos no País caíram com a recente crise econômica e, portanto, não faltam oportunidades e demandas para uma retomada em todos os setores. Se fizermos o dever de casa, que inclui continuarmos na agenda de reformas, e
melhorarmos nossa percepção quanto ao meio ambiente e à região amazônica, o Brasil pode se tornar um dos mercados emergentes mais atrativos para investimentos e a escolha preferencial de investidores estrangeiros.