“Quando falamos de biológicos, o Brasil não é apenas um país que faz uso, mas é o líder na inovação e no desenvolvimento dessas soluções…”
Maiara Carolina Jacobucci é Export Manager no departamento de Plant Health da Bioiberica, sediada na Espanha, agrônoma formada pela Universidade Estadual de Maringá, mestre pela Universidad Politécnica de Valencia e pelo L’Institut Agro & AgroParisTech.
Emilhano Stefanello Lima é Global Head de Seedcare & Biologicals da Syngenta, sediado na Suiça, formado pela Universidade Federal de MS.
AgriBrasilis – A experiência internacional mudou sua percepção sobre bioinsumos?
Maiara Jacobucci – Com certeza. Minha motivação ao deixar meu trabalho em 2016 e vir pra Europa para estudar envolvia aprender mais sobre os bioinsumos e sobre como cultivar em um ambiente mais sustentável, em um momento em que o assunto se iniciava no Brasil e a Europa já era uma referência. O desafio era interiorizar o conceito e entender como as estratégias de uso de bioinsumos em ambientes controlados podiam ser aplicadas aos ambientes abertos.
Confesso que no principio eu fui bastante cética sobre os bioinsumos, talvez pelo fato de vir da robusta indústria química e ter interiorizado que eram as únicas soluções disponíveis para os problemas no campo. Porém, quando entendi os conceitos e compreendi que o melhor cenário é ter distintos tipos de estratégias de manejo, a minha percepção mudou definitivamente.
Emilhano Lima – A experiência internacional ampliou minha visão sobre o papel dos biológicos no manejo integrado, mostrando que, independentemente do país, os agricultores estão em busca de novas ferramentas para manejar pragas e doenças, mitigar estresses abióticos e adotar práticas mais sustentáveis e rentáveis. Ao mesmo tempo, essa vivência reforçou o quanto o Brasil tem avançado nesse tema, com excelentes práticas de campo, inovação tecnológica e integração dos biológicos às estratégias de manejo.
AgriBrasilis – Qual o papel do Brasil nesse setor?
Maiara Jacobucci – O Brasil é um grande catalizador do agro mundial. Pelo perfil dos agricultores e dos profissionais, vejo uma alta velocidade no momento de inserir novidades. Produtos são usados quando há um problema a ser resolvido ou uma situação à ser controlada a médio/longo prazo. No Brasil, por ser um país imenso, com diferentes climas, solos, patógenos, dentre outras variáveis, temos inúmeras situações em que o uso de insumos é necessário. Para os bioinsumos isso não poderia ser diferente.
Emilhano Lima – Quando falamos de biológicos, o Brasil não é apenas um país que faz uso, mas é o líder na inovação e no desenvolvimento dessas soluções. Inclusive é importante destacar que, quando falamos em fixação biológica de nitrogênio em larga escala, foram as pesquisas da Embrapa que estabeleceram bases fundamentais para inoculantes. Esse pioneirismo nos dá uma grande vantagem para seguir avançando com biológicos mais sofisticados.
O Brasil tem apresentado crescimento acelerado na adoção de biológicos: na safra 2024/2025, o uso desses produtos cresceu 13% ante a safra anterior, segundo a CropLife Brasil. Também estamos muito acima da média global: o uso de biológicos no Brasil é cerca de quatro vezes superior à média. Para a Syngenta, tudo isso significa que o Brasil é uma das regiões em que concentramos esforços de pesquisa e desenvolvimento de formulações adaptadas, parcerias com centros de pesquisa locais e lançamentos pensados no que o produtor precisa.
AgriBrasilis – Quais as diferenças do Brasil em relação a outros principais mercados?
Maiara Jacobucci – O Brasil tem uma agricultura que passa de geração em geração, mas com produtores jovens e abertos à inovação. Isso exige das empresas duas coisas: credibilidade de marca e agilidade em inovação. Quando os bioinsumos atendem a esses dois pontos, a adoção é muito mais rápida. Outro fator é que o uso no Brasil é, em geral, espontâneo (não é imposto por regulações), o que torna o processo mais genuíno e técnico.
Emilhano Lima – O Brasil se diferencia por três fatores centrais: escala, diversidade e velocidade de adoção. Temos um território continental, com cerca de 156 milhões de hectares potenciais tratados com biológicos, em climas e solos distintos. Essa característica exige soluções mais robustas e adaptáveis do que em mercados como EUA e Europa. Além disso, a pressão por produtividade e sustentabilidade faz com que o produtor brasileiro adote tecnologias rapidamente, o que ajuda a explicar o crescimento médio de 22% ao ano no uso de biológicos nos últimos três anos.
A escala e diversidade do Brasil nos permitem testar soluções sob condições que poucos países têm. Isso faz do país um verdadeiro motor de inovação agrícola, e a Syngenta atua como catalisadora dessa transformação, conectando ciência global às realidades locais.
Para nós, isso significa que o Brasil não é só mercado, mas também campo de validação global: lançamos e adaptamos aqui tecnologias que, depois, podem ganhar escala em outros países.
“Um equívoco comum é enxergar os biológicos apenas como substitutos simples dos químicos…”
AgriBrasilis – O que faz um produto ou projeto dar certo no campo?
Maiara Jacobucci – O segredo é a verdade e o propósito genuíno de contribuir com o produtor. Isso exige tempo: o tempo que o agro demanda para gerar credibilidade e resultados reais. O melhor marketing ainda é o feedback positivo de quem usa o produto e comprova seus benefícios no dia a dia.
Emilhano Lima – Sucesso no campo requer evidência de eficácia consistente em diferentes ambientes e regimes de manejo; compatibilidade operacional (ou seja, ser aplicável nos fluxos reais do produtor e da indústria, armazenagem, logística); e valor econômico, com retorno por hectare, redução de insumos ou riscos. Nos biológicos, isso implica em investimento em demonstrações locais e em parcerias com cooperativas, distribuidoras, sementeiras e integradores, pois a confiança do produtor vem da repetição do resultado. É por isso que na Syngenta testamos diversas tecnologias todos os anos, priorizando aquelas que entregam robustez e facilidade de integração ao manejo existente.
A confiança do produtor é construída quando ele vê consistência no resultado, safra após safra. Por isso, nosso foco vai além do produto: envolve parceria, dados de campo e suporte técnico que sustentam a performance ao longo do tempo.
AgriBrasilis – O que o mercado ainda não entendeu sobre biológicos?
Maiara Jacobucci – Há muito ruído e pouca interiorização dos conceitos. Trabalhar com biológicos exige estudo, atualização e humildade para reconhecer que ainda existem perguntas sem resposta. Precisamos de profissionais que busquem conhecimento técnico e entendam o campo como um sistema vivo e variável.
Emilhano Lima – Um equívoco comum é enxergar os biológicos apenas como substitutos simples dos químicos. Na realidade, eles são parte de um sistema integrado de manejo, que, quando bem estruturado, aumenta a sustentabilidade, ajuda no manejo da resistência e prolonga a eficácia das soluções convencionais. Na Syngenta, nós olhamos para químicos e biológicos como soluções integradas, fundamentais para o manejo na agricultura sustentável. Outro ponto pouco compreendido é que os biológicos exigem rigor técnico: formulações estáveis, protocolos adequados de aplicação, armazenagem correta e compatibilidade com outros insumos.
Além disso, não existe “um único tipo de biológico”: há uma enorme variabilidade em modos de ação, eficácia e consistência. É justamente por isso que a confiança do produtor depende de dados robustos e replicáveis. Na Syngenta, nosso compromisso é investir em ciência, em escala industrial, e em parcerias estratégicas para garantir biológicos confiáveis, prontos para serem adotados em larga escala.
AgriBrasilis – Qual decisão marcou sua trajetória?
Maiara Jacobucci – Foram várias pequenas decisões que moldaram minha trajetória, desde a gestão do tempo até a escolha de deixar uma boa posição em uma multinacional para estudar em diferentes países. O mais importante é ter clareza do objetivo e coragem para buscá-lo.
Emilhano Lima – A decisão de deixar uma cidade do interior (Dourados, MS), onde eu trabalhava com meu pai, em uma fazenda, para ingressar na Syngenta. Mesmo sabendo que seria um grande desafio, meu pai me incentivou a seguir esse caminho e explorar novas perspectivas. Nunca saberei se foi a decisão “certa”, mas estou feliz por ter tido a coragem de explorar novos caminhos e percebo que essa escolha me permitiu compreender a agricultura sob uma perspectiva mais ampla e contribuir de forma mais significativa para o desenvolvimento do setor, aplicando conhecimento e inovação em benefício de produtores e em prol de um futuro mais sustentável.
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