“Essa análise coloca o Brasil na 29ª posição do ranking da FAO/ONU em uso de agroquímicos…”
Eduardo Leão é presidente da CropLife Brasil, engenheiro agrônomo, com mestrado em economia aplicada pela Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, MBA em Relações Governamentais pela Fundação Getúlio Vargas, e doutorado em economia aplicada pela Universidade de São Paulo.
AgriBrasilis – O uso de agroquímicos é excessivo no Brasil?
Eduardo Leão – Uma comparação justa deve considerar a quantidade de agroquímicos por área cultivada e não o uso total no país.
Cabe lembrar que, se analisarmos os grandes produtores agrícolas (EUA, UE, Argentina, Canadá, Rússia e Brasil), o Brasil é o único de clima tropical. O calor e a umidade, típicos dessa região, propiciam incidência maior de pragas e doenças em comparação aos países de clima temperado, que se beneficiam do frio e da neve para quebrar esse ciclo na entressafra.
A grande extensão territorial, somada a essa especificidade climática, já seriam suficientes para explicar o uso de quantidades maiores de pesticidas em comparação aos demais países. No entanto, é preciso considerar que o Brasil possui outra característica única: a produção de duas, até três safras por ano em uma mesma área, o que também demanda o uso de defensivos.
Levando em consideração os critérios acima, essa análise coloca o Brasil na 29ª posição do ranking da FAO/ONU em uso de agroquímicos, atrás de países de produção agrícola relevante como China, Japão, Holanda, Colômbia, Costa Rica e Uruguai, o que não justifica a visão de que o Brasil usa produtos de forma excessiva.
AgriBrasilis – Por que existem produtos banidos ou não aprovados na UE, mas que são utilizados no Brasil? Essa comparação é adequada?
Eduardo Leão – Cada país adota diretrizes próprias de registro de produtos, de acordo com as condições agronômicas locais. Diferentes climas e tipos de cultivos requerem diferentes manejos fitossanitários.
Vamos considerar o caso da soja. A Europa praticamente não produz a cultura e, mesmo nas regiões que o fazem, as pragas e doenças que enfrentamos por aqui não existem por lá. Isso faz com que os defensivos químicos que realizam esse controle não sejam necessários naquela região. Dessa forma, diversos produtos utilizados no Brasil não são registrados na UE, simplesmente porque não há demanda para a cultura, o que não significa que sejam banidos ou não aprovados.
Além disso, deve-se ressaltar que as autoridades regulatórias brasileiras possuem autonomia e elevada capacitação técnico-científica para assegurar a saúde da população e a segurança ao meio ambiente.
Mesmo depois de aprovado, o Brasil pode, a qualquer tempo, convocar produtos para reanálise, sempre que alertado por organizações internacionais das quais seja membro integrante ou signatário de acordos, ou sempre que surgirem indícios de redução da eficiência agronômica, de risco à saúde humana e ou ao meio ambiente, justamente no intuito de manter o rigor e a segurança do uso desses produtos no mesmo nível que em outros países do mundo.
“Os defensivos exercem papel fundamental no aumento da produção de alimentos por área plantada, ou seja, na produtividade agrícola”
AgriBrasilis – Nesse sentido, os alimentos são seguros para consumo humano?
Eduardo Leão – O último relatório do Programa de Análises de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos da Anvisa, com os resultados de análises realizadas em 2018-2019 e 2022, indicou que os alimentos produzidos no Brasil são seguros para consumo humano quanto aos potenciais riscos de intoxicação aguda e crônica advindos da exposição a resíduos de agroquímicos.
Há mais informações sobre o relatório em https://croplifebrasil.org/noticias/alimentos-brasileiros-sao-seguros-afirma-anvisa/
AgriBrasilis – A discussão sobre defensivos no Brasil é técnica ou ideológica?
Eduardo Leão – Os defensivos exercem papel fundamental no aumento da produção de alimentos por área plantada, ou seja, na produtividade agrícola. Esse aumento decorre de fatores como o avanço da pesquisa e desenvolvimento, com a oferta de produtos cada vez mais modernos, eficientes e sustentáveis.
Os produtos de controle são ainda mais importantes em um país tropical como o Brasil, onde o clima quente e úmido é favorável a proliferação de pragas e doenças nas principais culturas. Para se ter ideia da importância do uso de defensivos, a média de perdas nas lavouras pela falta desse controle seria de 37,5% antes da colheita.
Em relação à discussão sobre os defensivos no Brasil, compartilho da ideia de que o diálogo é a única forma de construção de consenso e avanço em relação aos desafios de nossa geração. Os defensivos são necessários para o atendimento às agendas globais, como a insegurança alimentar, energética e a mitigação dos efeitos das mudanças climáticas. E todas essas agendas passam por uma agricultura eficiente e sustentável que, invariavelmente, passa pela ciência e pela inovação tecnológica.
AgriBrasilis – A liberação de produtos novos é muito baixa no país. Existe resistência contra a aprovação de novos ingredientes ativos?
Eduardo Leão – O sistema regulatório brasileiro, que analisa novos ingredientes ativos e que era regido por uma legislação de mais de 35 anos, tem sido, de fato, um dos mais morosos do mundo. O país tem levado, em média, mais de sete anos para a aprovação de uma nova molécula, o que representa o dobro do tempo médio de aprovação na UE e três vezes mais do que países como EUA, Canadá e Argentina.
Com isso, os produtores brasileiros têm levado muito mais tempo que concorrentes internacionais para ter acesso a novos produtos, invariavelmente mais sustentáveis e seletivos contra inimigos naturais. Temos forte expectativa de que a nova lei, aprovada no fim do ano passado, permita uma maior eficiência nesse processo.
AgriBrasilis – A nova Lei dos Agrotóxicos nº 14785 centraliza a figura do MAPA no registro de produtos fitossanitários. Quais as consequências para o setor?
Eduardo Leão – A definição de diretrizes e as análises relacionadas à eficiência agronômica, segurança à saúde e a preservação do meio ambiente seguem sob a responsabilidade do MAPA, Anvisa e Ibama, respectivamente. O MAPA passa apenas a coordenar os processos de registro e reanálise dos produtos fitossanitários.
A liderança desses processos pelo MAPA não representa uma renúncia aos critérios técnicos e científicos dos demais órgãos. Além disso, essa liderança otimiza processos via sistema de comunicação integrado entre os órgãos reguladores, com ganho de eficiência para a administração pública, sem comprometer etapas para as avaliações dos especialistas das agências.
A CropLife Brasil considera a nova lei dos defensivos um marco para a atualização da legislação frente às novas tecnologias e à sustentabilidade da indústria e do setor produtivo. O texto garante maior previsibilidade e segurança jurídica para novos investimentos e representa um avanço institucional fundamental para que a agricultura brasileira siga competitiva, com acesso a produtos mais modernos e eficientes.
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