Regulamentação fitossanitária para “Minor Crops”

“A baixa disponibilidade de ingredientes ativos para CSFI advém do desinteresse das indústrias de agrotóxicos em registrar produtos para essas culturas…”

Elisangeles Souza é assessora técnica do Sistema FAEP/SENAR-PR, coordenadora técnica do Comitê Minor Crops Brasil, engenheira agrônoma pela UFPR, especialista em engenharia de produção com ênfase em gestão rural e agroindustrial pela UFSC.

Elisangeles Souza, assessora técnica do Sistema FAEP/SENAR-PR


Internacionalmente, as culturas agrícolas com baixo suporte fitossanitário, para as quais faltam ou há um número reduzido de agrotóxicos registrados, são conhecidas como “Minor Crops” ou “Minor Uses”. No Brasil, para fins legais, essas culturas foram definidas como “Culturas com Suporte Fitossanitário Insuficiente” (CSFI).

Os segmentos ligados à produção de frutas e hortaliças e até de alguns cereais conhecem bem o problema decorrente da ausência de agrotóxicos. Essa ausência muitas vezes ocasiona o uso irregular e dificulta o exercício dos engenheiros agrônomos, que não têm como prescrever legalmente um agrotóxico não registrado.

A baixa disponibilidade de ingredientes ativos para CSFI advém do desinteresse das indústrias de agrotóxicos em registrar produtos para essas culturas, em razão da área de plantio ser reduzida quando comparada com a área das grandes culturas, além da questão do alto custo associado. Para cada inclusão de cultura nas recomendações de agrotóxicos, é necessário executar estudos que permitam definir o Limite Máximo de Resíduo (LMR) e outros procedimentos que requerem recursos financeiros elevados. Diante dessas dificuldades e visando favorecer o uso seguro e regulamentado de agrotóxicos, em 2014 foi publicada a Instrução Normativa Conjunta (INC) nº 1 com a coparticipação do MAPA, Anvisa e Ibama.

“Essa ausência muitas vezes ocasiona o uso irregular e dificulta o exercício dos engenheiros agrônomos, que não têm como prescrever legalmente um agrotóxico não registrado”

O propósito da normativa é incentivar o registro para pequenas culturas, simplificando as etapas do processo de registro. A apresentação de parecer técnico passou a atender as exigências de estudos de eficiência agronômica, e a organização das culturas agora é feita em grupos e subgrupos para a realização dos estudos de Limites Máximos de Resíduos (LMR) a serem realizados para a cultura representativa do subgrupo e extrapolados para outras culturas CSFI desse subgrupo. Esse procedimento contribui para uma maior agilidade no processo de registro, legalizando produtos para o manejo das culturas e contribuindo para a segurança dos trabalhadores rurais, dos alimentos da população e do meio ambiente.

A inclusão de culturas como CSFI pode ser solicitada por instituições de pesquisa ou de extensão rural, associações e cooperativas de produtores rurais, e indústrias. Essa solicitação deve ser formalizada ao MAPA, que a encaminhará para avaliação dos demais órgãos envolvidos, no âmbito de suas competências. É importante destacar que o pleito de registro do agrotóxico, produto formulado, somente pode ser submetido pelas indústrias.

É importante ressaltar que a demanda por agrotóxicos registrados para as culturas com baixo suporte fitossanitário não é exclusiva da agricultura brasileira, visto que países como os EUA, Canadá, Austrália e Japão já discutem alternativas de registros de ingredientes ativos para essas culturas há anos, com normas semelhantes às do Brasil.

Em 2018, com o objetivo de discutir estratégias para a identificação das demandas fitossanitárias e contribuir para o desenvolvimento de uma produção com qualidade e segurança para os consumidores, foi criado o Comitê Minor Crops Brasil, uma “Força Tarefa” de abrangência nacional liderada pelo setor produtivo, que integra as instituições que representam pesquisa, indústria (agroquímicos e produtos biológicos), governo, revendedores e varejo.

A participação dos setores interessados e a publicação da INC nº 1/2014 trouxeram a possibilidade de avanços, mas também desafios devido ao grande volume de demandas e por conta da diversidade de culturas a serem atendidas. Para enfrentar esses desafios, foram formados os Comitês de Culturas CSFI, compostos por produtores, técnicos e pesquisadores. Esses comitês têm o propósito de analisar a situação atual do suporte fitossanitário, identificar os entraves que ainda dificultam o manejo e controle de pragas na cultura CSFI de interesse, e indicar os possíveis ingredientes ativos e agentes biológicos para solucionar os gargalos constatados.

Outro desafio importante é a consolidação da integração entre produtores, técnicos, governo, pesquisadores, revendas, varejo e indústria. Essa integração visa identificar as demandas de acordo com a realidade do campo, agilizar o registro, e disponibilizar mais opções de ferramentas para o manejo das culturas CSFI. Isso contribuirá com a produção de alimentos seguros, permitindo que os engenheiros agrônomos recomendem agrotóxicos aos produtores com a garantia de que esses produtos foram analisados e aprovados pelo MAPA, Anvisa e Ibama.

Um ponto que vale destacar é que a norma trouxe como benefício o maior envolvimento das cadeias produtivas na busca de soluções para o problema. Em 10 anos desde a publicação, foram registrados cerca de 464 produtos formulados por extrapolação de LMR, seguindo os procedimentos da INC nº 1/2014, beneficiando mais de 100 culturas.

 

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