Argentina ainda teme a volta da aftosa

“A experiência vivida pela Argentina em 2001, quando tivemos casos de febre aftosa, foi muito dura, pois perderam-se quase todos os mercados de exportação…”

Víctor Tonelli é membro do Conselho Consultivo da ADBlick Ganadería, e coordenador técnico da Mesa Argentina de Carnes. Foi CEO da Comega SA e vice-presidente da Estancia y Cabaña Las Lilas SA.

Tonelli é licenciado em ciências agrárias pela Universidade Católica da Argentina, consultor da área de pecuária e proteína animal.


AgriBrasilis – Por que o senhor alertou sobre os riscos da importação de vacinas contra a febre aftosa?

Victor Tonelli – Não me oponho de forma alguma à importação de vacinas, apenas mencionei que é necessário ter certeza científica de que é seguro importar vacinas que abrangem 2 cepas (bivalente), em contraste com a vacina nacional, que abrange 4 cepas (tetravalente), incluindo a A2001, que foi responsável pela quebra da imunidade e não está presente na vacina bivalente.

Na verdade, o debate que gerou a aprovação da importação foi parcialmente positivo ao gerar uma redução de 23% no custo da vacina pelos dois laboratórios que a fabricam e distribuem em nosso país.

“O Chile, que proíbe o trânsito de animais e carnes com osso dos países vizinhos, é o único país livre de febre aftosa sem vacinação, agora o Brasil e a Bolívia estão buscando esse mesmo status, enquanto os outros países mantêm a vacinação”

AgriBrasilis – A febre aftosa ainda persiste na Argentina?

Victor Tonelli – Há mais de 22 anos não é detectado nenhum foco da doença em todo o território nacional, onde o Serviço Nacional de Sanidade Animal (Senasa) realiza monitoramento epidemiológico detalhado, confirmando bons níveis de imunidade, com vacinação anual dos animais adultos no outono e duas vezes por ano para animais com menos de 2 anos de idade (outono e inverno).

AgriBrasilis – Quais são os custos incluídos no valor da vacina e como impactam os produtores?

Victor Tonelli – A vacinação tem basicamente dois componentes no seu custo: a vacina propriamente dita; e os custos relacionados com a compra, acondicionamento e serviço de vacinação, realizado com recursos humanos próprios das entidades privadas responsáveis pela aplicação obrigatória.

A vacina em si tem o mesmo preço em todas as entidades de vacinação do país, enquanto o que varia são os custos de estrutura e mobilidade. Em média, o custo total é de aproximadamente 1 kg de vitelo por animal vacinado, sendo 60/65% o custo da vacina e 35/40% o custo acrescentado pelas entidades vacinadoras.

A questão para muitos de nós é se é necessário continuar a pagar o serviço de vacinação dessas entidades, sendo que a vacinação poderia ser realizada com os recursos de cada unidade produtiva. Além disso, seria importante analisar se os custos das entidades vacinadoras também não precisam de um reajuste.

Outro fator que se discute é se é necessário continuar a vacinar os animais mais velhos, uma vez que a imunidade obtida nos menores pode ser suficiente. Além disso, há quem considere que poderíamos até deixar de vacinar. Esses pontos sempre geram dúvidas e medos diante da difícil experiência vivida pela Argentina em 2001.

AgriBrasilis – Alguns estados do Brasil e Bolívia decidiram parar de vacinar contra a febre aftosa, enquanto o Paraguai estuda essa medida. O que a Argentina precisa para alcançar o status de país livre de febre aftosa sem vacinação?

Victor Tonelli – Essas mudanças colocam em evidência que ainda há receio por parte dos produtores sobre os riscos de uma eventual ruptura da imunidade, levando em conta que a doença ainda causa estragos no mundo, como os casos que mantiveram a Austrália em suspense com focos em países vizinhos e ilhas que poderiam ter acarretado em sérios problemas, já que a Austrália é o segundo país exportador de carne.

A experiência vivida pela Argentina em 2001, quando tivemos casos de febre aftosa, foi muito dura, pois perderam-se quase todos os mercados de exportação, e que demoraram a ser recuperados, incluindo os Estados Unidos, em que demorou mais de 10 anos para conseguirmos a reentrada.

AgriBrasilis – Qual é a situação sanitária nos países que fazem fronteira com a Argentina?

Victor Tonelli – O Chile, que proíbe o trânsito de animais e carnes com osso dos países vizinhos, é o único país livre de febre aftosa sem vacinação, agora o Brasil e a Bolívia estão buscando esse mesmo status, enquanto os outros países mantêm a vacinação.

AgriBrasilis – O que se espera das exportações de carne bovina e como melhorar o valor agregado e os preços obtidos?

Victor Tonelli – A Argentina é o quinto maior exportador do mundo, com volumes que representam aproximadamente 7% do total global. É um mercado em forte crescimento, que duplicou os volumes vendidos para todos os destinos, com forte crescimento da demanda na Ásia, particularmente na China, representando para o nosso país quase 30% do destino da nossa oferta de carne, que está em crescimento.

A China é um mercado em que existem ainda fortes limitações de acesso e elevados custos tarifários, que limitam fortemente a adição de valor agregado. Mudar isso exige uma tarefa público-privada consistente, que permita reduzir as restrições e os custos de entrada através de negociações bilaterais ou multilaterais.

 

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