Ácaros são mais difíceis de controlar do que outras pragas?

“Muitas vezes, quando o agricultor observa o ácaro no campo, os prejuízos já são irreversíveis…”

Daniel Júnior de Andrade é professor na Universidade Estadual Paulista – Unesp, coordenador do AcaroLab – Laboratório de Acarologia, engenheiro agrônomo e doutor em entomologia e acarologia pela Unesp.

Daniel de Andrade, professor na Unesp


AgriBrasilis – Quais os prejuízos causados pelos ácaros que afetam às grandes culturas?

Daniel de Andrade – Ácaros-praga podem causar enormes prejuízos às grandes culturas, como as reduções de produtividade e da qualidade dos produtos agrícolas produzidos. Esses pequenos organismos danificam folhas e hastes jovens, comprometendo a capacidade fotossintética das plantas.

Algumas espécies de ácaros são transmissoras de fitopatógenos (principalmente vírus) causadores de doenças de plantas. Além disso, alguns ácaros podem causar ferimentos que servem como porta de entrada para microrganismos oportunistas, que danificam as plantas ou afetam a qualidade do produto final.

AgriBrasilis – Qual a importância dos ácaros predadores?

Daniel de Andrade – Ácaros predadores são importantes inimigos naturais de pragas. Podem ser encontrados na parte área das plantas e no solo. Eles se alimentam de ácaros-praga, pequenos insetos e até mesmo de nematoides.

Na agricultura, ácaros predadores são fundamentais na regulação populacional de pragas e realizam trabalho importantíssimo para manutenção da sanidade das plantas. As principais espécies desses ácaros pertencem à família Phytoseiidae (fitoseídeos), mas existem diversas outras famílias importantes na agricultura. Atualmente, muitas espécies são comercializadas em todo o mundo (inclusive no Brasil) como agentes de controle biológico de pragas.

Leprose dos citros, transmitida por Brevipalpus yothersi. (Fonte: Daniel de Andrade)

AgriBrasilis – Quais os casos recentes de entrada de ácaros quarentenários? O que podemos aprender com esses casos?

Daniel de Andrade – No Brasil, recentemente houve a introdução de diversas pragas quarentenárias, inclusive de ácaros-praga. Entre as espécies com entrada recente no país, destacam-se o ácaro-da-erinose-da-lichia (Aceria litchii), o ácaro-vermelho-das-palmeiras (Raoiella indica), o ácaro-hindustânico-dos-citros (Schizotetranychus hindustanicus) e o ácaro-do-enrolamento-do-trigo (Aceria tosichella).

A introdução de um ácaro quarentenário causa prejuízos incalculáveis para a produção agrícola, pois pode afetar as exportações e reduzir a produtividade das lavouras. Em algumas situações, a entrada de um ácaro quarentenário pode aumentar bastante os custos de produção e inviabilizar economicamente a atividade agrícola.

AgriBrasilis – Hormese e balonismo são exemplos de estratégias que os ácaros utilizam para se perpetuarem nas lavouras. Como essas estratégias funcionam? 

Daniel de Andrade – Os ácaros utilizam diversas estratégias para sobreviverem e se reproduzirem na natureza. De fato, hormese e balonismo são duas estratégias bastante importantes utilizadas pelos ácaros para perpetuação nas lavouras. Hormese é uma palavra de origem grega (hormaein) e significa excitar. É um fenômeno desencadeado em populações de ácaros após a aplicação de um determinado produto, principalmente de inseticidas. Por exemplo, vamos imaginar um agricultor que aplica um inseticida para controle de bicudo-do-algodoeiro (Anthonomus grandis) e, após alguns dias da aplicação, ocorre um grande surto de ácaro-rajado (Tetranychus urticae). Nesse caso, pode ter ocorrido hormese, no qual a dose utilizada do inseticida estimulou a reprodução do ácaro. Esse é um efeito em que um determinado produto em doses baixas causa estímulo à reprodução e em doses altas provoca inibição ou morte.

O balonismo é um comportamento de dispersão, observado em algumas espécies de tetraniquídeos, onde os ácaros migram para as partes mais altas das plantas (ponteiros) e formam grandes bolas de ácaros e teias para aproveitar correntes de vento para serem levados para outras áreas. É um comportamento impressionante que permite que os ácaros atinjam grandes distâncias.

Balonismo de Tetranychus ogmophallos. (Fonte: Daniel de Andrade)

AgriBrasilis – Como é realizado o controle de ácaros? Existem casos relevantes de resistência a acaricidas? 

Daniel de Andrade – Diversos métodos são recomendados no manejo, como as medidas quarentenárias, o emprego de cultivares resistentes, a utilização de práticas culturais, o controle biológico e o controle químico.

O controle químico com acaricidas é o método mais utilizado devido a praticidade e ao custo-benefício. Porém, a utilização somente desse método pode resultar em diversos efeitos colaterais, incluindo a resistência de populações de ácaros aos acaricidas. Há inúmeros casos reportados de resistência de populações de ácaros a acaricidas no mundo. Entre as espécies, destaca-se o ácaro-rajado (Tetranychus urticae), que em 2023 ocupou a segunda posição no ranking de artrópodes com o maior número de casos reportados de resistência aos produtos químicos. Somente para essa espécie já foram relatados 557 casos de resistência para 96 ingredientes ativos diferentes.

AgriBrasilis – O ácaro é mais difícil de controlar do que outras pragas?

Daniel de Andrade – De maneira geral, os ácaros não são mais difíceis de controlar do que outras pragas. Porém, o tamanho diminuto desses organismos dificulta bastante a sua observação no campo no início das infestações, período nos quais os métodos de controle são mais eficientes.

Muitas vezes, quando o agricultor observa o ácaro no campo, os prejuízos já são irreversíveis. Outro detalhe é que os ácaros se reproduzem muito rápido, pois possuem ciclo biológico de curta duração, e as fêmeas ovipositam muitos ovos. Além disso, o número reduzido de acaricidas disponíveis no mercado também pode explicar as dificuldades para o manejo dessas pragas.

AgriBrasilis – Que produtos e estratégias de manejo são vistos como os mais promissores para controlar ácaros agrícolas? Que tecnologias estão em desenvolvimento?

Daniel de Andrade – Os produtos biológicos e naturais tem sido os mais promissores para o manejo de ácaros a médio e longo prazo. Produtos à base de fungos entomopatogênicos e de origem botânica (extraídos de plantas) têm apresentado resultados interessantes em diversas culturas.

O desenvolvimento de adjuvantes visando melhorar as aplicações no campo também apresenta futuro promissor. Adjuvantes com ação espalhante, adesiva ou de ação translaminar são algumas dessas inovações. Além disso, é claro que a utilização de ácaros predadores se caracteriza como importante estratégia no manejo dessas pragas.

 

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