“Brasil pode se tornar o maior produtor e exportador de hidrogênio verde do planeta”

hidrogênio verde

“A conta é bem simples: de um lado, o país já tem condições de produzir o hidrogênio verde mais barato do mundo…”


Rodrigo Santana é diretor de operações para a América Latina da Atlas Agro, com graduação em administração pela FCAP, pós graduação em lean manufacturing e logística empresarial e MBA pela Alliance Manchester Business School.

A Atlas Agro é uma empresa focada na produção de fertilizantes nitrogenados com zero emissões de carbono ao meio ambiente.

Rodrigo Santana, diretor de operações para a América Latina da Atlas Agro

AgriBrasilis – O hidrogênio verde vai revolucionar a produção de fertilizantes?

Rodrigo Santana – Vetor energético e combustível primário, limpo e versátil, o hidrogênio verde (H2V) tem potencial para se tornar eixo estratégico do processo de transição energética e descarbonização dos setores produtivos em diversos segmentos.

O H2V pode ser utilizado em várias aplicações, reduzindo as emissões de gases de efeito estufa em setores de difícil descarbonização, tais como: fertilizantes nitrogenados, mineração, siderurgia, produção de metanol, de aço, transporte de veículos pesados, etc.

Hoje, importamos mais de 85% dos fertilizantes que utilizamos no Brasil. Esse montante equivale a mais de US$ 8 bilhões. Quase todo o fertilizante nitrogenado utilizado no Brasil é produzido com o uso de fontes fósseis, com forte penetração de produtos importados de países como a Rússia. A utilização de H2V na fabricação do fertilizante nitrogenado é, portanto, uma medida que garante a substituição de produtos com alta pegada de carbono por um produto de manufatura limpa e sustentável.

Além de ser utilizado na substituição de métodos de produção com energia fóssil por modelos sustentáveis de manufatura, o uso de H2V na indústria de fertilizantes nitrogenados é também uma grande oportunidade para a reindustrialização verde e a segurança alimentar no Brasil.

Os fertilizantes nitrogenados têm como principal matéria-prima a amônia (NH3), molécula formada por átomos de nitrogênio e hidrogênio. Hoje, a indústria de fertilizantes utiliza hidrogênio oriundo de fontes fosseis, tais como o carvão e gás natural. Ao extraírem esse hidrogênio, eles liberam uma quantidade significativa de carbono na atmosfera, tornando essa uma indústria que emite mais de 900 milhões de toneladas de carbono para a atmosfera anualmente.

A Atlas Agro produzirá fertilizantes nitrogenados extraindo o hidrogênio da água, molécula que não contém átomos de carbono associados. Para realizar essa separação da molécula, precisaremos utilizar uma grande quantidade de energia renovável, para que esse processo seja verde, 100% sustentável.

AgriBrasilis – O Brasil pode se tornar uma potência global em H2V? Que desafios precisam ser superados para o sucesso dessa tecnologia?

Rodrigo Santana – No mundo, o H2V tem o potencial de representar entre 12% e 22% de toda demanda de energia até 2050. Segundo a consultoria Mckinsey, o Brasil poderá ter uma nova matriz elétrica inteira destinada à produção do H2V até 2040. Isso significa mais de R$ 1 trilhão em novos investimentos no período, destinados à geração de eletricidade, novas linhas de transmissão e mais unidades fabris do combustível e de estruturas associadas, incluindo terminais portuários, dutos e armazenagem.

Na prática, o Brasil pode se tornar o maior produtor e exportador de H2V do planeta. A conta é simples: de um lado, o país já tem condições de produzir o hidrogênio verde mais barato do mundo. Isso ocorre justamente por conta da alta competividade das fontes solar e eólica, já que 70% do custo de produção do combustível é de gastos com energia elétrica. Do outro lado estão os mercados europeus, asiáticos e norte-americanos, que precisarão comprar o H2V mais competitivo para cumprir as metas de combate ao aquecimento global e redução das emissões de poluentes.

O desafio no Brasil para esse mercado é a criação de políticas públicas ambiciosas, urgentes e assertivas em prol do H2V. Para que o mundo atinja a neutralidade de emissões de gases até 2050, o Brasil precisa fazer a sua parte e pode, inclusive, transformar esse desafio em uma grande oportunidade de acelerar seu desenvolvimento socioeconômico e ambiental, oferecendo produtos e serviços sustentáveis para o mundo. Para o Brasil produzir o hidrogênio renovável mais competitivo do mundo, é preciso, portanto, que sejam desenvolvidos políticas públicas, programas e incentivos adequados.

Atualmente, o Brasil possui o Programa Nacional do Hidrogênio, do Governo Federal, que deve priorizar e incentivar as rotas de produção de hidrogênio a partir de fontes renováveis.

Entre as medidas debatidas entre o poder público e o setor privado, destacam-se a inserção do hidrogênio renovável na Política Energética Nacional, condições mais favoráveis de financiamento, redução da carga tributária (PIS/COFINS, ICMS, IPI, II, IR e CSLL), expansão das linhas de transmissão e créditos fiscais para a cadeia produtiva da produção do hidrogênio de fonte renovável, etc.

AgriBrasilis – Quais as diferenças de custo e preço final entre os fertilizantes produzidos de forma tradicional e aqueles produzidos com H2V?

Rodrigo Santana – Segundo o Índice LCOH Brasil da consultoria Celan Energy Latin America, já é possível produzir H2V no Brasil com custo nivelado entre US$ 2,87/kg e US$ 3,56/kg, em algumas localidades estratégicas. No entanto, com otimizações e incentivos, esses valores podem alcançar US$ 1,69/kg, com custos altamente competitivos ante o hidrogênio produzido por fontes fósseis e poluentes.

A Atlas Agro possui um modelo de negócio inovador alinhado com as melhorias no processo de produção, inclusive com duas patentes submetidas, onde conseguiremos entregar fertilizantes nitrogenados verdes altamente competitivos para as regiões onde vamos atender.

AgriBrasilis – Qual é a atuação da Atlas Agro nesse mercado? Quais os planos da empresa para o Brasil e América Latina e quanto deve ser investido nessa região?

Rodrigo Santana – A Atlas Agro está desenvolvendo projetos para construção de uma série de fábricas de fertilizantes nitrogenados verdes em escala industrial nos EUA e na América Latina, sobretudo no Brasil. Essas fábricas utilizarão H2V em seu processo de produção, em vez de combustíveis fósseis.

No Brasil, a Atlas Agro anunciou a instalação de sua primeira unidade fabril de fertilizantes nitrogenados a partir do H2V, que será implantada em Uberaba, MG, com investimentos totais de US$ 850 milhões.

A planta utilizará uma matriz 100% limpa, com o uso de fontes renováveis, como a solar e eólica, para produção do H2V, amônia verde e dos fertilizantes nitrogenados com zero carbono. A fábrica terá ainda uma capacidade de produção de 500 mil toneladas por ano de fertilizantes para atender aos clientes da região.

A Atlas Agro tem apetite para instalação de mais seis ou sete fabricas no Brasil até 2040.

 

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