Embrapa aposta em trigo transgênico

“Essa autorização representa a possibilidade de avaliar cultivares com o gene HaHB4, do girassol, inserido em cultivares de trigo brasileiras…”

Jorge Lemainski é chefe-geral da Embrapa Trigo, engenheiro agrônomo pela Universidade de Passo Fundo, mestre em ciências agrárias pela Universidade de Brasília.

A Comissão Técnica Nacional de Biossegurança aprovou o cultivo e a venda de trigo geneticamente modificado tolerante à seca no Brasil. O Brasil é segundo país do mundo, depois da Argentina, a aprovar o cultivo do trigo transgênico.

Jorge Lemainski, chefe-geral da Embrapa Trigo


AgriBrasilis – É seguro o cultivo do trigo HB4 no Brasil? O que a autorização do cultivo dessa variedade representa para a pesquisa brasileira?

Jorge Lemainski As evidências científicas avaliadas pela Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio indicam que o cultivo é seguro.

Essa autorização representa a possibilidade de avaliar cultivares com o gene HaHB4, do girassol, inserido em cultivares de trigo brasileiras, quanto ao incremento de tolerância ao estresse hídrico em diferentes locais, além das áreas sobre condições experimentais controladas autorizadas para desenvolver projetos e atividades com organismos geneticamente modificados.

A Embrapa planeja concluir o processo de introgressão (transferência ou introdução permanente de genes de uma espécie para outra) do gene HaHB4 do girassol em cultivares específicas de trigo BRS, da Embrapa, via retrocruzamento e autofecundação.

A Embrapa planeja comparar os resultados de produção de cultivares de trigo geneticamente modificada com as cultivares testemunhas, sem o gene HaHB4, cultivadas sob condições de estresse hídrico, em cultivo de sequeiro, no ambiente tropical do Brasil.

AgriBrasilis – Qual a participação do trigo na safra e safrinha atualmente? Qual seu desempenho no Cerrado?

Jorge Lemainski Os dados estatísticos oficiais utilizam a 1ª, 2ª e 3ª safra, não distinguindo produção da safra e safrinha. Entretanto, estima-se que no ambiente do Cerrado, 75% a 80% do cultivo de trigo acontece em sistema de sequeiro, enquanto 20% a 25% acontece em sistema irrigado.

Quanto ao desempenho, no sistema irrigado foram obtidos 9.630 kg/ha com a cultivar BRS 264 em Cristalina, GO, na safra de 2021. No sistema de sequeiro, foram obtidos 5.160 kg/ha do trigo BRS 404, em Sacramento, MG, na safra de 2019. Normalmente, sob as condições de sequeiro, são esperados 2.500 kg/ha, a depender do manejo e das condições agroclimáticas.

A área de cultivo e de produção de trigo esteve em expansão durante os últimos quatro anos na Região Sul e no Brasil Central. Em 2019, foram cultivados 2,1 milhões de hectares e colhidos 5,2 milhões de toneladas; em 2022 foram cultivados 3,1 milhões de hectares e colhidos 9,7 milhões de toneladas, segundo a Conab. A Região Sul contribui com 90% da área e o Brasil Central com 10%.

O trigo integra os sistemas de produção, normalmente em sucessão à soja e ao milho, tanto na Região Sul, quanto no Brasil Central.

AgriBrasilis – O Brasil deve se tornar autossuficiente em trigo? Quais as oportunidades para o setor agropecuário?

Jorge Lemainski Acreditamos que o Brasil vai atingir a autossuficiência em até 5 anos.

O trigo brasileiro atingiu qualidade tecnológica e industrial para panificação, biscoito e massas comparável aos melhores trigos do mundo. Quase 90% da produção brasileira é destinada ao consumo humano e 10% é destinada para compor ração animal.

Em 2022, o Brasil destinou R$ 10,9 bilhões para a importação de trigo. Ampliar a produção brasileira pode melhorar a balança comercial, gerar trabalho e renda local, além de dinamizar a economia do agro e reduzir os custos fixos das propriedades.

Além do consumo humano, o trigo tem ganhado espaço para compor rações para a cadeia de proteína animal, pastejo para gado de leite e de corte, produção de alimento conservado – pré-secado, silagem – e vai ser utilizado para produzir etanol amiláceo gerando DDGs (resíduo seco de destilaria com solúveis) para compor ração.

Estudos da Embrapa mostram que o trigo pode substituir o milho para compor a ração de suínos e aves, com equivalência nutricional e econômica.

Em função do volume de matéria prima demandada para as fábricas de ração, os cereais de inverno devem ser complementares ao milho na composição de rações.

 

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