CTC desvenda agente causal da murcha da cana e abre caminho para soluções

Publicado em: 27 de outubro de 2025

“O Murchamento da Cana tem sido observado em todas as regiões produtoras do Centro-Sul do Brasil, com intensidade variável…” 

Sabrina Chabregas é diretora de pesquisa e desenvolvimento do Centro de Tecnologia Canavieira – CTCengenheira agrônoma pela ESALQ/USP, com doutorado em Genética e Melhoramento de Plantas e MBA em Gestão de Negócios pela FGV. 


Sabrina Chabregas, diretora CTC

AgriBrasilis – Quais os impactos da Síndrome do Murchamento da Cana? 

Sabrina Chabregas – A Murcha da Cana afeta diretamente o colmo, reduzindo tanto TCH (Toneladas de Cana por Hectare) quanto ATR (Açúcar Total Recuperável). Essa doença degrada o tecido e inverte a sacarose em frutose e glicose, comprometendo a qualidade da matéria-prima. Estima-se que cada 1% de incidência causa perda média de 0,5 ton/ha.  

Durante visitas de campo realizadas pela equipe de fitopatologistas e técnicos do CTC, foram encontradas áreas com até 40% de colmos atacados. Além das perdas agrícolas, há custos industriais extras, como uso de antibióticos para manter a fermentação, e risco de queda na qualidade do açúcar. 

AgriBrasilis – Qual a sua abrangência e que regiões são mais afetadas? 

Sabrina Chabregas – O Murchamento da Cana tem sido observado em todas as regiões produtoras do Centro-Sul do Brasil, com intensidade variável. As maiores ocorrências foram registradas no Triângulo Mineiro e no sudeste de GO, sendo essa a região mais afetada. Há evidências também em SP e PR, embora com menor incidência. Gostaria de aproveitar para fazer um convite aos produtores para se cadastrarem na plataforma Esfera (https://esfera.circle.so/feed) para compartilhar suas percepções e ampliar o monitoramento regional. Isso permitirá uma visão mais aprofundada da incidência e condições que favorecem a doença em cada região. As informações geradas na plataforma Esfera serão compartilhadas entre todos. 

AgriBrasilis – Quais os sintomas da murcha e como diferenciá-la de outras doenças, como a podridão vermelha do colmo? 

Sabrina Chabregas – O sintoma visível da murcha da cana é a retração no terço médio do colmo, que fica com um formato de “meia-lua”. Internamente, há degradação unilateral do tecido, mas as folhas do ponteiro permanecem verdes, dificultando a detecção a campo. 

Tanto a murcha da cana quanto a podridão vermelha do colmo são causados pelo mesmo patógeno e apresentam vermelhidão interna, porém na podridão vermelha há lesões provocadas pela broca, que serve como porta de entrada para o fungo. Na murcha, não há perfurações, e o tecido na área retraída fica amolecido ou “chocho”. 

Agora que identificamos o agente causal, podemos ser mais assertivos no controle, criando protocolos específico…”

AgriBrasilis – Como o Colletotrichum infecta a cana e que condições favorecem seu desenvolvimento? 

Sabrina Chabregas – O Colletotrichum falcatum é um fungo disseminado pelo vento e pela água, desenvolvendo-se melhor entre 25 e 30 °C e com alta umidade. Ele é agente causal da Podridão Vermelha da cana e agora descobrimos que também causa a Murcha da Cana, que é uma nova sintomatologia. Entender por onde o fungo está penetrando para causar a murcha da cana é parte dos próximos passos para maior entendimento desta doença, já que nenhum dano de broca ou orifício de entrada é observado no colmo. 

AgriBrasilis – Como foi possível confirmar o Colletotrichum como causador da SMC?  

Sabrina Chabregas – Utilizamos duas abordagens. A primeira foi a metagenômica, que identificou e quantificou os microrganismos presentes em plantas sadias e doentes. A segunda foi o postulado de Koch, metodologia clássica para identificação de agentes causais de doenças: isolamos o fungo e reproduzimos os sintomas em plantas cultivadas, com constância e repetibilidade. 

Os testes científicos mostraram que Colletotrichum falcatum é predominante nas plantas afetadas, enquanto outros fungos comumente discutidos como possíveis agentes causais, como Pleocyta, surgem apenas em fases avançadas, confirmando caráter oportunista. Já o Fusarium praticamente não foi detectado nas plantas sadias ou doentes. Aqui eu gostaria de aproveitar para reconhecer a liderança da Luciana Castellani juntamente com o Fórum Científico que conta com participação de professores e cientistas renomados, e do trabalho dos fitopatologistas e técnicos do CTC que conseguiram vencer esse desafio, Tatiane Mistura, Mariana Cicarelli, Abel Torres e Jardelcio Ervilha. 

AgriBrasilis – O que muda com relação aos métodos de controle, melhoramento e manejo? 

Sabrina Chabregas – Agora que identificamos o agente causal, podemos ser mais assertivos no controle, criando protocolos específicos e direcionando ações. No melhoramento genético, já estamos testando a resistência das variedades a Murcha da Cana e parentais tolerantes podem ser usados em cruzamentos nos programas para gerar variedades resistentes a doença. Quanto ao manejo, práticas como antecipação da colheita em áreas afetadas reduzem perdas, e manter a cana menos estressada ajuda a diminuir a incidência. Ensaios com produtos químicos e biológicos estão em andamento para definir estratégias mais eficazes. A identificação do agente causal da doença foi um passo fundamental para avançar no entendimento e desenvolver estratégias de controle efetivas para a Murcha da Cana. 

 

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