Presença de apenas uma cigarrinha-do-milho na lavoura já é motivo para aplicação

“Desde a emergência do milho, até o estádio fenológico V8, esse é considerado o Período Crítico de Controle e a atenção deverá ser total…”

Paulo Garollo é pesquisador fitotecnista associado ao Fitolab, especialista na cultura do milho, formado em engenharia agronômica pela Faculdade de Agronomia Luíz Meneghel.

Paulo Garollo, pesquisador fitotecnista no Fitolab


AgriBrasilis – Por que é tão difícil controlar a cigarrinha-do-milho (Dalbulus maidis)?

Paulo Garollo – Os principais fatores são:

– “Pontes verdes” – o plantio contínuo da cultura do milho durante todo ano em vários estados do Brasil, a falta do controle do milho voluntário (“trigueiras”), as perdas de grãos nos transportes e manutenção de plantas de milho de forma aleatória, são fatores que permitem a manutenção e multiplicação de populações de cigarrinhas, assim como dos agentes causais dos enfezamentos – os mollicutes (Spiroplasma e Phytoplasma) e os vírus MSMV e MRFV – que são parasitas obrigatórios;

– Potencial migratório da praga – a cigarrinha é um inseto com um hábito de migração que compreende grandes distâncias, de 10 à 20 km de raio (voo natural) e pode se deslocar por distâncias superiores à 100 km quando em correntes de vento, proporcionando alto potencial de dispersão;

– Posição abaxial (embaixo) das ninfas nas folhas do milho – esse fator dificulta a eficiência dos produtos de contato na mortalidade das ninfas;

– Falta de estratégia no uso de defensivos químicos e biológicos – o uso sem elaborar uma estratégia robusta para escolha de produtos, sem levar em consideração a ecobiologia da praga, as características dos produtos químicos, o momento adequado para as aplicações, os estádios fenológicos da planta e do ambiente no momento da aplicação, são todos fatores que podem trazer muito comprometimento na eficiência dos manejos adotados;

– Materiais genéticos com “resistência” aos agentes causais – ainda existem poucas opções com manutenção do potencial produtivo do milho;

– Escalonamento de plantio da cultura.

Esses são pontos que representam fatores muito relevantes na dificuldade em se alcançar alta eficiência no manejo da praga.

As perdas poderão ultrapassar 70% do potencial produtivo da lavoura, considerando danos diretos. Porém, ainda podemos aumentar o porcentual de danos, se considerarmos os danos secundários e/ou adicionais, como a facilidade maior de contaminação nas plantas “doentes” por outros agentes causadores de moléstias, como no caso de fungos que causam podridões de colmo, por exemplo.

“Tendo indivíduos de cigarrinha na lavoura, independentemente do número, deve-se iniciar as aplicações de defensivos”

AgriBrasilis – Por que a redução da população de ninfas é estratégica e como é possível realizar esse controle?

Paulo Garollo – O controle de ninfas, que até então não tem sido o foco dos manejos adotados, poderá e deverá ser uma das ações de manejo que traz uma quebra de ciclo da praga, tornando-se uma alternativa que poderá conter e até reduzir o avanço populacional da cigarrinha-do-milho.

Os principais métodos de controle estão suportados pela utilização de inseticidas químicos associados aos inseticidas biológicos – fungos e bactérias entomopatogênicas e inseticidas inibidores de crescimento; a utilização de híbridos com maior tolerância às doenças e no controle e/ou erradicação de milho tiguera.

AgriBrasilis – Quando deve ser iniciado o controle desse inseto e por quê?

Paulo Garollo – O manejo já deve ser iniciado de forma preventiva. A eliminação das tigueras, seguida pelo tratamento de sementes e após a emergência da cultura, no momento que surgem as primeiras folhas.

Desde a emergência do milho, até o estádio fenológico V8, esse é considerado o Período Crítico de Controle e a atenção deverá ser total no monitoramento do inseto e da sua continuidade na lavoura. Quanto mais cedo ocorre a contaminação pelos agentes causais das doenças do complexo do enfezamento, maior será o impacto na produtividade da lavoura.

O monitoramento da praga e a decisão de aplicar ou não deverá ser em função da presença ou ausência do inseto. Portanto, tendo indivíduos de cigarrinha na lavoura, independentemente do número, deve-se iniciar as aplicações de defensivos.

AgriBrasilis – Como os inibidores de crescimento podem propiciar a “quebra do ciclo” da praga?

Paulo Garollo – Os inseticidas classificados como inibidores de crescimento, especialmente a buprofesina e a essência bioativada do óleo de neem, são as duas opções que estão sendo comercializadas no Brasil e representam a estratégia da quebra do ciclo da praga. Sem dúvida, essas alternativas, que serão utilizadas como complemento no manejo e deverão estar associadas aos demais químicos, poderão trazer uma forte redução na evolução da população da praga.

Esses produtos, além de terem ação direta sobre ninfas, agem em fêmeas adultas, tornando-as estéreis, gerando ovos sem ninfas e reduzindo a quantidade de oviposição. Dessa forma, além de “ninficidas”, também agem em adultos.

AgriBrasilis – O senhor disse que é possível “conviver com a cigarrinha”. Sua erradicação não é viável?

Paulo Garollo – “Erradicar” um inseto na natureza é algo muito difícil e nada recomendado, pois poderíamos causar impacto negativos no ecossistema.

Então, conviver com a praga, mantendo o gerenciamento do seu manejo em índices populacionais abaixo do nível de dano econômico, essa é a forma mais adequada e sustentável.

 

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