Crédito de R$ 2 bilhões para recuperação de pastos degradados

“O Brasil possui 101 milhões de hectares de áreas degradadas…”

Luis Eduardo Rebolo Lapo é o diretor de riscos da Traive, fintech de crédito agrícola, fundador e membro do conselho da Tudo Certo Agro, engenheiro agrícola pela Unicamp.

A Traive estuda desembolsar R$ 2 bilhões em crédito para produtores rurais que queiram recuperar pastos degradados ou transformá-los em lavouras.

Luis Eduardo Lapo, diretor de riscos da Traive


AgriBrasilis – Qual é a dimensão da área de pastos degradados no Brasil?

Luis Lapo – O Brasil possui 101 milhões de hectares de áreas degradadas. Desse montante, entende-se que temos 40 milhões de hectares com alta aptidão agrícola e pecuária.

AgriBrasilis – A Traive desenvolveu uma modelagem de risco de crédito para conversão de pastos degradados. Como essa modelagem funciona?

Luis Lapo – A empresa desenvolveu as condições de contorno para projeção de fluxo de caixa por até 10 anos, para avaliação da viabilidade econômico-financeira de projetos de conversão de áreas degradadas em pastagem ou lavoura. Além disso, a Traive é uma empresa de tecnologia que consegue obter de forma automática diversos pontos de dados para que essa análise seja mais rápida e mais precisa.

AgriBrasilis – Por que desembolsar R$ 2 bilhões em crédito para conversão de pastos degradados? 

Luis Lapo – O principal objetivo é continuar posicionando o Brasil como o principal protagonista global na produção de alimentos e biocombustíveis, aumentando a produção, mas sem aumentar o desmatamento.

Para recuperar 40 milhões de hectares seriam necessários cerca de R$ 200 bilhões. Os R$ 2 bilhões mencionados estariam relacionados ao início de um projeto com grande potencial de expansão.

“Apesar de termos uma das agriculturas mais sustentáveis do planeta, nossa reputação internacional ainda é muito ruim…”

AgriBrasilis – No que consiste o Programa Nacional de Conversão de Pastagens Degradadas? 

Luis Lapo – Esse programa foi lançado pelo governo federal e busca criar medidas para tratar o financiamento da recuperação de áreas degradadas através de linhas específicas. A Traive pode entrar futuramente no projeto apoiando, por exemplo, bancos como o BNDES na originação e qualificação de produtores para o projeto.

A Traive não está participando diretamente do PNCPD.

AgriBrasilis – Qual é o perfil do agricultor que deve receber esses recursos e por quê?

Luis Lapo – Cada projeto de financiamento terá sua política de crédito específica, mas a Traive acredita que o financiamento competitivo pode servir como um catalisador de mudanças. O perfil do produtor deveria ser: aquele comprometido com boas práticas socioambientais, demonstrando que, além de cumprir toda a legislação, também está fazendo algo além. No caso da pecuária, por exemplo, ainda não existe uma lei que obrigue a identificação individualizada de animais e a rastreabilidade, mas em todos os projetos que estamos participando isso se torna uma condição para que o produtor participe.

AgriBrasilis – Quais são os procedimentos para conversão de pastos degradados e qual é o custo por hectare?

Luis Lapo – Os custos se iniciam em R$ 3.500/ha para conversão de uma área degradada em pastagem, podendo chegar a R$ 16.000 para conversão de área degradada em lavoura de soja, por exemplo.

AgriBrasilis – O senhor acredita que está ocorrendo uma “revolução” no crédito rural, com maior enfoque em sustentabilidade?

Luis Lapo – Faz alguns anos que comento que a matriz de financiamento da agricultura brasileira está obsoleta e precisa mudar.  Isso ocorre devido aos custos para equalização de taxas de juros em operações de crédito rural, e até pela escassez de recursos dentro do Brasil para financiar a nossa agropecuária.

Desde 2020, com as novas leis do agro, o Governo se preocupou em criar um ambiente institucional buscando viabilizar a expansão da captação de recursos internacionais para investimentos diretos no setor. Para trazer recursos de fora, precisamos dar ao investidor uma boa leitora do “risco x retorno” para tomada de decisão de se investir no Brasil ao invés de outros mercados, que é justamente o “core business” da Traive.

Apesar de termos uma das agriculturas mais sustentáveis do planeta, nossa reputação internacional ainda é muito ruim, tornando necessários mecanismos adicionais, como auditorias e certificações para garantir aos investidores estrangeiros que os recursos estão sendo aplicados corretamente. Na Traive, já recebemos alguns prêmios internacionais pelo nosso histórico em operações verdes, por exemplo.

O mesmo racional vale para o mercado interno, em linhas de crédito rural subsidiadas, por exemplo, onde cada vez menos será aplicada a lógica que dita que o “primeiro que chega leva os recursos”. O que estamos vivenciando agora é um momento de inflexão para todas as fontes de recursos: os melhores produtores, do ponto de vista de crédito e ESG, terão acesso às melhores linhas de financiamento, sejam elas em reais, dólares, recursos controlados ou livres.

 

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