“Além da competição por água, luz, nutrientes e espaço, as plantas daninhas podem atrapalhar os tratos culturais”
Ana Ligia Giraldeli é professora na Universidade Estadual de Londrina, engenheira agrônoma e mestre em agricultura e ambiente pela Universidade Federal de São Carlos, doutora em fitotecnia e especialista em agronegócios pela Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” – USP.
AgriBrasilis – Quais as principais espécies invasoras nas lavouras de cana?
Ana Giraldeli – Na cultura de cana-de-açúcar podemos separar em três grupos as principais espécies invasoras presentes: as tradicionais de ocorrência generalizada, tradicionais de ocorrência regional, e as emergentes com o sistema de produção e colheita mecanizada de cana-de-açúcar.
Nas tradicionais de ocorrência generalizada temos carurus (Amaranthus spp.), capim-braquiária (Brachiaria decumbens), capim-marmelada (Brachiaria plantaginea), grama-seda (Cynodon dactylon), tiririca (Cyperus rotundus), capim-colchão (Digitaria horizontalis), capim-pé-de-galinha (Eleusine indica), guanxumas (Sida santaremnensis), beldroega (Portulaca oleracea) e capim-colonião (Panicum maximum).
Nas tradicionais de ocorrência regional, temos capim-massambará (Sorghum halepense), fedegoso (Cassia spectabilis) e capim-camalote (Rottboellia cochinchinensis).
Nas emergentes, temos mucuna-preta (Mucuna spp.), mamona (Ricinus communis), melão-de-são-caetano (Momordica charantia), cordas-de-viola (Ipomea spp.), siratro (Macroptilium atropurpureum), bucha (Luffa aegyptiaca) e leiteiro (Euphorbia heterophylla).
AgriBrasilis – A tiririca (Cyperus rotundus), está entre as plantas mais difíceis de controlar em lavouras de cana. Por que isso ocorre? Que práticas devem ser adotadas contra essa praga?
Ana Giraldeli – A tiririca (Cyperus rotundus) está entre as dez plantas daninhas mais difíceis de controlar no mundo. Isso acontece por causa da sua forma de propagação, que dificulta o controle. Essa espécie tem a sua reprodução por meio de sementes, bulbos, tubérculos e rizomas.
Dificilmente o controle da tiririca será atingido em apenas uma safra. Para o controle, alguns pontos importantes devem ser observados: a capina, a roçada e o revolvimento do solo favorecem a planta. Alguns herbicidas para o controle são: sulfentrazona, diclosulam, imazapique, imazapir, glifosato, MSMA, halosulfuron e etoxissulfurom.
Também é importante fazer a limpeza do maquinário para que partes das plantas de tiririca não sejam levadas para outras áreas.
AgriBrasilis – Além da matocompetição, que outros problemas podem ser causados pela permanência de plantas daninhas no ambiente?
Ana Giraldeli – Além da competição por água, luz, nutrientes e espaço, as plantas daninhas podem atrapalhar os tratos culturais. Espécies como as cordas-de-viola atrapalham a colheita porque acabam causando o embuchamento da máquina, por exemplo. Espécies que contenham espinhos inviabilizam a colheita manual.
Algumas espécies reduzem a qualidade do produto, como no caso de sementes de plantas daninhas aderidas à fibra do algodão ou ainda no caso dos tubérculos de tiririca crescendo dentro de tubérculos de batata. Algumas espécies são hospedeiras de pragas, doenças e nematoides. Além de áreas agrícolas, as plantas daninhas também podem ser problemas em áreas não agrícolas, como em rodovias, linhas férreas, lagos, rios e embaixo de fios de alta tensão.
AgriBrasilis – Como é realizado o manejo químico contra plantas daninhas na cultura da cana-de-açúcar?
Ana Giraldeli – O sistema de produção de cana-de-açúcar tem uma grande variabilidade de condições de fatores relacionados ao solo, clima e manejo da cultura.
Em relação ao solo, devemos analisar a capacidade de adsorção de moléculas químicas empregadas ao solo, ou seja, teores de matéria orgânica e teores e qualidade da argila para o uso dos herbicidas pré-emergentes. De modo geral, quanto maiores os teores de argila e de matéria orgânica de um solo, maiores serão as doses necessárias para o controle de plantas daninhas.
Outra questão são as condições de umidade e temperatura. Para épocas de maiores temperaturas e umidade, provavelmente teremos maior densidade de plantas daninhas na área. A escolha do herbicida deve considerar a umidade e o período sem chuva. Para isso, alguns produtos podem ser usados em épocas de seca. Geralmente, esses são herbicidas com maior solubilidade em água e menor Kow (coeficiente de partição octanol-água).
Também é preciso considerar a camada de palha deixada sobre o solo, pois herbicidas com maior solubilidade em água e menor Kow terão maior facilidade em transpor a camada de palha e atingir o solo.
AgriBrasilis – Quais as diferenças dos controles de pré-emergência e pós-emergência? Por quê?
Ana Giraldeli – No controle em pré-emergência, o alvo do herbicida é o banco de propágulos do solo. O herbicida precisa atingir o solo e chegar na camada de 0 a 10 cm de profundidade, na qual se concentram a maior parte das sementes de plantas daninhas.
Herbicidas pré-emergentes precisam de umidade no solo para serem ativados e, de fato, alcançarem a solução do solo e serem absorvidos pelas sementes no processo de germinação e emergência.
Os herbicidas em pós-emergência são aplicados após a emergência das culturas e/ou planta daninhas. Quando aplicados em pós-emergência da cultura, eles precisam ser seletivos para não causar injúrias severas a cultura. O alvo nesse caso, são as folhas das plantas daninhas. Para isso é importante que não ocorram chuvas em período de duas a seis horas após a aplicação (dependendo do produto).
No geral, há recomendação do uso de adjuvantes junto com o herbicida em pós-emergência, mas isso também dependerá do produto, pois alguns já vêm com adjuvantes na formulação.
AgriBrasilis – O que são mudas pré-brotadas de cana? Quais os impactos desse sistema de plantio no manejo de plantas daninhas?
Ana Giraldeli – As mudas pré-brotadas de cana-de-açúcar são uma tecnologia de multiplicação que contribui para a produção rápida de mudas, associando elevado padrão de fitossanidade, vigor e uniformidade de plantio, com a redução da quantidade de mudas que vai a campo.
Nesse sistema, como a muda vai para o campo formada, o diferencial é que existe o contato do sistema radicular da cana com a camada de solo tratada com herbicida pré-emergente.
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