Equador, Colômbia e Brasil: flores durante a pandemia

Publicado em: 2 de julho de 2021

O costume de presentear com flores vai além de qualquer época ou cultura. Em 2019, as exportações de flores, plantas e suas partes movimentaram mais de 22 bilhões de dólares. Os principais exportadores são Holanda, Colômbia e Equador.

A pandemia inicialmente teve grande impacto no setor, mas depois a compra de alguns tipos de flores restabeleceu, com o desejo das pessoas de enfeitar suas casas e a venda em supermercados. AgriBrasilis entrevistou Augusto Solano, Presidente Executivo da Asocolflores, na Colômbia; Alejandro Martínez, Presidente Executivo da Expoflores do Equador; e Cesar Mauricio Torres Martinez, representante de companhias de breeding, do Brasil.

Colômbia

Augusto Solano, Presidente Executivo da Asocolflores da Colômbia

De acordo com a Asocolflores, o setor floricultor na Colômbia representa entre 5% e 7% do Produto Interno Bruto. Este importante indicador é o resultado do trabalho de cerca de 140.000 empregos formais, diretos e indiretos, que o setor gera e dos quais 65% correspondem a mulheres chefe-de-família. A área cultivada de espécies ornamentais corresponde a cerca de 7.700 ha, dos quais 66% se concentram no departamento (Estado) de Cundinamarca, 33% em Antioquia e 1% na região Ocidente do país.

Quando perguntada sobre o diferencial da produção colombiana, a associação apontou 3 elementos: O grande número de espécies e variedades; o respeito pelo Desenvolvimento Sustentável; e sua durabilidade. De fato, a Colômbia conta com 60 espécies de flores e cerca de 1.400 variedades que asseguram diferentes cores, formas e tamanhos. Ao adquirir uma flor colombiana, em qualquer país, o comprador tem a certeza de levar um produto com características inigualáveis.

Já no quesito sustentabilidade, o setor floricultor colombiano é um dos líderes mundiais. Junto ao “Florverde® Sustainable Flowers”, hoje 40% das exportações colombianas são certificadas por um selo que audita e contribui para a melhoria contínua dos produtores em sua cadeia de valor, e o valor continua crescendo. O programa de  sustentabilidade da associação é reconhecido por diferentes países graças às cinco frentes consolidadas: Gestão e conservação de água; Gestão integral de resíduos; Uso responsável de agrotóxicos; Conservação da biodiversidade; Uso de fontes renováveis; Gestão da pegada de carbono.

Nos últimos anos, graças a ações diretas das empresas floricultoras colombianas, o setor tem reduzido o uso de agrotóxicos químicos em 43%; tem promovido o uso de água da chuva há 20 anos, sendo que no último ano o

Trabalhadoras com flores cortadas

uso deste recurso correspondeu a mais da metade do total de água utilizada. Da energia utilizada pelo setor no ano passado, 56% era proveniente de fontes renováveis; e apenas 10% das emissões geradas de gases do efeito estufa são atribuídas a fontes diretas.

Esses esforços permitem que a Colômbia seja pioneira mundial do setor floricultor na implementação de indicadores ambientais e de sustentabilidade e na substituição de gases refrigerantes. A associação também prestou importante apoio aos produtores na adoção de protocolos de biosseguridade para o setor floricultor durante a pandemia de Covid-19. O terceiro elemento que caracteriza as flores colombianas é a sua longevidade.

O conhecimento adquirido em todo o processo de produção, a eficiência na semeadura de novas variedades, o respeito à propriedade intelectual, a atualização constante nos mecanismos de hibridação e os altos  padrões das flores colombianas em relação aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU, garantem um produto de altíssima qualidade.

A qualidade da flor colombiana é tão alta que após ser transportada, por exemplo, por 25 dias por mar para um destino como o Japão, ela vive com seu esplendor, cor e tamanho por 15 dias em um vaso, enquanto que as flores de outros países vivem por menos tempo.

E para manter o protagonismo no mercado internacional o mercado de exportação de flores colombiano conta ainda com uma cadeia logística de grande qualidade, a qual deve responder de forma imediata aos requerimentos necessários do comércio internacional e exige uma sincronização total, desde a produção e armazenamento, até a entrega ao cliente final.

Por fim, a internet e os novos hábitos de consumo não afetaram negativamente o consumo de flores, pelo contrário. A Asocolflores afirma que o e-commerce tem permitido aos floricultores encontrar novas oportunidades de exportação. Outro fenômeno percebido foi que na pandemia as pessoas permaneceram mais tempo nos seus lares e querem contar com espaços mais agradáveis e mais bem decorados, escolhem as flores por seus benefícios emocionais, uma grande oportunidade para aproximar-se da natureza.

As novas condições em que vivemos permitem o maior relacionamento com o comércio eletrônico e os empresários têm se capacitado nesse sentido. Seções de informação sobre como exportar através de plataformas digitais,  capacitação no fechamento de brechas, e desenho de estratégias digitais para gerar tráfego são hoje comuns na relação dos produtores com a associação.

Centro de embalagem para distribuição

A Asocolflores acrescenta que ferramentas tecnológicas abrem portas a inúmeras possibilidades e oferecem um canal alternativo para chegar a consumidores que no passado haviam sido difíceis de alcançar. As pessoas já não precisam, ou mesmo não querem sair de casa e ficar em filas, portanto o comércio eletrônico tem sido a resposta para isso. É importante esclarecer que não são apenas as novas gerações que usam seus celulares ou computadores para comprar, a situação fez com que homens e mulheres de todas as idades optassem pelo seu uso para adquirir produtos.

Equador

Alejandro Martinez, Presidente Executivo da Expoflores do Equador

Também no Equador a floricultura tem sido um importante fator no desenvolvimento social e econômico há mais de 40 anos, especialmente nas zonas rurais da serra equatoriana; onde tem gerado trabalho, convergindo em um crescimento econômico e comercial, mitigando a migração nacional e internacional. De acordo com a Expoflores, a floricultura representa 10% do PIB agrícola do país, sendo o quarto produto nãopetroleiro de exportação, contribuindo com US$ 850 milhões ao ano.

A atividade do setor floricultor emprega mais de 110.000 profissionais direta e indiretamente. Quando comparado o
diferencial do produto final a outros países produtores, a flor equatoriana é reconhecida por sua alta qualidade, vida em vaso, cor e botão. Ela também se destaca pela sua diversidade de cores e tipos de flores assim como variedades exclusivas. Estas características se devem à posição geográfica do país e aos cuidados, além da inovação tecnológica que as fazendas aplicam aos seus cultivos.

Entre essas inovações é cada vez mais forte a implementação de ferramentas de software para automatização em melhora dos processos produtivos. Também o uso de biotecnologia para controle de pragas, doenças e nutrição de cultivos. E até chegar às residências para encantar os consumidores, a produção de flores segue um longo processo.

Ele se inicia nas empresas detentoras, breeders e propagadoras, que criam as variedades de rosas e flores de verão, as que são adquiridas pelas empresas produtoras (fazendas), as quais se dedicam a semeadura e produção das flores (cultivo – pós-colheita). Nesse ponto existem várias fases que implicam conhecimentos técnicos, manejo de pragas, manejo de água e resíduos; isso significa, com cuidado muito delicado intensivo aos cultivos para que o produto seja de alta qualidade e possa ser exportado. Uma vez que as flores saem da fazenda são direcionadas as agências de carga, depois passam aos paletizadores e finalmente, chegam as companhias aéreas para serem exportadas a mais de 134 destinos.

Quanto aos preços, há certa estabilidade de acordo com a associação, sendo que o preço de produção tem uma variação anual de aproximadamente 3% principalmente pelo custo da mão de obra, o preço de exportação normalmente se mantém durante a maior parte do ano, com exceção das festas dia de São Valentim e o Dia da Mulher, que incrementam em aproximadamente 2%.

Por fim, os novos costumes e a internet têm sim influência sobre o mercado, mas é de forma positiva. A venda online de flores (e-commerce) e também em supermercados tem crescido de forma exponencial. Principalmente durante a pandemia, observou-se que esse foi o canal no qual mais houve um aumento de vendas, muito mais do que as vendas tradicionais (floristas ou eventos).

Sempre haverá um espaço para transmitir emoções, e a floricultura está transformando sua cadeia logística, com envio mais direto e personalizado.

Brasil

Cesar Mauricio Torres Martinez, representante de empresas de cruzamento

Em comparação com seus vizinhos da América Latina, o Brasil exporta pouco, apenas alguns bulbos e plantas ornamentais. Parte desse posicionamento se deve ao grande mercado interno, mas também a dificuldades logísticas.

A AgriBrasiis entrevistou Cesar Mauricio Torres Martinez, Engenheiro Agrônomo, produtor de flores e representante de empresas de breeding, como a italiana NIRP International, em Holambra, São Paulo.

As espécies mais produzidas, em se tratando de flores de corte são: em primeiro lugar a Rosa, em segundo a astromélia, o Brasil é o hoje o segundo maior produtor desta flor depois da Colômbia, tudo para consumo interno. Em terceiro lugar o crisântemo, que tem a vantagem de poder ser produzido em quase todos climas do brasil, não precisa ser centralizada no sudeste como a rosa e astromélia.

Quando falamos das diferenças de produção para países exportadores, o entrevistado considera que comparando o Brasil com Equador e Colômbia, as diferenças de produção são que o produtor brasileiro, por saber que sua produção será comercializada internamente, não se dedica muito a itens de qualidade, de pós-colheita especialmente. Em seu ponto de visto, isso é um desperdício, pois temos condições climáticas, de mão-de-obra e de infraestrutura que, se melhorássemos um pouco essa exigência de qualidade pós colheita,
principalmente, poderíamos exportar.

Quando se visita esses países, até México, que tem condições climáticas similares às nossas, se vê que os produtores, mesmo que pequenos, sempre têm em mente a visão de exportação, que faz com que tenha qualidade superior à nossa no pós-colheita e durabilidade do produto. Salvo flores que vão para nordeste e duram 3 ou 4 dias em um caminhão, mas estas ainda são de qualidade razoável, não padrão internacional.

Isso ocorre pelo fato de ser um país continental, que consome flor, embora seja um consumo per capta baixo, se comparado ao de outros países, abaixo da Argentina, por exemplo.

Não obstante, a opinião de Cesar Mauricio é que esse seria sem dúvida um momento excepcional para entrar no mercado internacional, já que temos um dólar extremamente alto em 2021, com câmbio atingindo 5,60-5,75 reais por dólar, poderíamos vender por bons preços, melhores que os que vendemos localmente.

Mas para isso, precisamos da mentalidade, e de logística e infraestrutura a nível de aeroporto, existe uma parte política que está faltando para poder ajudar a concretizar esses projetos.

Produção de rosas em estufa

Sobre as dificuldades de produção, além dessa falta de orientação para qualidade exportadora, o agrônomo aponta a falta de mão-de-obra, o que percebe ser um empecilho em vários países produtores, pois o trabalho nas estufas é árduo, e os trabalhadores não querem passar 8 horas em altas temperaturas, ademais, é necessário uma boa equipe para treinar os funcionários.

O Brasil também é bastante dependente de importação de tecnologia quando falamos em genética de flores e plantas.

Fazer pesquisa em flores é extremamente pontual, está na mão de poucas empresas no mundo todo. As empresas importantes geralmente são familiares e estão no mercado há mais de 100 anos. A NIRP, por exemplo começou em 1880, e foi passando de geração em geração, é uma pesquisa que mais que um negócio é uma paixão.

Faz-se entre 30 e 40 mil cruzamentos por ano, que geram cerca de meio milhão de sementes, cada  semente é um indivíduo diferente. Essa pesquisa de seleção vai ao longo de 7 anos, no primeiro ano semeia-se esse meio milhão, e posteriormente descarta 480 mil plantas. Há uma equipe especializada para eliminar as plantas que não atingem as necessidades da empresa por algum defeito, é um check-list extremamente rigoroso com mais de 70 itens, e se apresentar um desses 70 itens vai ser destruída.

No terceiro e quarto ano se faz outra deleção, com outra avaliação de características favoráveis, sobrando 50 plantas. Essas 500 são plantadas em várias unidades demonstrativas ao redor
do mundo, 23 países com estufas, inclusive no Brasil em Andradas, Minas Gerais. Ao cabo de 7 anos vão sobrar cinco, seis, ou nenhuma, pode ser que nenhuma atingiu as expectativas, em um processo que se repete todo ano. É um processo longo, exige recursos, conhecimento, extremamente fechado.

Existem outras tecnologias que vem de fora, plásticos de estufa que vêm de Israel, França, Espanha, e até Colômbia, mas já tem plásticos muito bons aqui também. Nossa tecnologia em estufas e climatização, está muito mais adiante que outros países da América Latina em tecnologia, construção, qualidade, e manejo do clima.

Com relação à pandemia, o agrônomo reconhece que a situação, principalmente para os produtores de flores de corte, é muito complicada. As empresas estão passando por dificuldades, esperando a volta dos eventos, setor que mais consumia flores de corte, sobram os mercados que estão mantendo o setor com algum fôlego.

Então os produtores estão migrando para produção de comida, pois as estufas conseguem produzir tomates, pimentões, berinjela. Ademais a pandemia gerou desemprego que atingiu também quem podia comprar flores. Está sobrando produto, os preços estão preços baixos.

Por fim, sobre os impactos das mudanças provocadas pela cultura digital, afirma que a internet é uma ferramenta fantástica para o consumidor final, que pode abrir seu tablet ou celular, e em poucos segundos pode comprar flores para presentear alguém.

Já para os produtores, hoje trabalham com plataformas muito ágeis, as duas cooperativas que são os principais mercados do Brasil, Veilling e Cooperflora, cada um tem sua plataforma de internet, em que os cooperados conseguem vender aos clientes já calculando o lucro e mandando os pedidos diretamente para a cooperativa. Suponhamos que haja um casamento dentro de 6 meses, os noivos podem ir à floricultura onde querem comprar flores, o floricultor entrar no sistema da Cooperflora e já sabe qual será o preço pra a venda em Curitiba ou no Rio de Janeiro, por exemplo. Podese fazer vendas com um ano de antecipação, já sabendo o preço e com a certeza que vai receber. Já se trabalha com inteligência artificial para determinação de preços, o que ajuda a formar mercado e escoar a produção de maneira ágil, mais importante ainda agora na pandemia.