Por que a agricultura no cerrado brasileiro é a mais eficiente do mundo?

Heitor Cantarella

José Antonio Quaggio
Pesquisadores do IAC contam como a ciência pode contribuir para lucratividade de solos inférteis.
José Antonio Quaggio, já aposentado, e Heitor Cantarella são pesquisadores do Instituto Agronômico de Campinas (IAC) e da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo e eles concederam para a AgriBrasilis uma entrevista sobre a história pouco conhecida do desbravamento dos solos de vegetação dos cerrados brasileiros que levaram ao desenvolvimento mais sustentável da agricultura.
AgriBrasilis – Considerando as condições pouco favoráveis para o início da exploração agrícola do cerrado, quais ferramentas que viabilizaram a abertura para agricultura, tornando o cerrado a maior região agrícola do País?
Dr. Quaggio e Dr. Cantarella – Um pouco de história é importante para divulgar as pesquisas pioneiras que permitiram a exploração agrícola racional e sustentável das áreas do Brasil Central, cobertas originalmente por vegetação de Cerrados.
Essas pesquisas começaram no início dos anos cinquenta e se estenderam até meados dos anos setenta, através de projetos conjuntos de pesquisa entre o Instituto Agronômico de Campinas-IAC e o “International Reseach Institute-IBEC-IRI”, mantido com recursos da International Rockefeler Foundation”.
O IBEC-IRI foi instalado nas dependências da Fazenda Cambuhy, com sede na cidade de Matão-SP, que contou também com forte apoio financeiro e de infraestrutura da família proprietária da fazenda.
Os principais objetivos iniciais deste projeto eram estudar o declínio da cafeicultura na região da Araraquarense, no Estado de São Paulo e depois se estendeu para outras culturas e regiões com solos tropicais com baixa fertilidade natural e na maioria das vezes com vegetação de cerrados.
A liderança do IAC nas pesquisas agrícola no País e a infraestrutura de laboratório de análises de solo, que já existiam desde 1889, foram os principais atrativos para a instalação do IBEC-IRI no Estado de São Paulo, que trouxe para o Brasil uma pequena equipe de competentes cientistas que passaram a trabalhar com seus pares brasileiros.
Essa parceria permitiu a instalação nas dependências do IAC do primeiro laboratório de análises foliares e tecidos vegetais no Brasil, existente até hoje, o qual foi muito útil na caracterização das deficiências de micronutrientes em folhas de café e também de outras culturas como arroz, milho, feijão, algodão e soja, uma vez que nessa época, não haviam métodos de análises de solo disponíveis para os micronutrientes.
Essas culturas foram cultivadas em experimentos instalados nos solos no norte do Estado de São Paulo e Triângulo Mineiro, com áreas extensas de vegetação nativa de cerrados, e na antiga Estação Experimental do Ministério da Agricultura em Planaltina-DF, onde hoje está instalado o Centro de Pesquisa dos Cerrados da Embrapa.
Desde aquela época, os pesquisadores já identificaram que esse tipo de vegetação, caracterizada pela forma tortuosa das plantas, com cascas grossas e mais resistentes às queimadas frequentes, eram decorrentes da adaptação à falta de nutrientes e da excessiva acidez dos solos, além dos períodos secos no inverno.
Esses projetos geraram muitos conhecimentos científicos que foram a base para à produção agrícola em larga escala no Cerrado brasileiro sendo hoje considerada a agricultura mais eficiente do mundo.
O reconhecimento por essa conquista, fundamental para o agronegócio brasileiro e para o suprimento de alimentos para o mundo, garantiu ao pesquisador líder dessa equipe, o Dr Andrew C. McClung, PhD em Fertilidade do Solo, o mais importante prêmio da agricultura internacional, o “World Food Prize” prêmio criado pelo Dr. Norman Borlaug, considerado o “Pai da agricultura moderna”.
Vale a pena salientar que, apesar do reconhecimento científico internacional do verdadeiro pioneirismo dessas instituições como o IAC e o IBEC-IRI no desbravamento dos Cerrados brasileiros, esse reconhecimento ocorreu de forma tímida internamente no Brasil, na minha opinião em decorrência da falta de divulgação dos meios de comunicação da mídia brasileira.
AgriBrasilis – As queimadas naturais no bioma atuam como um agente ecológico. O que difere as queimadas naturais e as provocadas pela ação do homem? Como as queimadas antropogênicas desequilibram a biodiversidade do Cerrado e impactam o ambiente?
Dr. Quaggio e Dr. Cantarella – Queimadas naturais são eventos de rara frequência, enquanto as queimadas provocadas pelo homem são práticas do passado quando os produtores não cultivavam o cerrado e ateavam fogo na vegetação durante o período de estiagem para forçar vegetação das espécies rasteiras e produzir um pouco de forragem para alimentar os animais.
Atualmente ninguém mais faz isso e todos os produtores estão na busca de produzir o maior volume possível de palha para aprimorar o sistema de plantio.
Queimadas são sempre nocivas ao meio ambiente, independente da sua origem.
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