“…um deslocamento da demanda chinesa para os produtos brasileiros, sobretudo para a soja…”
Enilson Nogueira é consultor e analista de mercado na consultoria agrícola Céleres, economista e mestre em economia agrícola pela Esalq/USP.
Nogueira é responsável pelo acompanhamento dos mercados de soja, milho, algodão e mercados/indústrias relacionados.

Enilson Nogueira, consultor na Céleres
AgriBrasilis – Quais os impactos do governo Trump sobre o mercado de grãos?
Enilson Nogueira – O governo Trump aumenta as chances de retomada da guerra comercial entre EUA e China, principalmente com a imposição de barreiras comerciais a outros parceiros, como México e Canadá. A evidência disso ficou ainda mais clara com a decisão de retomar ou aumentar a tarifa de exportação agrícola dos EUA para a China, comunicada no início de março de 2025.
O efeito direto desse cenário é um deslocamento da demanda chinesa para os produtos brasileiros, sobretudo para a soja, visto que a China é o maior consumidor e esmagador dos grãos do país e importa mais de 80% do volume necessário para seu parque industrial. Isso seria positivo para aumentar a demanda pela soja brasileira em meio à safra recorde colhida em 2025, sustentando os preços locais.
Por outro lado, as incertezas trazidas pela mudança de governo adicionam complexidade à tomada de decisão no mercado local, expressando-se na maior volatilidade dos preços e no impacto sobre o câmbio.
AgriBrasilis – A desvalorização do real tem sido benéfica para o agro?
Enilson Nogueira – A desvalorização tem dois lados. Historicamente, o impacto é positivo, pois aumenta mais as receitas do que os custos.
O real mais fraco tende a sustentar os preços dos produtos exportados, como soja, milho, algodão em pluma e proteína animal, além de aumentar a competitividade brasileira no mercado internacional. Em dólar, o produto brasileiro torna-se mais barato. Por outro lado, há um aumento nos custos agrícolas, puxado pelos insumos importados – fertilizantes e defensivos – que devem impactar os produtores na compra de insumos para a safra 2025/26.
AgriBrasilis – Como as incertezas sobre o plantio da segunda safra de milho têm afetado o mercado?
Enilson Nogueira – O mercado local já opera acima da paridade de exportação, sobretudo nas regiões de maior consumo do cereal, como as usinas e as empresas de proteína animal.
Além do atraso no plantio, a incerteza agora está no volume de chuvas entre março, abril e maio. Como ponto positivo, o Mato Grosso tem tido chuvas dentro do esperado. Por outro lado, partes de Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso do Sul tiveram períodos prolongados de seca entre o fim de fevereiro e o início de março de 2025.
O desempenho da segunda safra será o principal fator na formação dos preços do milho no mercado local em 2025.
AgriBrasilis – Por que o milho pode ser culpado pelo aumento do preço do ovo?
Enilson Nogueira – O milho, por ser um componente relevante no custo de produção, impacta diretamente o preço dos ovos e da proteína animal. Logo, a alta no preço do milho eleva os custos de produção, impactando a oferta e sustentando os preços dos ovos.
No entanto, outros fatores também influenciam. Sazonalmente, os preços dos ovos sobem entre o Carnaval e a Quaresma, devido ao aumento do consumo no período. Além disso, o real desvalorizado e os juros altos também impactam os custos, contribuindo para a alta dos preços no mercado local.
AgriBrasilis – Que fatores têm causado o aumento no preço do milho?
Enilson Nogueira – O principal fator é o baixo estoque de passagem de 2024 para 2025. No ano passado, os preços baixos do cereal reduziram a área plantada e o pacote tecnológico adotado pelos produtores, diminuindo a oferta em um momento de margens positivas e crescimento da demanda local – sobretudo por parte das usinas de etanol de cereais e das indústrias de ração e produção animal.
Além disso, a desvalorização do real e os riscos climáticos da segunda safra de 2024/25 aumentaram com o atraso no plantio no início do ano.
AgriBrasilis – Quais as perspectivas para o setor de grãos em 2025?
Enilson Nogueira – O cenário geral é de preços mais altos, principalmente para o milho, e normalização das margens na produção de soja e milho, sustentados pela desvalorização do real e pela demanda externa adicional decorrente da mudança de governo nos EUA.
Além disso, a questão logística volta a ser um desafio em 2025. O aumento da produção de grãos e outros produtos agrícolas deve elevar os custos dos fretes, ampliar o déficit de armazenamento no interior e pressionar a ocupação portuária.
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