Degradação florestal da Amazônia aumentou quase 5.000% em março

“O cenário de seca em Roraima aumentou a vulnerabilidade da floresta à propagação dos incêndios florestais e explica esse aumento expressivo na degradação…”

Larissa Amorim é pesquisadora do Programa de Monitoramento da Amazônia do Imazon – Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia, engenheira florestal, com mestrado em ciências florestais pela Universidade Federal Rural da Amazônia.

Larissa Amorim, pesquisadora no Imazon


AgriBrasilis – A degradação florestal da Amazônia aumentou quase 5.000% em março ante o mesmo mês de 2023. Por quê?

Larissa Amorim – A degradação detectada em março de 2024 na Amazônia Legal concentrou-se no estado de Roraima, que enfrenta atualmente uma grave seca. Para o principal rio do estado, o Rio Branco, por exemplo, essa é a segunda maior seca desde 1972, quando a Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) começou a monitorá-lo.

O cenário de seca em Roraima aumentou a vulnerabilidade da floresta à propagação dos incêndios florestais e explica o aumento expressivo na degradação, já que esse tipo de dano ambiental é causado tanto pelo fogo quanto pela exploração madeireira. Ou seja: quando temos grandes queimadas, a degradação aumenta.

Além disso, com o clima mais seco e a pouca incidência de nuvens no céu, como ocorreu em março em Roraima, os satélites detectam com maior exatidão o que ocorre na floresta. Além dos dados de degradação do Imazon, informações do monitoramento do fogo do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) mostraram que o estado concentrou 40% dos focos de incêndio do Brasil no primeiro trimestre de 2024.

“Em março, Roraima apresentou 31 km² de desmatamento, 11% a mais que em março de 2023, quando a derrubada foi de 28 km²”

AgriBrasilis – Qual é a diferença entre degradação e desmatamento?

Larissa Amorim – O desmatamento ocorre quando a cobertura florestal de uma determinada área é totalmente retirada, o que chamamos de “corte raso”. A degradação ocorre quando parte da floresta é afetada, o que acontece principalmente por causa da exploração madeireira e do fogo.

No caso da exploração madeireira, apenas as espécies de maior valor comercial são derrubadas. Quando ocorrem as queimadas, a floresta também é parcialmente afetada, com a morte de algumas espécies.

AgriBrasilis – Como está a situação da seca em Roraima e de que maneira esses dados são avaliados?

Larissa Amorim – Roraima passou por uma seca severa nos meses de fevereiro e março. O Rio Branco, principal rio do estado, atingiu o segundo menor nível histórico no dia 23 de março, com 39 centímetros negativos, segundo dados da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA). Com isso, o governo estadual decretou situação de emergência em 14 dos 15 municípios de Roraima.

No Imazon, avaliamos o impacto da seca na dinâmica do desmatamento e da degradação florestal por meio do Sistema de Alerta do Desmatamento, o SAD. Após diversas análises das imagens de satélites realizadas pelo time de cientistas do monitoramento, emitimos boletins mensais com dados sobre a Amazônia Legal. Dados do SAD relacionados ao mês de fevereiro alertaram para o aumento do desmatamento em Roraima, que foi de 19 km² em 2023 para 26 km² em 2024. Além disso, em fevereiro de 2024, 50% da degradação florestal de toda a Amazônia Legal estava concentrada no estado. Em março, Roraima apresentou 31 km² de desmatamento, 11% a mais que em março de 2023, quando a derrubada foi de 28 km². Além do desmatamento, o estado apresentou uma área degradada de 2.121 km², 700 vezes maior do que em março do ano passado, quando a área degradada foi de 3 km².

AgriBrasilis – O sensoriamento remoto é confiável para avaliar a condição das florestas?

Larissa Amorim – O sensoriamento remoto é uma tecnologia que permite obter informações sobre a superfície terrestre através de imagens de satélite. É confiável e é usado para diversos tipos de monitoramentos e estudos. Para o nosso monitoramento mensal de desmatamento e degradação florestal, utilizamos as imagens dos satélites Landsat 8 e 9, da NASA, e Sentinel 1A, 1B, 2A e 2B, da Agência Espacial Européia (ESA). Todos os dados são de domínio público e podem ser acessados e utilizados por qualquer pessoa ou instituição.

AgriBrasilis – Qual tem sido a evolução do desmatamento por corte raso na região?

Larissa Amorim – De modo geral, as áreas desmatadas estão associadas à conversão para pecuária, agricultura ou garimpo. Analisando a série histórica dos dados acumulados anuais do SAD, o desmatamento na Amazônia apresentou aumento gradativo desde 2018 e uma queda significativa em 2023. Quando comparamos a devastação detectada em 2022 ante 2023, a redução foi de 62%. Essa diminuição também refletiu no desmatamento detectado nas terras indígenas e unidades de conservação.

Quando comparamos o que foi detectado em 2022 em relação a 2023, a queda do desmatamento nessas duas categorias de áreas protegidas foi de 73%. São dados bastante animadores, pois estamos falando de territórios instituídos por lei para manutenção dos recursos naturais e do modo de vida dos povos originários e tradicionais. Para que o desmatamento continue com tendência de redução, é necessário que as ações de combate e controle sigam ocorrendo em toda Amazônia, focando principalmente nas áreas que sofrem maior pressão ambiental.

AgriBrasilis – Por que o desmatamento da Amazônia é o maior responsável pelas emissões de carbono no Brasil?

Larissa Amorim – A Amazônia ocupa grande parte do território brasileiro e, nos últimos anos, as taxas de desmatamento foram bastante elevadas na região. Tanto a derrubada quanto as queimadas são fatores associados ao processo de emissão do dióxido de carbono, o CO2, que é um dos gases do efeito estufa. Portanto, quanto maior o aumento da devastação da Amazônia, maior a emissão dos gases de CO2. O que, por sua vez, intensifica o processo do efeito estufa, que contribui para o aquecimento global e a ocorrência de eventos extremos como chuvas intensas e secas severas.

AgriBrasilis – Quem são os vilões do desmatamento da região?

Larissa Amorim – Podemos citar a grilagem de terras como uma grande problemática em relação ao desmatamento na Amazônia. Isso porque as florestas públicas que ainda não possuem um uso definido têm sido o principal alvo das ações dos desmatadores ilegais. Na maioria dos casos, a invasão dessas terras começa com a exploração madeireira, para a retirada das árvores de maior valor comercial das áreas. Depois, é comum ocorrer a remoção completa da cobertura vegetal que sobrou, o desmatamento. E, com a área desmatada, geralmente ocorre a conversão do uso da terra para pecuária, agricultura, garimpo e especulação fundiária.

AgriBrasilis – Quais são os projetos do Imazon na Amazônia?

Larissa Amorim – O Imazon possui atualmente cinco programas de pesquisa. São eles: Monitoramento da Amazônia, o qual monitora e analisa as principais pressões humanas sobre a região a partir de imagens de satélite e bancos de informações; Restauração de Paisagens, que atua na recuperação de áreas desmatadas e degradadas na Amazônia Legal com foco na inclusão socioambiental; Direito e Sustentabilidade, que visa contribuir para que as leis e as práticas ambientais, climáticas e fundiárias incidentes na região sejam compatíveis com o desmatamento zero e com um modelo de desenvolvimento que respeite os direitos das populações que mantêm a floresta em pé; Política e Socioeconomia, que tem como objetivo avaliar a efetividade das políticas públicas e das iniciativas do setor privado no âmbito da agenda de desenvolvimento de baixo carbono apoiada em soluções baseadas na natureza e com inclusão social; e Áreas Protegidas, que apoia os governos municipais, estaduais e federal na criação, proteção, implementação e consolidação de áreas protegidas na Amazônia.

 

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