Desdobramentos da crise gerada pelo Covid-19 preocupam o setor de defensivos agrícolas no Brasil

Publicado em: 26 de novembro de 2020

Presidente do Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para Defesa Vegetal aborda os impactos da crise.

O Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para Defesa Vegetal (Sindiveg) representa a indústria de produtos para defesa vegetal no Brasil há 79 anos. Reúne 26 associadas, o que representa aproximadamente 40% do setor. O Sindiveg atua junto aos órgãos governamentais e entidades de classe da indústria e do agronegócio pelo benefício da cadeia nacional de produção de alimentos e matérias-primas.

Entre suas atribuições estão as relações institucionais, com foco em um marco regulatório previsível, transparente e baseado em ciência, e a representação legítima do setor com base em dados econômicos e informações estatísticas. A entidade também atua em prol do fortalecimento e da valorização da comunicação e da imagem do setor, assim como promove o uso correto e seguro dos defensivos agrícolas.

 

Desde janeiro de 2018, Júlio Borges Garcia é presidente do Sindiveg. Formado em administração de empresas pela Faculdade de Administração de Empresas de Sorocaba, e possui curso de educação executiva no Advanced Management Program da IESE Business School. Júlio foi Diretor Presidente da Iharabras de 2012 a 2019 e atualmente é Presidente do conselho de administração da empresa, desde janeiro de 2020.


Júlio Garcia concedeu a seguinte entrevista à AgriBrasilis.

 

Cortesia de Case

AgriBrasilis – Como têm se comportado as importações de defensivos agrícolas, neste período de pandemia?

Júlio Garcia – Podemos dizer que o momento mais delicado já passou. Efetivamente, nas primeiras semanas da pandemia as indústrias associadas ao Sindiveg enfrentaram dificuldades por diversos motivos. Entre eles, o fato de que as fábricas de insumos na China pararam suas atividades, o que comprometeu bastante o regular fornecimento de matérias primas para o Brasil.


Simultaneamente, a variação cambial foi intensa, ultrapassando os 40%. Nesse cenário, não apenas a importação foi prejudicada como as cotações dos insumos e matérias primas tiveram aumentos reais de preços. Num segundo momento – a partir de maio – o cenário ficou mais claro. A volta do fornecimento normal das indústrias chinesas deu certa tranquilidade às indústrias associadas ao Sindiveg, mesmo assim nosso segmento continua fortemente impactado pela elevação dos custos em dólar.

 

AgriBrasilis – Os importadores seguram os embarques no primeiro semestre. Isto irá prejudicar os tratos culturais das culturas de verão?

Júlio Garcia – Não. Cientes do cenário indefinido nas primeiras semanas da pandemia, os agricultores adiantaram suas compras, aproveitando os estoques em mãos dos distribuidores e também da indústria. Foi a estratégia correta pois os produtores adquiriram defensivos agrícolas em outro patamar de preços, antes da escalada do dólar no Brasil.


Não se pode esquecer que, ao mesmo tempo, o comércio internacional das principais commodities, como soja e milho, apresenta cenário extremamente favorável aos agricultores. Assim, eles venderam por cotações superiores ao mesmo tempo em que adquiriram defensivos agrícolas dos estoques por preços inferiores, já se preparando para a safra 2020/2021. Respondendo diretamente à pergunta, mesmo com problemas de abastecimento e preços dos insumos importados nas primeiras semanas da pandemia, não há risco de prejuízos para os tratos das culturas na safra de verão que, aliás, deverá ser recorde. O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), divulgou nos últimos dias que a safra 2020/2021 de verão deverá superar 278 milhões de toneladas contra 255 milhões/t da safra 2019/2020.

 

AgriBrasilis – Quais são os principais países fornecedores de defensivos agrícolas para o Brasil?

Júlio Garcia – China, Índia, Estados Unidos e Japão são os países dos quais mais importamos matérias primas, insumos e produtos agrícolas.



AgriBrasilis – As restrições para operação de fábricas na Índia estão impactando o fornecimento de produtos para o Brasil?

Júlio Garcia – Como o setor é um grande importador de matérias-primas, em especial oriundas da China e Índia, quando oscilou o fluxo de fornecimento das fábricas, houve problemas de entrega de determinadas matérias-primas e produtos intermediários às indústrias do Brasil.

Logo na sequência, as empresas chinesas re-abriram e houve regularização das entregas com pequenos reflexos no Brasil em termos de logística de fornecimento de matérias-primas e do próprio custo dos insumos, que aumentou de valor, em dólar. Nesse sentido, as restrições para operação de fábricas na Índia impactam menos o mercado brasileiro.

O grande desafio é que, paralelamente, houve grande volatilidade do dólar, que subiu mais de 40% no Brasil em poucas semanas, impactando fortemente o custo de produção de defensivos agrícolas.

O setor está preocupado com os desdobramentos da crise gerada pela Covid-19, pois sabemos que além dos impactos da própria doença a economia mundial será fortemente afetada e todas as cadeias produtivas serão atingidas, em maior ou menor grau. Mesmo assim, é importante dizer que as exportações de produtos agropecuários seguem em ritmo acelerado. Um exemplo: entre janeiro e junho foram embarcadas 69,6 milhões de toneladas de soja (aumento de 32,5% sobre igual período do ano anterior). Em receita, o ganho foi de 28,7%, atingindo US$ 23,93 bilhões com produto.

 

AgriBrasilis – Os preços de produtos da China tiveram uma queda significativa nos últimos meses. Isto se reflete nas importações?

Júlio Garcia – Não. Como dito acima, a variação cambial – cerca de 40% – desde o início da pandemia elevou consideravelmente os custos de produção de defensivos agrícolas. Além disso, os preços na China tiveram aumentos reais entre março e abril. A partir de maio, as cotações dos produtos chineses efetivamente caíram, porém as indústrias associadas ao Sindiveg continuam sendo impactadas pelo aumento dos valores em dólar.

 

AgriBrasilis – Com a sequência de boas safras agrícolas nos últimos anos e a importância do agronegócio na geração de riquezas para o país, quais as perspectivas na área de defensivos agrícolas?

Júlio Garcia – A pandemia tem impactado todos os setores e conosco não foi diferente. No primeiro semestre deste ano, o faturamento da indústria de defensivos agrícolas que atuam no mercado brasileiro permaneceu estável, em US$ 6,04 bilhões (US$ 6,03 bilhões em igual período de 2019). Importante destacar a consistente desvalorização cambial no período, cuja administração é um grande desafio, já que o dólar teve forte elevação no Brasil e ainda não conseguimos repassar esta variação integralmente. Mas as perspectivas são positivas.


A área tratada com defensivos tem crescido, em virtude do contínuo aumento dos desafios fitossanitários com doenças, pragas e plantas daninhas cada vez mais resistentes e desafiadores. Ressalte-se que isso ocorre devido ao clima tropical brasileiro – o mesmo que permite até três safras de vários cultivos por ano, mas é perfeito para os inimigos da produtividade. No primeiro semestre, com o recrudescimento do ataque de pragas e doenças agrícolas a área tratada cresceu 6%, atingindo 643,2 milhões de hectares.

Mesmo sob o efeito econômico negativo da pandemia, os agricultores não têm deixado de lado o investimento em tecnologia para o manejo eficaz desses problemas, que podem reduzir em até 40% o resultado da colheita. Como disse acima, a perspectiva é de crescimento da safra 2020/2021 em cerca de 9%.