"Falta de imaginação" atrasa desenvolvimento da Amazônia brasileira

Amazônia Brasileira

“O potencial econômico de base florestal da região Amazônica é gigantesco…”

Salo Coslovsky é pesquisador associado do projeto Amazônia 2030, e professor da Universidade de Nova York. Coslovsky é formado em administração pública pela FGV, mestre pela Tufts University e doutor pelo Instituto de Tecnologia de Massachusetts – MIT.

Amazônia 2030 é uma iniciativa de pesquisadores brasileiros para desenvolver um plano de desenvolvimento sustentável para a Amazônia brasileira.

Salo Coslovsky, pesquisador associado do projeto Amazônia 2030


AgriBrasilis – Por que o Brasil não explora a Amazônia de forma sustentável?

Salo Coslovsky – São vários problemas e dificuldades, mas um obstáculo muito importante, que acaba embasando todos os outros, é uma falha de imaginação. Muita gente, tanto nos diferentes órgãos e esferas de governos e também na sociedade civil, ainda enxerga a floresta como um obstáculo ao desenvolvimento da pecuária extensiva e da monocultura industrial, ou como um mal necessário para promover a conservação ambiental, enquanto as atividades compatíveis com a floresta são vistas como subsidiárias da assistência social.

Essa falta de imaginação é gravíssima e nos destina ao atraso. Para combatê-la, precisamos que mais gente imagine o Brasil como uma potência econômica que tem a natureza viva como seu maior ativo.

AgriBrasilis – Qual é o potencial econômico da região?

Salo Coslovsky – O potencial econômico de base florestal da região Amazônica é gigantesco. Como mostrei em uma das minhas pesquisas, o mercado global dos produtos compatíveis com a floresta, que a Amazônia já exporta, é de quase US$ 200 bilhões ao ano. O mercado de créditos de carbono está crescendo a um ritmo acelerado e pode alcançar valores astronômicos. A floresta pode ser também uma fonte de substratos para processos industriais de larga demanda, como a produção de fibras para papeis, papelão e embalagens longa vida, açúcares para processos químicos à base de fermentação e biocombustíveis para aviação. O céu é o limite.

“Essa falta de imaginação é gravíssima e nos destina ao atraso. Para combatê-la, precisamos que mais gente imagine o Brasil como uma potência econômica que tem a natureza viva como seu maior ativo”

AgriBrasilis – Quanto se perde por falta de investimentos na Amazônia?

Salo Coslovsky – O Brasil é um país de renda per capita média, um pouco abaixo de outros países tropicais, como México, Costa Rica e Malásia, mas com enorme território e grande população. As indústrias ligadas à natureza podem ser uma das indústrias de ponta no resto do século 21 e o Brasil deveria posicionar-se para ser o pioneiro entre todos os países tropicais ricos em natureza, liderando através do seu exemplo. Precisamos correr para não perder essa chance de nos tornar uma potência tropical.

AgriBrasilis – O que são as Mesas Executivas de Exportação e por que são importantes?

Salo Coslovsky – As Mesas Executivas de Exportação são uma iniciativa da ApexBrasil para promover o aprimoramento dos produtos compatíveis com a floresta na Amazônia. Elas baseiam-se em uma experiência peruana que foi adaptada ao Brasil. As Mesas Executivas prometem criar um espaço e processos para que empresas de vanguarda e seus aliados nos governos e na sociedade consigam trabalhar de forma coordenada para atingir objetivos claros de melhoria produtiva, segundo métricas incontestáveis, e em ritmo acelerado.

Outra forma de pensar nas Mesas Executivas é vê-las como o motor de arranque desses setores, que têm enorme potencial, mas ainda não conseguiram atingir o dinamismo e tamanho que merecem.

A primeira Mesa Executiva está apoiando os processadores de castanha do Brasil e a ApexBrasil deve criar mais dessas Mesas no decorrer do ano.

AgriBrasilis – O senhor disse que se o Brasil não trabalhar por inserção global, pode ficar para trás. Por quê?

Salo Coslovsky – Existem algumas “corridas” em curso no mundo. A primeira, e mais importante, é entre a maioria que está convencida da emergência climática e acredita que precisamos reduzir emissões de forma drástica, e a minoria que ainda acha que não precisamos nos preocupar com isso, e que podemos continuar emitindo gases de efeito estufa como se nada estivesse acontecendo.

A segunda corrida ocorre dentro do campo daqueles que acreditam na urgência climática e opõe os que defendem as chamadas “soluções baseadas na natureza” contra os que defendem as “soluções baseadas em tecnologia”. Eu não gosto desses dois nomes pois passam a impressão de que as soluções baseadas na natureza não envolvem tecnologia, quando na verdade elas exigem muita inovação, incluindo tecnologias agrícolas, biológicas, genéticas, equipamentos, sensores, satélites, etc. Por isso, gosto de chamar essa categoria de “soluções baseadas em capital natural”, enquanto as outras poderiam ser denominadas de “soluções baseadas em capital artificial”.

Estamos em um momento em que ambos esses tipos de solução estão buscando investimento para que consigam mostrar-se fortes e dignos de mais investimento, criando um ciclo virtuoso para provar que estavam certos. É essa corrida que não podemos perder, mas a urgência agora é acordar para saber que estamos competindo, e os concorrentes estão avançando a passos largos.

AgriBrasilis – Qual é o modelo ideal de desenvolvimento econômico para a Amazônia?

Salo Coslovsky – A Amazônia brasileira é uma região imensa e muito diversa. Cada subregião precisa de um modelo próprio, bem adaptado para suas condições. É importante lembrar que a maior parte da população da Amazônia vive em centros urbanos, então precisamos pensar em cidades pujantes, com economias próprias, e que apoiam e são apoiadas pelas atividades que acontecem nos seus entornos, nas áreas agrícolas e florestais.

Outro elemento importante é pensar que grande parte da infraestrutura que foi construída na Amazônia foi pensada para servir as demais regiões do país. Precisamos enterrar essa história de infraestrutura na Amazônia e começar a discutir infraestrutura para a Amazônia.

AgriBrasilis – Como o agro pode participar disso?

Salo Coslovsky – Nos anos 1940, o Brasil sonhou em ter uma grande indústria automobilística. Naquela época, essa era a indústria do futuro. Logo depois, o país sonhou em ter uma indústria ligada à aviação, que também seria uma indústria do futuro. Nos anos 1970, sonhou em ser líder agrícola, com destaque para açúcar e álcool, e também a soja no cerrado. Logo depois, sonhou em ser uma potência na fabricação de minicomputadores. Nem todas essas iniciativas deram certo e todas tiveram custos expressivos, mas pelo menos a gente sonhava grande e pensava em dar um salto transformador no nosso desenvolvimento.

Hoje, precisamos fazer igual, e como dizem alguns dos meus amigos, o futuro é ancestral. Isso significa que precisamos aprender a enriquecer com a natureza, ao invés de enriquecer às custas da natureza.

Muitos empreendedores que se identificam como “agro” já fazem isso. Existe crescente interesse por culturas do tipo agroflorestal, ou integração lavoura, pecuária e floresta. Existe também um mundo novo dos negócios da restauração florestal, que pode ser muito lucrativo. A minha expectativa é que muitos produtores rurais serão pragmáticos e vão querer jogar nesses times. Com o apoio deles, aumenta a chance de vencermos.

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