Biodenfensivos: Produção sustentável na cultura de citros

Publicado em: 14 de janeiro de 2021

Santin Gravena , especialista em Manejo Ecológico de Pragas, aborda vertentes do mercado no Brasil

O controle biológico está atrelado ao conceito de Manejo Integrado de Pragas (MIP), plano de medidas instituído na década de 1960 pela comunidade científica para controlar pragas agrícolas, prevenindo grandes danos ao meio ambiente. O MIP é composto por medidas voltadas à diminuição do uso de agrotóxicos na produção convencional, buscando promover o equilíbrio nas plantas e monitoramento das pragas ¹.

Estimativas mostram que o mercado mundial de bioagentes irá movimentar mais de US$ 5 bilhões em 2020, sendo US$ 800 milhões na América Latina. O mercado mundial de biológicos vem crescendo 9% ao ano, e o mercado brasileiro cresce em torno de 15% ².

Santin Gravena é Engenheiro agrônomo formado pela Unesp, e possui mestrado e doutorado pela ESALQ/USP. Seu título de pós-doutorado foi concedido pela Texas A&M University, nos Estados Unidos, e é fundador do Centro de Manejo Integrado de Pragas na Unesp. Foi Professor Titular de Entomologia na Unesp de 1986 até 1993, quando fundou a Gravena Manejo Ecológico de Pragas Ltda. Atualmente também é membro e co-fundador do Grupo de Consultores em Citros (GCONCI).

Para tratar das novas vertentes do MIP, Santin Gravena escreveu o seguinte artigo para a AgriBrasilis.

 


 

Com o advento da tecnologia em benefício das atividades agrícolas e do crescimento sustentado do segmento de biodefensivos no mundo, e em particular no Brasil, aumentou a possibilidade do agricultor adotar técnicas preconizadas no sistema de Manejo Ecológico de Pragas. Este sistema evoluiu do sistema de Manejo Integrado de Pragas (MIP) por enfocar mais em táticas ecológicas, ancorando-se no forte setor de biodefensivos agregado por bioestimulantes e na restauração da microbiologia do solo. Esses são fatores inestimáveis para a agricultura sustentável, saudável, produtiva e sob primados ecológicos tão desejados pela humanidade. É claro que o equilíbrio na adubação joga, ao mesmo tempo, no intuito de aumentar ou manter a produtividade já implícita na variedade e evitar surto de pragas; enquanto os defensivos químicos, biodefensivos e bioestimulantes, jogam na proteção direta e indireta da produtividade alcançada pelos primeiros, gerando todos, custos de produção.

Os quatro princípios do Manejo Ecológico de Pragas (MEP) geraram evolução no sistema de MIP, e por quê? Porque o MIP, apesar de ter o seu conceito registrado como permanente na FAO, é entendido por muitos como uma junção de técnicas. Precisava-se de uma pegada mais forte em táticas ecológicas para torná-las mais sérias na prática. Em primeiro lugar, não é apenas junção de técnicas, pois a palavra integrada supõe uma técnica que se harmoniza com outra. Porém, o foco tinha que ser maior em táticas ecológicas e, portanto, nos propusemos em emitir quatro princípios básicos para direcionar melhor as intenções – tornando o sistema mais ecológico:

1. Toda praga tem inimigos naturais: proteção e aumento é o foco do MEP;

2. Toda cultura tolera pragas: evitar aplicações preventivas de tolerância zero;

3. Todo controle pode ser seletivo de alguma forma: seletividade fisiológica e ecológica;

4. Todo ambiente pode ser manipulado contra a praga e a favor dos inimigos naturais.

Portanto, no MEP, a ênfase se dá nos princípios 1 e 4, sendo o segundo de suporte – burocrático, mas importante – pois é por ele que conseguimos adotar o chamado “nível de não-ação”. Ou seja, de acordo com a população do predador ou parasitóide chave da praga alvo do manejo, podemos decidir aplicar ou não o defensivo químico ou biológico, dando preferência por este último no agronegócio sustentável. Por este segundo princípio, acabamos por dar maior importância ao inimigo de ocorrência natural (primeiro princípio) e o biodefensivo, que é o inimigo natural artificial.

 

Tolerância zero ao Greening

Considerando a situação dos Citros no Brasil – um exemplo de cultura em situação extremamente difícil perante esta doença bacteriana e um tremendo desafio para o MEP ser desempenhado em sua plenitude – apresentaremos possibilidades de implementar a técnica apesar dos obstáculos aparentemente intransponíveis ao MEP.

A excelente produtividade do agronegócio citros está garantida nesta safra, apesar da seca e à custa de calendários fixos de pulverizações de inseticidas de larga ação para tolerância zero – a psilídeo Diaphorina citri para evitar a bactéria Liberibacter asiaticus. Mesmo assim, o parque citrícola foi reduzido em 20% pela doença. Ao mesmo tempo, há uma campanha para tornar a citricultura mais sustentável. A sugestão que fazemos de início é adotar o sistema de dois manejos: Manejo do Psilídeo e o Manejo Ecológico das outras pragas. Para isso, uma providência urgente é resgatar a função do Inspetor de Pragas (Pragueiro), para manter a inspeção regular do psilídeo e das outras pragas dos citros nos pomares.

Também o manejo de resistência deve ser levado mais a sério, tanto do psilídeo como das outras pragas – principalmente do ácaro da leprose dos citros, Brevipalpus yothersi. Para que o primeiro e o quarto princípios sejam de maior peso no MEP, é preciso aliviar a carga de defensivos químicos de alta toxicidade aos inimigos naturais no Manejo do Psilídeo. Deve-se, pelo menos no calendário mensal, alternar os 12 produtos em grupos químicos como modos de ação diferentes (se possível). Incluir biodefensivos e reguladores de crescimentos aos poucos, com garantia de controle [do alvo biológico] de pelo menos 80%, como são os químicos. Com os estudos do Fundecitrus já é possível, para novos pomares, utilizar a técnica de Faixa de Borda (Cultura Isca). Ela consiste em 14 ruas pulverizadas com o trator, sendo estas necessárias para cercar os psilídeos que iriam adentrar ao pomar. Estas 14 ruas agem como uma barreira aos psilídeos, e onde seriam feitas as 12 pulverizações de químicos anuais – uma aplicação por mês -, quinzenal ou semanal dependendo da região e preservando a área central, onde pode ser feito o MEP pleno, para pomares médios ou superiores.

Em relação às técnicas ecológicas em uso, em um pomar de tangerina sem sementes, isolado de outras plantações de citros – com cercas-vivas nos contornos de grupo de talhões e quebra-ventos em volta de talhões unitários – existe o psilídeo controlado. Porém, utilizando manejo fisiológico para produção normal, apesar de algumas plantas sintomáticas de greening, com aplicação constante de composto de microrganismos ao solo e equilíbrio nutricional de adubos nitrogenados, realizado o MEP.

Duas técnicas ecológicas já são reais e efetivas:

1. Liberação sistemática da vespinha, Trichogramma pretiosum, parasita de ovos do lepidóptero Bicho-furão Gymnandrosoma aurantiana, via Drone. Esta liberação é feita de tal forma que as vespinhas emergem de onde caíram e procuram um ovo isolado colocado em frutas isoladas, onde iriam penetrar e só aparecer na colheita quando alguém, ao descascar, se deparasse com a lagarta entre os gomos. Muitas vão se perder. A evolução desta técnica está na espécie, sendo estudada na ESALQ/USP e podendo passar de pretiosum para atopovirilia, mais eficiente ainda.

2. Controle de Moscas-das-frutas Ceratitis capitata por atração massal via substâncias nutricionais de forte poder atrativo de nome comercial CERATRAP. A implementação parece difícil, mas os benefícios superam o esforço, ao meu ver.
São instaladas de 80 a 100 armadilhas por hectare e, depois, a substância é apenas reposta para continuar na atração das moscas e evitando que elas ataquem as frutas. É um controle ambientalmente amigável. Outro controle biológico a ser aplicado sistematicamente contra cochonilhas, moscas brancas e ácaros com alta eficiência, são os biodefensivos à base de fungos benéficos Metarhizium anisopliae, Beauveria bassiana e Isaria fumosorosea, com destaque para este último que está bem-sucedido no mercado.

Finalmente, o bom e velho BT, Bacillus thuringiensis, bem utilizado para as lagartas, completam o MEP dos citros, mesmo tendo à frente a terrível barreira do Greening – que envolve ainda a tolerância zero ao vetor da bactéria do greening, devastadora doença que ameaça ainda os pomares de citros brasileiros.

 

Notas:
¹ Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa – Meio Ambiente)
² Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa Cerrados) / Dunhan Trimmer