Paolinelli<\/strong> foi presidente do Banco do Estado de Minas Gerais, da Confedera\u00e7\u00e3o Nacional da Agricultura e ministro da Agricultura entre 1974 e 1979, per\u00edodo em que liderou a moderniza\u00e7\u00e3o da Embrapa.<\/p>\n AgriBrasilis – Qual era o cen\u00e1rio internacional antes da Revolu\u00e7\u00e3o Agr\u00edcola que ocorreu no Brasil?<\/strong><\/p>\n Alysson Paolinelli –<\/strong> At\u00e9 a d\u00e9cada de 70, a agricultura nos pa\u00edses tropicais enfrentava dificuldades. Os desenvolvimentos tecnol\u00f3gicos eram destinados \u00e0 zona temperada, que at\u00e9 ent\u00e3o conseguira abastecer as necessidades mundiais.<\/p>\n Durante a II Guerra Mundial, houve momento em que os EUA tinham alimento estocado suficiente para abastecer os Aliados por tr\u00eas anos. A \u00faltima expans\u00e3o de \u00e1reas vi\u00e1veis para agricultura no mundo havia acontecido na plan\u00edcie central americana, que dominou o mercado internacional por quase um s\u00e9culo.<\/p>\n Existiam problemas, no entanto. Desde o surgimento das teorias de Malthus, sabe-se que devemos nos preocupar com o crescimento populacional. Essas teorias tomaram novas propor\u00e7\u00f5es ap\u00f3s a segunda metade do s\u00e9culo XX, quando houve uma explos\u00e3o populacional sem precedentes. A popula\u00e7\u00e3o mundial cresce mais do que a oferta dos alimentos.<\/p>\n Na d\u00e9cada de 60, um desequil\u00edbrio clim\u00e1tico provocou grandes perdas no hemisf\u00e9rio norte. Os EUA perderam mais de 20% da safra, a Europa perdeu 30% e a \u00c1sia mais de 50%.\u00a0 O governo americano decretou um embargo \u201cn\u00e3o-pol\u00edtico\u201d, proibindo a venda de alimentos, inclusive daqueles negociados em bolsas de valores. Os EUA s\u00f3 teriam alimento para mais seis meses.<\/p>\n Os pre\u00e7os de alimentos dobraram no mundo. Fretes e valores de seguro mar\u00edtimos triplicaram. As regi\u00f5es temperadas estavam exaurindo seus recursos, sem terras ar\u00e1veis novas, e sem possibilidade de ampliar a produ\u00e7\u00e3o.<\/p>\n AgriBrasilis \u2013 Como estava a situa\u00e7\u00e3o do Brasil nesse contexto? O que definia nossa agricultura?<\/strong><\/p>\n Alysson Paolinelli –<\/strong> O Brasil importava um ter\u00e7o do que consumia: quase 100% do trigo, 50% do leite, 30% da carne. Em v\u00e1rios produtos o pa\u00eds era importador ou exportador espor\u00e1dico, sem const\u00e2ncia de oferta. O \u00fanico produto em que \u00e9ramos fortes na exporta\u00e7\u00e3o era o caf\u00e9, que chegou a representar 80% da nossa balan\u00e7a comercial.<\/p>\n Era mais barato importar alimentos do que produzir. Mesmo assim, os pre\u00e7os que pag\u00e1vamos estavam entre os mais altos. Isso n\u00e3o se devia somente a escassez. Quem importava, chegava aqui e especulava com o produto. Est\u00e1vamos comendo alimento caro e de m\u00e1 qualidade. O leite, por exemplo, era comprado dos EUA em p\u00f3, pr\u00f3ximo do vencimento. Brasileiros compravam o leite, reidratavam e vendiam no mercado interno como se fosse de boa qualidade.<\/p>\n Outro fator foi a cria\u00e7\u00e3o da OPEP. Os \u00e1rabes se harmonizaram em fun\u00e7\u00e3o do petr\u00f3leo. Na data da assinatura da OPEP, um barril em Santos custava entre US$ 2,5 e US$ 3. Na semana seguinte, custava US$ 11. Nessa \u00e9poca, o Brasil importava 80% do que consumia. Qualquer economista que avaliasse nossa balan\u00e7a comercial sabia que em poucos anos o pa\u00eds estaria falido. N\u00e3o ter\u00edamos cinco anos de cr\u00e9dito no mercado internacional.<\/p>\n Entramos no Minist\u00e9rio da Agricultura em 1974 em busca de uma sa\u00edda. A \u00fanica possibilidade era atrav\u00e9s do setor agr\u00edcola, j\u00e1 que n\u00e3o era poss\u00edvel criar um novo modelo industrial ou descobrir petr\u00f3leo.<\/p>\n AgriBrasilis \u2013 Como se deu o processo de cria\u00e7\u00e3o da Embrapa e como ela se tornou um polo de inova\u00e7\u00e3o tecnol\u00f3gica?<\/strong><\/p>\n Alysson Paolinelli –<\/strong> J\u00e1 hav\u00edamos criado um sistema de pesquisa eficiente em Minas Gerais. O Ministro da Agricultura Cirne Lima adotou o sistema, criando a Embrapa nesses moldes, mas logo saiu do Governo. O Presidente me convidou para assumir o cargo, com a responsabilidade de fazer a Embrapa coordenar um novo sistema nacional de pesquisa em agricultura. Completamos as reformas que Institui\u00e7\u00e3o precisava e buscamos recursos para integrar a capacidade cient\u00edfica que o Brasil possu\u00eda.<\/p>\n N\u00e3o havia profissionais qualificados. Quando autorizei o primeiro concurso da Embrapa, para 1000 pessoas, apareceram apenas 52 com p\u00f3s-gradua\u00e7\u00e3o.<\/p><\/blockquote>\n Criamos uma bolsa e enviamos os 950 restantes para os melhores centros de ci\u00eancia do mundo. Atrav\u00e9s de conv\u00eanios com institutos estaduais, mandamos 462 pesquisadores e mais 100 professores de universidades para o exterior. A ideia era adaptar o conhecimento sobre agricultura que havia no exterior para a realidade brasileira.<\/p>\n Havia apenas nove institui\u00e7\u00f5es de pesquisa nos Estados. Outros oito governadores tomaram a decis\u00e3o de criar institui\u00e7\u00f5es e passamos para 17. A Embrapa assumiu a responsabilidade de ajudar essas institui\u00e7\u00f5es com recursos, orienta\u00e7\u00e3o t\u00e9cnica e pessoal qualificado.<\/p>\n A Embrapa tamb\u00e9m passou a coordenar um programa nacional de pesquisa com a participa\u00e7\u00e3o do capital privado. Naquela \u00e9poca, at\u00e9 mesmo as grandes cooperativas e empresas que vemos agora estavam no come\u00e7o.Foi o ano da revolu\u00e7\u00e3o.<\/p>\n AgriBrasilis – Como se deu evolu\u00e7\u00e3o da agricultura no Centro-Oeste? Realmente conquistamos o Cerrado?<\/strong><\/p>\n Alysson Paolinelli –<\/strong> Existiam trabalhos que demonstravam a viabilidade do Cerrado, que me deram certeza de que o bioma poderia ser produtivo. Montamos uma equipe incr\u00edvel para o projeto. Quando o Governo percebeu a qualidade, o Ministro do Planejamento chamou o IPEA para aderir.<\/p>\n O Cerrado era uma \u00e1rea extensa, com solos degradados, resultado do intemperismo de milh\u00f5es de anos, al\u00e9m das a\u00e7\u00f5es antr\u00f3picas, como inc\u00eandios praticados por ind\u00edgenas. Pisoteio dos animais, chuvas torrenciais, lixivia\u00e7\u00e3o, eros\u00e3o, enchentes, tudo isso removeu a fertilidade do bioma. Era uma terra de uso limitado, com produ\u00e7\u00e3o agr\u00edcola nula.<\/p>\n A primeira necessidade foi corrigir a acidez. Era necess\u00e1rio reconstituir um solo neutro, com capacidade de troca. N\u00e3o havia calc\u00e1rio suficiente e tivemos que nos esfor\u00e7ar para obter. Teve regi\u00f5es em que usamos at\u00e9 12 toneladas por hectare. O solo era imperme\u00e1vel, de p\u00e9ssima qualidade. A primeira ara\u00e7\u00e3o precisou ser profunda, muitas vezes utilizando subsolador para romper camadas que impediam a circula\u00e7\u00e3o do ar, da \u00e1gua e o crescimento radicular.<\/p>\n Realizamos a recomposi\u00e7\u00e3o qu\u00edmica atrav\u00e9s do f\u00f3sforo, pot\u00e1ssio e nitrog\u00eanio. O produtor comprou esses fertilizantes, amparado pela assist\u00eancia t\u00e9cnica e apoio dos bancos, com recursos do governo. Subsidiamos os fertilizantes em 1975, quando o pre\u00e7o aumentou quatro vezes no mercado internacional. Oferecemos 40% de subs\u00eddio para reduzir a diferen\u00e7a. O agricultor utilizou o insumo acompanhado de assist\u00eancia t\u00e9cnica permanente, atrav\u00e9s da Embrater.<\/p>\n
\n![\"conquista](\"https:\/\/agribrasilis.com\/wp-content\/uploads\/2022\/09\/Embrapa_Cerrados-2.jpg\")
<\/p>\n