Brasil líder da transição verde: bioeconomia pode injetar US$ 592,6 bilhões por ano

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“A bioeconomia deve ser vista como propulsora de um modelo de desenvolvimento produtivo e econômico, justo, ético e inclusivo…”

Juliana Lopes é diretora de natureza e sociedade do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável – CEBDS.

Lopes é formada em jornalismo pela Universidade Metodista de São Paulo, com MBA em marketing pela Anhembi Morumbi e mestrado em sustentabilidade pela Fundação Educacional Inaciana Padre Sabóia de Medeiros.


AgriBrasilis – O que é e qual é a importância da bioeconomia?

Juliana Lopes – A bioeconomia deve ser vista como propulsora de um modelo de desenvolvimento produtivo e econômico, justo, ético e inclusivo, que gera produtos, processos e serviços com base no uso sustentável, na regeneração e na conservação de recursos biológicos, tendo como princípio orientador o uso sustentável da biodiversidade.

É uma alternativa concreta para a transformação da economia e um caminho para soluções de clima, natureza e de desenvolvimento econômico-social, especialmente para os países ricos em natureza, como o Brasil. Segundo a Associação Brasileira de Bioinovação (ABBI), a implementação de novas tecnologias ligadas à bioeconomia tem o potencial de injetar US$ 592,6 bilhões ao ano no Brasil.

AgriBrasilis – Qual é o papel do Brasil na “transição verde”, ou transição ecológica? O setor empresarial está engajado nessa transição?

Juliana Lopes – O Brasil pode liderar globalmente a transição justa para uma economia neutra em carbono, equitativa e positiva para a natureza, pois temos vantagens comparativas. O desafio é como transformá-las em vantagens competitivas.

Um importante passo foi dado com o Plano de Transformação Ecológica, do Governo Federal, que sinaliza internamente e também para o mundo que nossa trajetória econômica vai na direção desse novo modelo de desenvolvimento. E o setor empresarial tem atuado ativamente para que o Brasil exerça esse papel de liderança, tendo inclusive contribuído com recomendações para cada um dos seis eixos do Plano de Transformação Ecológica, antes mesmo de seu lançamento oficial.

“O estabelecimento de uma Política Nacional de bioeconomia é objeto do Projeto de Lei Complementar nº 150/2022”

AgriBrasilis – Existe compatibilidade entre lucro e sustentabilidade? Como?

Juliana Lopes – A sustentabilidade precisa ser entendida como um modelo de negócio. Já não são raros os exemplos de que as mudanças climáticas trazem prejuízos enormes, não apenas para a população em geral, mas também para as empresas. As enchentes no Rio Grande do Sul mostram isso com muita clareza. Não incorporar a preocupação com a natureza e não realizar investimentos em ações que minimizem o impacto das atividades econômicas sobre o meio ambiente, vai significar prejuízos crescentes.

O desenvolvimento sustentável não é custo, e sim investimento e lucro. Os retornos são de médio e longo prazo, mas os benefícios em reputação e competitividade são notáveis. Além disso, um relatório do Banco Mundial, divulgado em 2023, apontou, por exemplo, que a preservação da Amazônia vale, ao menos, US$ 317 bilhões por ano – o equivalente a R$ 1,5 trilhão.

AgriBrasilis – Por que a Política Nacional de bioeconomia pode trazer “mais segurança jurídica” para o setor empresarial?

Juliana Lopes – Estabelecer esse arcabouço, com metas e instrumentos para assegurar fluxos financeiros para fortalecer a bioeconomia é chave para aumentar a competitividade brasileira, com sustentabilidade ambiental e equidade. Além disso, tem condições de oferecer segurança jurídica para orientar investimentos públicos e privados para bioeconomia.

O CEBDS é líder de um consórcio formado por TNC, Instituto Arapyaú e Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura, que apoia tecnicamente a Secretaria de bioeconomia, pertencente ao Ministério do Meio Ambiente, na elaboração da Estratégia Nacional de bioeconomia, bem como no desenvolvimento do Plano de bioeconomia e Plano de Sociobioeconomia.

Em 05/06/2024, o presidente Lula assinou o Decreto que instituiu a Estratégia Nacional de bioeconomia, que traz, dentre os seus objetivos, promover o desenvolvimento nacional, regional e local a partir do uso dos recursos biológicos, de base ambiental, social e economicamente sustentáveis, de forma a contribuir para a segurança hídrica, alimentar e energética da população.

Como diretriz dessa Estratégia, destacamos o estímulo à agricultura regenerativa, à restauração produtiva, à recuperação de vegetação nativa, ao manejo e à produção florestal sustentáveis, em especial de sistemas alimentares saudáveis.

A implementação dessa Estratégia se dará por meio do Plano de Desenvolvimento da bioeconomia, que será desenvolvido no âmbito da Comissão Nacional de bioeconomia a ser estabelecida.

O estabelecimento de uma Política Nacional de bioeconomia é objeto do Projeto de Lei Complementar nº 150/2022, que também estamos acompanhando como CEBDS.

AgriBrasilis – O CEBDS é uma associação civil sem fins lucrativos que promove o desenvolvimento sustentável. Que planos e investimentos estão em curso? Que setores são representados pelo Conselho?

Juliana Lopes – O CEBDS tem representantes dos mais diversos setores da economia, como finanças, agro, cosméticos, mineração, energia e muito mais. Uma das nossas principais iniciativas no momento é a “Trajetória para a COP 30”, em parceria com o WBCSD (Conselho Empresarial Mundial para o Desenvolvimento Sustentável, na sigla em inglês) e com a We Mean Business Coalition. A ideia é mobilizar empresas no Brasil e mundialmente para colaborar e impulsionar diretamente a transição para a economia verde, pensando em deixar legados.

Outra iniciativa envolve uma parceria com o Instituto Igarapé e a JGP para destravar fluxos financeiros para iniciativas sustentáveis que deixem um legado concreto do setor empresarial brasileiro na Amazônia até a COP30. Além disso, o CEBDS tem se engajado em estratégias de advocacy e colaborado na elaboração conjunta de subsídios para fundamentar políticas públicas relacionadas à agenda do desenvolvimento sustentável.

AgriBrasilis – O CEBDS participou da produção do Relatório Global de bioeconomia. Qual é o potencial de mercado da bioeconomia no Brasil? Que outros pontos do relatório merecem destaque?

Juliana Lopes – O relatório foi lançado por um grupo de mais de 19 instituições (dentre elas o CEBDS) que fazem parte do Grupo de Apoio ao GIB (G20 Initiative on Bioeconomy), iniciativa coordenada pelo Ministério das Relações Exteriores com o objetivo de trazer o tema de bioeconomia para o debate do G20.

O objetivo do estudo foi apontar o estado da arte da bioeconomia no mundo para subsidiar o Brasil em um entendimento comum e definição de princípios de alto nível sobre o tema. Esse balanço analisa ainda os desafios e oportunidades que poderiam ser foco de um programa de trabalho da Iniciativa de bioeconomia do G20.

A bioeconomia tem um enorme potencial no Brasil, pela riqueza em biodiversidade que temos. Isso pode responder, até 2030, por mais de 2,7% do Produto Interno Bruto – PIB (segundo a OCDE, 2019). Somente na Amazônia, segundo um estudo do WRI Brasil de 2023 – Previsões para 2050, o aumento no PIB poderá ser de R$ 40 bilhões, criando 312 mil empregos adicionais, além da preservação de 81 milhões de hectares.

AgriBrasilis – A senhora disse que a regulação do mercado de carbono é uma das prioridades do Conselho. Por quê?

Juliana Lopes – A regulação do mercado nacional de carbono é uma bandeira do CEBDS desde 2016. O setor empresarial brasileiro se posiciona de forma contundente em relação ao tema: os setores que serão regulados estão pedindo para serem regulados.

A regulamentação desse mercado pode gerar ao Brasil ganhos comerciais em um ambiente em que políticas climáticas impactam cada vez mais o comércio internacional, geram ganhos em negociações internacionais e acentuam o protagonismo que podemos ter na agenda de transição.

Além disso, a regulação do mercado de carbono, acompanhada da criação de uma taxonomia verde são elementos-chave para mobilizar recursos em escala, preenchendo a atual lacuna de investimentos para a transição ecológica de todos os setores econômicos do Brasil, tendo a bioeconomia como uma propulsora desse novo modelo de desenvolvimento sustentável.

 

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