“…tivemos mais de 12 anos contínuos com déficit pluviométrico em praticamente todo o país. É necessário que agricultores, principalmente pequenos e médios, incorporem sistemas de irrigação…”
Wilson Ureta Parraguez é secretário executivo da Comissão Nacional de Irrigação do Chile. Ureta é engenheiro em recursos naturais renováveis e mestre em gestão e políticas públicas pela Universidade do Chile.

Wilson Ureta Parraguez, secretário executivo da Comissão Nacional de Irrigação do Chile
AgriBrasilis – O Chile tem diferentes condições de chuva em todo o seu território. Qual a importância da irrigação para a produção agrícola? Pode-se dizer que a agricultura chilena depende de projetos de irrigação?
Wilson Ureta – Pode-se dizer que sim. Em nosso país existem climas muito diversos, que, aliados às características meteorológicas e de solo , têm condicionado o desenvolvimento da atividade agrícola, gerando áreas com maior aptidão para determinadas culturas ou nichos de produção agrícola. A disponibilidade de água doce está diretamente relacionada ao regime de chuvas e de vazão em cada região.
Dados preliminares do último Censo Agropecuário e Florestal (2021) indicam que cerca de 50% da área agrícola ainda é de sequeiro (sem irrigação) e, portanto, altamente vulnerável aos efeitos da crise hídrica e climática.
No Chile, tivemos mais de 12 anos contínuos com déficit pluviométrico em praticamente todo o país. É necessário que agricultores, principalmente pequenos e médios, incorporem sistemas de irrigação para terem mais segurança.
A agricultura irrigada também foi afetada pelas mudanças climáticas e pela seca. As culturas apresentam suas maiores demandas hídricas no verão, que no Chile coincide com o período seco. A demanda de água no verão é suprida principalmente por canais que transportam as águas superficiais do gelo derretido e/ou por água armazenada em represas e reservatórios de tamanhos diferentes. A irrigação subterrânea também vem ganhando relevância, o que traz novos desafios para a gestão da água.
A agricultura chilena é de fato muito dependente dos sistemas de irrigação e as mudanças climáticas tornarão a irrigação eficiente ainda mais relevante. Os investimentos em infraestrutura intra e fora da fazenda são fundamentais.
Um dos nossos principais desafios passa pela melhoria da eficiência da irrigação, conciliando essa necessidade com critérios ambientais e apoio para pequenos e médios agricultores, que são as mais vulneráveis aos efeitos da seca e têm papel relevante na produção de alimentos.
AgriBrasilis – Quais são os números estimados de perdas no setor agrícola devido à seca?
Wilson Ureta – É difícil atribuir quais perdas são causadas exclusivamente pela escassez hídrica, pois as diminuições ou variações na produção respondem a múltiplos fatores, como aspectos climáticos, sociais e logísticos (por exemplo, geadas; eventos climáticos fora de época; chuvas; granizo; ondas de calor; pragas ou doenças fitossanitárias, escassez de mão de obra, aumento de preços de insumos, entre outros).
Por exemplo, quando se compara a superfície agrícola do Censo Florestal e Agropecuário de 2007 com os resultados preliminares de 2021, observa-se uma tendência na maioria dos cultivos de diminuição de área cultivada, com exceção da categoria de frutas, que se expandiu.
AgriBrasilis – A dessalinização da água do mar é uma alternativa viável a longo prazo? Quais são os protocolos para obtenção de água de aquíferos?
Wilson Ureta – Cerca de 50 usinas de dessalinização operam no Chile, localizadas principalmente entre as regiões de Arica, Parinacota e Atacama, cujo desenvolvimento foi orientado para projetos de mineração e produção de água potável. Embora a experiência tenha sido positiva em muitos casos, os custos dessa tecnologia têm sido uma limitação para seu uso massivo no setor agrícola.
É um desafio avançar em mais pesquisas e gerar sinergias que permitam maior certeza dos benefícios da dessanilização no setor agropecuário, garantindo que o meio ambiente não seja afetado (principalmente com salmoura residual).
Sobre a utilização das águas subterrâneas para fins não domésticos, atualmente os direitos de utilização da água devem ser solicitados à Direção-Geral das Águas, com indicação do georreferenciamento do poço, caudal de extração, utilização, acompanhamento dos antecedentes de perfuração, ensaios de bombagem do poço, entre outros, sendo obrigatório incorporar sistemas telemétricos que informem a quantidade de água extraída dos poços.
AgriBrasilis – Existem projetos de subsídio de irrigação para a agricultura familiar?
Wilson Ureta – Um dos objetivos principais do Ministério da Agricultura é o fortalecimento da agricultura familiar camponesa como base do sistema agroalimentar nacional.
Por exemplo, a Comissão Nacional de Irrigação relançou o Programa Especial para a Pequena Agricultura com o objetivo de apoiar os pequenos agricultores no desenvolvimento de projetos que permitam maior eficiência no uso da água para irrigação.O programa premia projetos em benefício de agricultores com área de até 40 hectares de irrigação básica.
Outro fato relevante é que cada potencial beneficiário pode se candidatar a mais de um projeto de irrigação, desde que sejam iniciativas implementadas em etapas.
