Consumo de carne é afetado pela crise na Argentina

Bovinos corte carne Argentina
Publicado em: 7 de abril de 2021

O confinador tem 75% do mercado interno, que vem perdendo o poder de compra.”

A produção de pasto de qualidade e introdução de raças bovinas de biotipo moderado, geralmente britânicas, fazem da carne argentina ser reconhecida mundialmente. Ultimamente, o País tem aumentado suas exportações do produto para a China, estreitando a relação comercial com este País.

José Miguel Lizzi CREA Argentina

José Miguel Lizzi, líder do setor de bovinocultura pelo Conselho Regional de Experimentação Agrícola (CREA).

José Miguel Lizzi é engenheiro agrônomo formado pela Universidad de Buenos Aires, com especialidade em Manejo de Sistemas Pastoris pela Facultad de Agronomía da Universidad de Buenos Aires. Atualmente é líder do setor de bovinocultura pelo Conselho Regional de Experimentação Agrícola (CREA).

Entrevista exclusiva para a AgriBrasilis. 

 


AgriBrasilis – A carne argentina é vista mundialmente como um produto de alta qualidade, o que contribui para isso?

José Miguel Lizzi – O posicionamento e o reconhecimento da carne argentina se devem em grande parte às características intrínsecas do produto, já que o desenvolvimento comercial e de marketing em nível de país tem sido muito escasso. A carne argentina se posicionou como um produto de alta qualidade devido à alta proporção de raças britânicas do rebanho com biótipo moderado e produção de pastagens de alta qualidade que permitiam a terminação precoce e o abate de animais jovens. Recentemente, isso foi modificado, outras raças foram incorporadas e os sistemas de engorda deixaram de ser puramente pastorais para incorporar grãos na dieta.

 

AgriBrasilis – Sendo a China um grande comprador da carne bovina argentina, como a disputa comercial entre os Estados Unidos e a China afetou o mercado?

José Miguel Lizzi – Diante de um cenário de peste suína africana (PSA) na China e de redução de seu estoque de suínos e aumento da demanda por carnes importadas de qualquer origem e espécie, a guerra comercial permanece em segundo plano com relevância, pelo menos por enquanto. Por outro lado, para a Argentina, o desenvolvimento do comércio bilateral com os Estados Unidos tem avançado muito lentamente, principalmente devido a acordos e tarifas.

 

AgriBrasilis – Nestes tempos de crise e recessão econômica no País, quais são as dificuldades do setor produtor?

José Miguel Lizzi – A principal dificuldade do produtor no momento é o contexto macroeconômico do país. O confinador tem um mercado dominante que representa 75% e é o mercado interno, que há alguns anos perde poder de compra tanto em Dólares como em Pesos Argentinos. Isso se traduz em receitas menores para toda a rede. Por sua vez, por ter grande parte dos custos dolarizados, as últimas desvalorizações desvalorizam o preço de venda da carne do seu custo de produção, gerando tensões econômicas, sociais e políticas setoriais. Para o criador, por se tratar de um negócio com vendas sazonais e pontuais, trabalhar em um contexto de alta inflação gera a necessidade de uma gestão financeira à qual não está acostumado ou de abrir mão de grande parte da lucratividade. Por outro lado, a crise atual e a fenomenal questão monetária geraram interesse em algumas categorias de bens como instrumento financeiro de salvaguarda de valor, aumentando os preços e gerando distorções no negócio.

 

AgriBrasilis – No curto e médio prazo, quais são as perspectivas para o setor?

José Miguel Lizzi – O setor é diverso, numeroso, descoordenado e complexo, por isso é “antifrágil”, busca novos pontos de equilíbrio para garantir sua sobrevivência. Se as condições melhorarem, ele se inverte e mais é produtivo, o que, no longo prazo, estabiliza os preços. Se o consumo interno não se recupera o suficiente para validar aumentos de preços, a oferta é reduzida, mais capim engorda, com ciclos mais longos e se busca recompor a renda dessa forma, o que por sua vez significa menos oferta instantânea e aumento de preços. Os atores podem mudar, alguns desaparecem como já aconteceu, mas o setor continua.

A médio prazo, vão ter outras complicações, na minha opinião: mudança de geração com a saída dos agricultores mais velhos, mas menos interesse em entrar nos jovens ao mesmo tempo que as barreiras à entrada no negócio são muito elevadas. Também existem desafios do lado do consumidor e da sociedade em geral devido a questões ambientais e éticas, competição pelo uso da terra / capital com outras atividades mais lucrativas e competição com outras fontes alternativas de proteína.

 

Números da bovinocultura na Argentina

Rebanho (número de cabeças) 54,5 milhões (2019) (1)
Ranking mundial (número de cabeças) 6°(2019) (1)
Produção anual (toneladas) 3,17 milhões (2020) (2)
Ranking mundial (produção)  4°(2019) (1)
Exportações (toneladas) 917,2 mil (2020) (2)
Ranking mundial (exportação) 4° (2019) (1)
Exportações (US$) 356 milhões (2019) (2)

 

Fontes:

(1) Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura

(2) Câmara de Indústria e Comércio de Carnes e Derivados da República Argentina